Mauricio está feliz. Segundo ele mesmo, no melhor momento da carreira. Com mais de 160 jogos pelo Inter, é quem mais vestiu a camisa colorada entre o grupo atual. E não é segredo da qualidade. Em seu quarto ano no Beira-Rio, está ansioso por um título, que garante ser seu maior sonho esportivo.
O camisa 27 recebeu no CT Parque Gigante, uma equipe de GZH (formada por Marcelo De Bona, Rafael Diverio e Saimon Bianchini, com produção de Lucas Arruda) para uma conversa sobre o grupo atual, o futuro, a relação com os companheiros e a expectativa para 2024, inclusive a de ser negociado. Confira a entrevista.
Esta sequência de vitórias é indício de uma temporada que promete ser boa?
Com certeza, é cedo para falar em boa temporada, depende de muitos fatores, tem muitos jogos e campeonatos pela frente. Mas a sequência de 10 vitórias e do trabalho bem feito, o futebol que mostramos está sendo vistoso. É uma junção de fatores que nos faz ver esse crescimento.
Thiago Maia brincava com a situação de que estava chegando bastante gente e faltava ele. Vocês também veem esses acréscimos?
Percebemos que tinha algumas saídas e também estavam vindo jogadores, sempre para qualificar o elenco. Acabou chegando todo mundo, vemos como uma grande disputa, acho que sadia. Todos terão oportunidades e precisamos mostrar no campo, para elevar o nível do grupo.
Dá para dizer que hoje o elenco está formado para disputar grandes títulos e não deve nada para outra equipe do Brasil?
Vejo que a nossa equipe está cada vez mais madura, unida e tendo essa filosofia do treinador. Quando temos uma sequência de trabalho, sem desmanchar de um ano para o outro, influencia bastante para que tenhamos uma regularidade muito boa e sempre evoluindo. Temos muita margem ainda para melhorar, estamos no caminho certo.
Vários de vocês já usaram essa expressão, concorrência sadia. O que é isso?
Usamos muito esse termo por não ter uma competição desrespeitosa. Claro que vou querer jogar, o Thiago vai querer jogar, o Borré vai querer jogar, mas sem desrespeitar ninguém, trabalhando e treinando da melhor forma, sempre buscando espaço para poder jogar.
Falando de tática, então. Embora o futebol moderno vá além dos 11 titulares, da ideia dos 16 com as cinco trocas, todos gostamos de uma prancheta, de colocar no papel o que seria o time titular. Coudet usa o 4-1-3-2, fala-se muito da importância que tu tens nesse time, aberto por um lado, Wanderson pelo outro. Dá para pensar num modelo diferente, diante de tantos bons nomes que o Inter tem para o meio-campo, ou por tudo que vocês têm trabalhando a ideia é essa?
A questão tática é determinante no futebol hoje em dia, não se consegue mais ganhar jogos com a técnica apenas. Como você elabora o seu time para jogar contra outra equipe é fundamental, às vezes você disputa uma partida de um jeito e, na outra, o jeito que você ganhou não funciona. Temos várias ideias, várias formações, é muito rotativo, ainda mais pela qualidade do grupo. Não ficamos só num esquema, o professor nos passa bastante ideias. Só não vou entrar em detalhes até para não dar armas, né?
É mais fácil rodar o jogador ou mudar o esquema?
Depende da característica do jogador, se ele consegue realmente fazer aquela função. Temos muitos jogadores de qualidade, alguns de características parecidas e outros de características diferentes. Isso aumenta o repertório para as partidas.
O que você já aprendeu nesse convívio com jogadores com bagagem internacional?
Aprendemos muito. Eu particularmente aprendo muita coisa com eles. Tem muitos jogadores que já jogaram na Europa, como Mercado, Alan Patrick, Vitão, que é jovem mas também já jogou por lá. A mentalidade deles é diferente, o modelo de jogo de lá é totalmente diferente do que temos daqui. No Brasil, é um jogo muito mais de transições, lá é mais de ataque, depois defesa. Temos de valorizar a bola, não fazer jogadas arriscadas quando não precisa e, sim, manter a posse. Dá para perceber em vários atletas ali e a gente tenta absorver o máximo possível.
Gosto do De Bruyne e do Foden, do Bernardo Silva também, que são os jogadores da minha posição
MAURICIO
Meia do Inter
Nessa concorrência, não pode dar muita brecha. Não é um bom momento para jogar mal, ficar doente...
Vem doente mesmo (risos). Temos de ser ainda mais profissionais. Mas todo mundo já tem uma mentalidade muito boa, usamos as estruturas do clube, banheiras de gelo, de água quente, fisioterapia, massagem. Tudo isso ajuda. Semana retrasada, jogamos três partidas em seis dias. Então não há muito treinamento, tem de recuperar para poder estar bem para o próximo jogo. É nessa hora que a estrutura faz a diferença.
Gosta de tática, de entender o que tem que fazer no campo?
Gosto bastante de conversar sobre tática, movimentações, posicionamento. A posição que jogo requer muito de entendimento de jogo. Às vezes, a equipe marca de um jeito diferente, que faz mudar o comportamento. Então tem de lidar com situações em que precisa mudar sem o treinador orientar, necessita ter a percepção e a leitura de jogo. Quanto mais souber sobre tática, melhor.
Vê jogos que não sejam de adversários, tipo na Europa assim?
Sim, acompanho.
O que gosta de ver nessa questão tática?
Eu gosto muito do Manchester City. É bizarro o futebol que eles fazem, é muito lindo de se ver, a pressão pós-perda. Esses dias assisti a Liverpool x City, em Anfield, um jogo que encanta, não é feio, em nenhum momento tem confusão, agressividade, toda hora eles procuram o gol. Um ataca, depois vem o outro e ataca. É difícil até prever o placar, é um jogo que fica muito aberto e também conta com jogadores de extrema qualidade.
Tem algum jogador especial, que gosta de ver jogar e se inspira?
Acompanho o futebol principalmente em Inglaterra, que tem sempre jogos grandes, e o horário coincide. Gosto do De Bruyne e do Foden, do Bernardo Silva também, que são os jogadores da minha posição. Tento absorver o máximo. No Arsenal, há aquele norueguês Odegaard, que me encanta muito. Tentamos olhar e aprender com eles.
Você teve vários treinadores no Inter. Essa pressão pós-perda é a principal diferença de Coudet para os outros técnicos? Não falando de qualidade, mas em termos táticos mesmo?
Aprendi muito com todos os treinadores, ainda tenho 22 anos e muito para amadurecer, mas acredito que é o ano que estou mais maduro, com mais experiência, com mais ritmo de jogo também. Então isso tudo influencia. Coudet é um cara que, não só comigo, mas ele cobra todo mundo bastante, nos treinamentos e jogos. Dá para ver ele na beira do campo, muito elétrico. Acho que isso é o diferencial. Se a gente está perto e consegue fazer uma pressão, é muito mais fácil do que você baixar as linhas todas lá atrás para poder fazer um contra-ataque, muito mais longe do gol. É claro que existem situações de jogo que vamos marcar em bloco baixo, mas temos tudo treinado para não sermos surpreendidos.
Já deu tempo de conversar com seu velho parceiro Johnny pra pegar essas impressões dele do futebol europeu e até algumas dicas para um possível futuro na Europa?
Tenho falado com ele de vez em quando. Parabenizei pelo jogo que fez também, marcou um gol. É um jogador que dispensa comentários, chegou lá no meio de temporada e conseguiu já começar jogando basicamente, tendo uma sequência muito boa. Perguntei como era, porque teve uma adaptação muito rápida. Ele está feliz e fiquei feliz por ele.
Fala-se que você é a próxima grande venda do Inter. É um caminho natural?
Não sei ainda, estou muito feliz aqui, posso demonstrar meu futebol, o professor também sempre me dá oportunidades. Estou extremamente adaptado ao Inter, é difícil pensar se vou ser negociado ou não para a Europa. É um caminho que todo jogador sonha, mas eu mantenho os pés no chão e o foco. Aqui é onde quero estar, conquistar coisas. Vamos ver o que tem pela frente, pensar no presente.
Já se perguntou para qual país se seu estilo se adapta mais?
Nunca parei para pensar assim. Mas você tem de se adaptar independentemente do local. É muito difícil falar qual encaixa. Gosto de ver todas as ligas. Tenho um amigo muito próximo (Ederson) que joga na Itália, na Atalanta, vejo os jogos dele. Procuro evoluir, me tornar um atleta mais completo.
O que faz nos raros momentos livres?
O calendário daqui é complicado, mas sempre que estou em casa procuro ficar com meus pais, com a minha namorada, que são a base para conseguir lutar a cada dia. Moro num condomínio, eles jogam beach tennis, vou lá assisti-los. Gosto de ter a família por perto. De vez em quando, jogo no meu iPad com os amigos. Vejo série, filmes. Vou a restaurantes. Tem que se distrair, se divertir, pensar em outras coisas, não ficar com foco 100% no futebol, né?
Você tem gol em Gre-Nal, na primeira vitória do Inter contra o Corinthians em Itaquera, numa virada muito interessante sobre o Flamengo. Está se tornando mais decisivo, principalmente com os chutes de fora da área?
Procuro aproveitar as chances, não sei se isso me faz decisivo ou não. Claro que sempre quero ser importante para a equipe, fazer jogos assim me deixa muito feliz. Mas faço da forma natural, nunca quero forçar nada, o coletivo tem de falar mais alto, que as individualidades aparecem. Pode ser qualquer jogador, ainda mais que agora começam as decisões.
Sempre quero ser importante para a equipe, fazer jogos assim me deixa muito feliz
MAURICIO
Meia do Inter
Por falar nisso, qual é a importância do Gauchão para o Inter nessa temporada?
Meio-campo do InteTem algum tempo que não conquistamos, então isso fica na cabeça. Serão dois jogos contra o Juventude muito importantes, agora é o único campeonato que temos pela frente. Vamos com humildade, pé no chão.
Quais são os perigos de um jogo como esse, ainda mais com uma sequência de 10 jogos seguidos de vitória?
Todo jogo tem perigo, temos de esquecer os 10 jogos, o professor mesmo nos fala que temos de aproveitar no dia, mas logo depois, deixar para trás e pensar na frente, em seguir ganhando. Temos de ir lá, fazer o nosso melhor e tentar vencer de novo, claro, respeitando o adversário.
Há duas semanas o Inter enfrentou o Juventude com um time quase reserva, mostrou a força do grupo. O que entra daquela partida para um jogo como esse, eliminatório?
O cenário é muito diferente do que foi. Lá era fase de grupos, agora é semifinal. São 180 minutos, que precisam de atenção, de cuidar os detalhes. Sabemos da rivalidade com o Juventude, de jogos do passado. É um adversário que sempre quer fazer um duelo difícil também. Vai ser muito complicado, é uma partida totalmente diferente. Vamos estudar bem a equipe deles.
Mauricio vai seguir sendo brasileiro, vai aceitar o convite para jogar pela seleção paraguaia ou vai esperar o passaporte europeu?
Não sei ainda, mas é claro que a Seleção Brasileira chama muita atenção. Tive a oportunidade de defender algumas vezes nas categorias de base e recentemente no Pré-Olímpico. É uma responsabilidade e um orgulho representar o país. Mas isso ainda é para o futuro, um assunto delicado porque é definitivo.
Já perdoou o Ramon Menezes? Nós não perdoamos ainda (risos).
Não é uma questão do treinador. Infelizmente foi uma derrota de todos nós. É muito difícil falar desse Pré-Olímpico, porque chegamos para o último jogo precisando apenas do empate. É uma ferida que se criou ali e que vamos levar para o resto da vida.