Em entrevista exclusiva ao Esporte Espetacular, a primeira desde que cumpriu a suspensão por doping, Paolo Guerrero relembrou o que viveu no período em que esteve afastado do futebol. O centroavante do Inter revelou que teve depressão e que passou seis meses isolado em casa.
— Tive depressão mesmo. Não queria sair da minha casa, fiquei no Peru todo esse tempo. Todo mundo falava para eu viajar e distrair a cabeça. Mas fiquei o tempo todo no Peru. Não pensei em fazer uma viagem, me distrair. Eu queria resolver minha vida, voltar a jogar futebol. Deixei de assistir um pouco futebol porque não queria ver meus companheiros jogando bola sem mim. (...) Um dia acordava e acordava mal. Queria ficar na minha casa, na minha cama, sem querer ver ninguém. Ficava triste. Tinha ligação e eu não atendia, tinha mensagem não atendia. Ficava trancado na minha casa.
Em novembro de 2017, Guerrero foi suspenso provisoriamente pela Fifa por 30 dias, após ter sido flagrado em exame antidoping no jogo entre Argentina e Peru, pelas Eliminatórias da Copa. A amostra coletada mostrou a presença de benzoilecgonina, principal metabólico da cocaína. Em sua defesa, Guerrero alegou contaminação em um chá que tomou antes do jogo.
Desde lá, o atacante travou uma luta jurídica e foi até a última instância para tentar provar sua inocência. Mesmo com o apoio da família, que ele disse ser fundamental neste período, o jogador disse que esse foi o pior momento da vida dele.
— Futebol é a minha vida, é minha paixão, é tudo que eu posso querer. Só jogar futebol. E deixar de jogar por aquilo que aconteceu era muito injusto. Eu não podia aceitar algo assim. Na minha cabeça só era lutar pela minha inocência.
Durante o período em que esteve suspenso, Guerrero conseguiu uma liminar que permitiu a ele disputar a Copa do Mundo da Rússia. Entretanto, ele diz que não conseguiu aproveitar a competição.
— Para ser bem sincero, não. E isso todo mundo tem que saber, no meu país também. Só que eu precisava estar lá com meus companheiros porque eles me veem como um exemplo e como capitão deles. Então eu tinha que estar do lado deles para apoiar em todos os sentidos. Por isso quando me tiram do primeiro jogo eu... eu queria jogar, como todo jogador quer estar sempre no campo. Mas valia a minha presença com eles apoiando, porque se estamos perdendo temos que ir para empatar e virar, mas eu tinha que estar com eles. Mas aproveitar como jogador dentro do campo... Como? Antes de me incorporar à seleção eu treinei num parque sozinho.
Em meio à incerteza sobre quando poderia voltar a jogar futebol, Guerrero lembra que recebeu várias propostas, mas que os clubes tinham dúvidas se ele poderia ter uma suspensão maior. Entre eles, o Inter foi o único que disse que aguardaria até o dia em que ele pudesse jogar.
— Então não tinha como dizer não. Inclusive o Flamengo fez uma proposta, mas com muitas dúvidas. Então o Inter era: se você não puder jogar agora, a gente te aguarda até quando puder jogar, mas a gente te quer aqui. E me receberam com os braços abertos. Por isso sempre falo que estou muito agradecido com o Inter porque me acolheu muito bem.
Anunciado pelo Colorado em 12 de agosto de 2018, Guerrero foi apresentado com grande festa no Beira-Rio no dia 15, mas só foi liberado para treinar nas dependências do clube no dia 5 de fevereiro de 2019. Pouco mais de um mês depois, uma má notícia tirou o sorriso do rosto de Guerrero: seu sobrinho Júlio André Rivera Quispe, 28 anos, morreu atropelado após tentar escapar de um assalto.
— Muito difícil a partida do meu sobrinho, da forma como foi. Roubaram o telefone dele por roubar, mataram ele, e é difícil entender esse tipo de coisa que acontece no dia a dia. Para a minha família foi um choque muito forte. Mais para a minha mãe, porque o meu sobrinho estava vivendo esses dias com minha mãe, e tudo aconteceu quando ele estava voltando para lá. Minha mãe se culpa muito, e eu não gosto da minha mãe assim triste. Inclusive a gente comemorava junto aniversário, porque ele também era de 1º de janeiro, e sempre cantavam parabéns para mim e para ele. No mesmo dia a gente comemorava, a gente sempre estava junto porque passávamos o mesmo dia juntos.
Depois do momento de tristeza, enfim um pouco de alegria para Guerrero. O peruano estreou pelo Inter em 6 de abril, contra o Caxias, pelo Gauchão, marcando gol já no primeiro jogo. O centroavante, que já tem quatro gols em sete jogos e chegou a 99 gols por clubes brasileiros, comemora o bom momento no clube:
— Estou me sentindo muito bem aqui, me adaptando à cidade, a tudo. Acho que já estou adaptado aos meus companheiros porque chego lá e é felicidade pura. E por isso estou agradecido com meus companheiros, porque eles me abraçaram, e é isso o que eu quero fazer. Chegar no clube, no vestiário e rir, chegar no jogo e rir. E ganhar. É o mais importante. Sou um cara muito competitivo, que se cobra muito e não gosta de perder. Tomara que a gente possa ganhar muito e este ano possa comemorar um título importante.
As boas atuações pelo Colorado também chamaram a atenção do técnico da seleção peruana, Ricardo Gareca, que inclusive já esteve em Porto Alegre para conversar com o atacante. Guerrero afirmou que, se for convocado, irá disputar a Copa América. Porém, ele demonstrou mágoa com a falta de apoio da federação peruana no período em que esteve afastado.
— Quero que a minha federação se preocupe mais, não por mim, porque obviamente o que aconteceu comigo foi o destino. Mas eu quero que eles tenham respeito pelo jogador. Eles têm que se envolver mais pelo jogador, ter uma preocupação maior, porque por mim não tiveram. (...) O Flamengo até se importava, porque às vezes me chamava para saber como eu estava. O Flamengo me blindou com apoio. Mas quem tinha que resolver isso era a Federação Peruana de Futebol, e nesse caso não me deram o apoio que eu precisei. Porque eles deveriam ter investigado e me ajudado mais.