Chegou a hora de Odair Hellmann ousar e escalar Pedro Lucas? O treinador, primeiramente, teria de conviver com o desconforto dos veteranos, Santiago Tréllez, William Pottker e Rafael Sobis, que assistiriam do banco de reservas ao novato de 20 anos começar a partida contra o Juventude, nesse domingo, no Estádio Alfredo Jaconi. Não se trata de uma decisão fácil. Mas, a seu lado, Odair tem a resposta do ataque colorado em 2019: um gol em cinco jogos. E o gol foi do único titular indiscutível do ataque: Nico López.
Pedro Lucas se prepara desde os nove anos para ser titular do Inter. Os Schwaizer, por sinal, mudaram a vida da família, de Vale real para Porto Alegre para que o primogênito pudesse seguir jogando nas escolinha do clube. São 11 anos de Inter à espera de uma chance no time de cima.
— O Inter depositava um salário milionário na conta de Leandro Damião todos os meses. O centroavante, um dos 10 maiores goleadores brasileiros da história da Libertadores, valia cada centavo. Mas as rotas finanças do clube não suportariam Paolo Guerrero e Damião na mesma folha de pagamento. Ao liberar o número 9 histórico, Odair Hellmann procura alguém capaz de ocupar o posto do peruano até abril. Precisava de um titular e de um reserva. Como vetou Jonatan Alvez, pediu Santiago Tréllez. Deixou Pedro Lucas como terceira opção - comenta o colunista de GaúchaZH Luiz Zini Pires.
— Ninguém conhece o verdadeiro poder do futebol do jovem quando ele enfrenta jogadores profissionais, não mais atletas de categorias de base, gente da sua antiga turma. Pedro precisa jogar, ganhar minutos e experiência. Mostrar seu potencial no ataque, na grande área. Enfrentar zagueiros do Gauchão. Precisa do Campeonato Estadual como ninguém. Se ele, sem gols, não ganhará o passaporte da Libertadores. Alvez e Tréllez todos conhecem. Pedro Lucas, não. Pode ser uma bem-vinda surpresa — entende Zini.
O fraco desempenho do ataque até aqui pode ser um incentivo a Odair a dar mais uma chance a Pedro Lucas desde o começo da partida. Até agora, ele iniciou somente o jogo na estreia da temporada, em Ijuí, na vitória sobre o São Luiz.
— A vez de Pedro Lucas na fila dos centroavantes do Inter chegou. Pottker, o primeiro, se machucou e, antes de se machucar, não havia dado a resposta esperada. Até porque não é ali o seu lugar. Depois, veio Sobis, que ainda sem a melhor forma, não emplacou. Tréllez desembarcou e ganhou lugar privilegiado na fila, mas não justificou-o em três jogos. Por exclusão, portanto, parece que a hora de Pedro Lucas chegou. É bom que se diga que há merecimento nisso. Até porque, se não estivesse mostrado em campo, jamais teria empurrado a fila de nomes mais rodados para a frente — afirma o articulista de GaúchaZH Leonardo Oliveira.
— Pedro Lucas mostrou imposição, algo que faltou a Tréllez, por exemplo, e presença de área. Está aceso, louco para resgatar seu investimento de 11 anos de vida no Inter. É essa gana, é esse brilho que os guris da casa têm e, talvez, seja meio opaco nos veteranos. Odair Hellmann, outro feito no Beira-Rio, sabe bem como isso funciona. Mas precisa saber tirar proveito desse DNA caseiro para resolver problemas de um ataque pouco agudo na largada de um 2019 lotado de expectativas. Para o Inter, o sucesso de Pedro Lucas em gols está longe de ser só técnico. Para um clube com as contas fragilizadas e ávido por uma venda, o sucesso de um centroavante da casa pode representar, logo ali na frente, um sol iluminado na janela do verão europeu. Por tudo isso, não há dúvidas de que chegou a hora de lançar Pedro Lucas. Com os cuidados e o zelo que requerem um jogador recém-buscado na base, e a mesma paciência dedicada a alguns veteranos que não entregam o que prometem — acrescenta Oliveira.
Se nas recentes temporadas o Inter está na retranca para o lançamento de jovens, anos atrás foi com Nilmar que o clube retomou a promoção de pratas da casa. Era a temporada 2003, quando o Inter que sobreviveu a 2002 contratou Muricy Ramalho, e o treinador apostou em um trio de guris: Nilmar, Diego e Diogo. Mesmo em um momento de alta cobrança e pressão, Nilmar se destacou e foi o nome daquela equipe. Em menos de 16 meses, ele foi de ídolo colorado a joia negociada ao Lyon-FRA. Tinha 20 anos. Rafael Sobis chegou na esteira de Nilmar e encontrou um Inter mais estabilizado, tendo em Fernandão e Iarley esteios para o setor ofensivo. Apesar de não ter o virtuosismo de Nilmar, se tornou um dos atacantes mais importantes da história contemporânea do clube.
Ninguém, porém, teve tanto impacto em seus poucos meses de profissional do Inter como Alexandre Pato. Lançado após a Libertadores de 2006, Pato teve uma ascensão meteórica no Beira-Rio, aos 17 anos, saindo da base — onde estava sendo guardado pelo Inter até que assinasse o contrato profissional — diretamente para o time titular, ocupando o espaço deixado por Sobis — vendido ao Bétis-ESP — e deixando Iarley no banco. Apenas 12 gols, 27 jogos e um título mundial depois, ele deixou o Inter em agosto de 2007, vendido ao Milan por US$ 20 milhões. À sombra de Pato, o Inter promoveu e vendeu Luiz Adriano. Igualmente fundamental na conquista do Mundial, o atacante foi vendido em março de 2007 ao Shakhtar Donetsk, por US$ 3 milhões — uma barganha.
Entre uma e outra conquista de Libertadores, surgiu Leandro Damião. Promovido da base, ele foi inscrito no torneio de 2010. A primeira grande chance surgiu no segundo jogo das finais com o Chivas Guadalajara, quando o centroavante marcou um golaço, o segundo dos 3 a 2 do Inter sobre os mexicanos. Antes de Damião, Walter havia sido o jogador escolhido da base para o grupo da Libertadores. Acabou se perdendo em seus próprios demônios.
Mas nem todos estes casos de promoção de atacantes da base são de sucesso. Desde o final dos anos 1990 até agora, há nomes que não tiveram sucesso. De Fábio Pinto a Brenner, muitos atacantes passaram pelo time de cima sem destaque, sem conseguir se manter e brigar por vaga como titular. Leandrão, Diego, Ricardo Jesus, o colombiano Cristian Borja, o nigeriano Abubakar, além de Rafael Porcellis, Lucas Roggia, Guto, Maurides e Joanderson são exemplos de pratas da casa que não vingaram. O curioso é que boa parte destes atacantes surgiu em tempos de calmaria e títulos do Inter, no período entre 2006 e 2014. Nem todos conseguiram conciliar a chance que receberam mais o bom momento do clube com a técnica necessária para se manter no elenco principal.
— Talvez seja uma boa opção para o Inter jogar com o Pedro Lucas. Ainda que ele tenha jogado por pouco tempo, já se viu a pouca produção dos demais que foram testados. Ainda assim, futuramente, o dono do lugar será Paolo Guerrero — avalia o comentarista da Rádio Gaúcha e colunista do Diário Gaúcho Adroaldo Guerra Filho.
Esperança de gols do Inter, Pedro Lucas parece o mais próximo de Leandro Damião que a base colorada produziu recentemente.
Da base ao time principal
Onde eles andam
Fábio Pinto (Parou de jogar)
Leandrão (Boavista-RJ)
Nilmar (Parou de jogar)
Luiz Adriano (Spartak Moscou-RUS)
Alexandre Pato (Tianjin Quanjian-CHI)
Leandro Damião (Frontale Kawasaki-JAP)
Cristian Borja (América de Cali-COL)
Ricardo Jesus (Tombense-MG)
Abubakar (Lija Athletic-MAL)
Rafael Porcellis (Sem clube)
Lucas Roggia (Sem clube)
Guto (Zhejiang Yiteng-CHI)
Maurides (CSKA Sofia-BUL)
Walter (Deixou o CSA-AL e segue vinculado ao Porto-POR)
Diego (Ferroviária-SP)
Aylon (Chapecoense)
Joanderson (Grêmio)
Brenner (Inter B)
*Brenner, ex-Juventude, foi contratado pelo Inter e passou uma temporada na equipe de aspirantes antes de ascender ao time principal. Hoje, ele está no Goiás.