Alisson e Muriel, Diego e Diogo, antes ainda, Carpegiani e Borjão, os laterais Fábio e Rafael, os De Boer, Zico e Edu, Alecsandro e Richarlyson, Gabriel e Diego Milito, e os gêmeos argentinos Guillermo e Gustavo Barros Schelotto são alguns exemplos de irmãos no futebol. Pois a partir da próxima semana, o Inter voltará a ter dois manos no clube: os Schwaizer. Mas eles estarão em equipes diferentes.
O atacante Pedro Lucas, no time de Odair Hellmann, e a meia-atacante Maria Luiza, a Malu, na equipe feminina, depois que ela trocou as Sereias da Vila, do Santos, pelas Gurias Coloradas. Aos 20 anos de idade, metade deles vividos na base do Inter, o camisa 41, dono de 1m85cm de altura, começa a receber as primeiras chances no elenco principal. Estreou em Ijuí, na vitória sobre o São Luiz, e poderá receber nova chance neste domingo (27), às 17h, no Passo D'Areia, diante do São José. Enquanto isso, Malu decidiu deixar o Santos – que, no futebol feminino, é uma espécie de Palmeiras no masculino –, voltar para casa e assinar por um ano com o Inter, acreditando no projeto do clube e na chance de uma convocação para a Seleção Brasileira sub-18.
Os Schwaizer, que trocaram a cidade de Vale Real – uma pequena joia perto de Feliz, no Vale do Caí –, em 2009, por Porto Alegre para que Pedro Lucas pudesse cumprir os turnos de treinos na base colorada, parecem ter saído de um comercial de TV no intervalo do Super Bowl. Filhos de pai empresário – André tem um negócio de família, um hortifrúti na Ceasa – e mãe psicóloga, eles moram em um bonito apartamento, em condomínio caro, tendo sob as janelas a vista de boa parte da cidade.
— Eu tinha muito preconceito com o futebol. Não queria que meus filhos largassem os estudos para jogar. Não era profissão, queria ver eles ganhando o mundo. Mas, depois que passei a acompanhar, vi que futebol é vida. Nossas férias de verão passaram a ser em Alegrete, para assistir ao Efipan — conta Cris, a matriarca-coruja dos Schwaizer.
Se Pedro Lucas, que tem contrato com o Inter até o final de 2020, faz o estilo centroavante europeu, Malu à primeira vista parece um misto da Larissa Manoela, ex-Carrossel, com uma atitude do ícone argentino Mafalda. Quando começa a conversar sobre futebol, tem fogo nos olhos. Nem parece ter 17 anos, tamanha convicção no que pretende para a vida.
— Tens que ver ela com a bola no pé então — diz Pedro Lucas. — É mais habilidosa que eu — emenda o atacante colorado.
Aos seis anos de idade, Malu pediu à mãe para parar com as aulas de balé.
— Quero jogar futebol, como o mano — pediu a camisa 10, dona de quase 1m60cm de altura, decidida a trocar as sapatilhas pelas chuteiras.
Cris, que já havia passado por um longo processo de aceitação ao filho boleiro, acabara de receber um novo choque.
— Hoje me orgulho de ter dois filhos de alta performance — conta Cris Schwaizer.
Pedro Lucas, fã de Fernandão e do inglês Harry Kane, atacante do Tottenham, também não fica para trás em termos de maturidade. Nem parece ter apenas 20 anos quando a entrevista se inicia. Além da bola, ele cursa faculdade de educação física na Sogipa. Em casa, os irmãos e os pais enxergam de perto a enorme diferença entre o futebol masculino e o feminino. Ainda antes de buscar um lugar ao sol no time de Odair, o atacante já sonha inaugurar em Vale Real um projeto social voltado ao futebol para meninas e meninos.
— No futebol feminino, as atletas se ajudam muito. É claro que há rivalidade, mas elas sabem que estão em uma causa juntas, algo maior — afirma Pedro Lucas.
— Na final do Gauchão, as meninas do Grêmio receberam a taça em um pódio que era uma mesa. Inter, Corinthians, Santos... todos divulgaram isso. Como assim, uma mesa? — recorda, indignada, Malu.
Chamada de "Patricinha" em seus primeiros meses de Santos, quando aos 16 anos de idade precisava arrumar um espaço entre as profissionais da equipe, mulheres com 20, 25, 30, 35 anos, Malu permaneceu por duas temporadas entre a Vila Belmiro e a Seleção. Até que surgiu o convite do Inter para disputar o Brasileirão sub-18 nessa temporada.
— Muitos me falam em tentar uma bolsa de estudos nos Estados Unidos ou Canadá. Mas não quero isso. Quero é jogar em um clube, quero é viver do futebol, ganhar títulos, jogar Mundial, Olimpíada — dispara Malu.
Mesmo com o avanço do futebol feminino no Brasil, a sociedade ainda não parece pronta para reconhecer o profissionalismo e a paixão das meninas pelo jogo. Malu recorda que, já na época de escola, cansou de ouvir reclamações de pais e mães quando os seus filhos esquentavam o banco enquanto ela era titular dos times masculinos – pois não havia gurias suficientes para montar um time. E, mesmo em um clube de ponta como o Santos, houve vários momentos de machismo da própria torcida.
— Certa vez ouvi de um torcedor, na Vila: "O que você quer aqui? Por que não vai lavar uma louça?". E uma vez me deram a seguinte recomendação na Seleção Brasileira: "Quer ajudar o futebol feminino? Então vai fazer um projeto". Como assim, projeto? Eu quero é jogar. Ainda temos muito a evoluir — adverte Malu.
Se Pedro Lucas é cria da base colorada desde os nove anos, Maria Luiza precisou batalhar um pouco mais para ser vista. Ela jogava em uma franquia do Santos em Porto Alegre quando, durante uma visita mensal de um olheiro do clube, um menino faltou ao treino. Malu, então, pediu para jogar entre os guris. Jogou e detonou em campo. O olheiro não a esqueceu, mas, como ainda tinha apenas 14 anos, não pôde ir para Santos. Dois anos depois, foi chamada para as Sereias.
— Quando fui para o Santos, aqui não havia estrutura de clube. Joguei na escolinha do Grêmio, depois na escolinha da Duda, depois na do Santos. Eu era a única da Seleção que era de escolinha, e não de clube. Cheguei ao Santos e vi uma estrutura de clube, como o mano tinha aqui. Era aquilo que queria para a minha vida — conta Maria Luiza. — Agora, o Inter tem um grande projeto no futebol feminino — elogia.
Contratada por uma temporada pelo Inter, Malu voltou para casa. Em seu quarto, os funkos (bonequinhos estilizados de personagens pop) da Mulher-Maravilha se misturam às pelúcias de Monstros S.A., mais dezenas e dezenas de medalhas de futsal e de futebol de campo. Já no de Pedro Lucas, bonecos e cartazes geek de Harry Potter que fariam o parceiro de ataque William Pottker morrer de inveja – além da tatuagem "Expecto Patronum", o feitiço pronunciado pelo bruxinho para afastar os Dementadores, no braço esquerdo. Os irmãos Schwaizer estão morando juntos outra vez.
— Quem se deu mal foi o Roberto (zagueiro do Inter, companheiro de base de Pedro Lucas desde os nove anos, colega de faculdade do camisa 41 e, espécie de terceiro irmão Schwaizer), que ocupava o meu quarto diversas vezes na minha ausência. Eu disse a ele: "Devolve meu quarto, tô voltando" — brinca a guria colorada.
Entre sonhos de inscrição na Libertadores por Odair Hellmann e de convocação para a Seleção feminina, os Schwaizer passarão a trilhar a partir da próxima semana suas carreiras coloradas. Juntos de novo e, pela primeira vez desde os times de peladas de rua e da escolinha do Juventude em Vale Real, vestindo a camiseta do mesmo clube.
— Eu sempre escolHia a Malu para as minhas equipes. É muito legal tê-la de volta — finaliza o atacante colorado Pedro Lucas.
Os irmãos Schwaizer
Pedro Lucas Schwaizer
- 20 anos
- Atacante
- Contrato com o Inter até o 31/12/2020
- Está no clube desde 2007
- Fã dos Harry, Potter e Kane, e de Fernandão
Maria Luiza Schwaizer
- 17 anos
- Meia
- Contrato com o Inter até 31/12/2019
- Estreará no clube em 4 de fevereiro
- Fã da Mulher-Maravilha e da gaúcha Andressinha, meia da Seleção Brasileira, e de Gabi Zanotti, meia do Corinthians