Para existir futebol feminino no RS é necessário ter solidariedade. Seja entre as atletas, que pagam viagens do próprio bolso, comissões técnicas que trabalham de forma voluntária ou, até mesmo, na lavagem dos uniformes das jogadoras. Em Grêmio e Inter, por exemplo, parcerias firmadas com a equipe masculina fazem com que esse último item não seja uma dor de cabeça a mais no universo de desafios que o futebol das gurias tem. Mas, no interior do Estado, é.
A corrente de solidariedade do Esporte Clube Oriente conta com a bondade de Maria Inês de Maia, mulher do diretor do departamento feminino, Marco Maia. Ela abraçou a missão de cuidar, lavar e passar os uniformes dos times. De graça, claro.
— Nesta semana, as meninas se juntaram lá em casa. Esse é o nosso espírito, somos uma família, e um ajuda o outro — garante Marco, que lembra já ter tirado cerca de R$ 5 mil do seu bolso para investir na modalidade.
No Esporte Clube Ijuí, o cenário não é diferente. A cidade tem abraçado as jogadoras, graças ao empenho da presidente, coordenadora e técnica do time, Marli Lourenzon. Massoterapeuta por formação e ex-jogadora de futebol, é ela quem vai atrás dos patrocínios pelo município. A farmácia fornece energético, a equipe masculina do clube fornece parte da bilheteria de um dos seus jogos, a clínica de imagem autoriza exames gratuitos para as atletas e por aí vai. Quando não tem para onde correr, Marli apela para o seu cartão de crédito pessoal:
— Se não tiver dinheiro, pago depois. Ponho no cartão. E depois vejo como pago — explica.
Os perrengues, claro, não se limitam aos custos, exames e lavagem dos uniformes. Chegar ao destino de uma partida com antecedência, com direito a descanso no dia anterior, é luxo que o futebol feminino do Interior não conhece.
O Oriente viajava até Rio Grande para enfrentar o time local. A uma hora da cidade, o pneu do ônibus, gentilmente cedido pela prefeitura de Canoas, furou e não havia o equipamento necessário para a troca. O socorro prometera chegar em 10 minutos. Mas, passada uma hora, as meninas foram às estradas em busca de carona para chegar ao local da partida. Mas um motor home — de novo, a solidariedade alheia —, parou e auxiliou o grupo na operação mecânica.
— Chegamos quase na hora do jogo, almoçamos e saímos correndo. Cheguei a pedir para o árbitro atrasar o início do jogo e, apesar de ele ameaçar dar multa (R$ 100 a cada hora atrasada), cedeu — lembra o diretor do futebol feminino do Oriente.
E quem pensa que isso abalou de alguma forma o futebol das meninas, se engana. Teve gol delas e comemoração à altura do perrengue: com as mãos imitando a direção e uma sentada ao lado da outra, como se imitassem o ônibus, que quase deixou elas na mão.