Aos 49 anos, Jalma Cristina da Costa Ramos é a jogadora mais velha do Gauchão. Ela tem mais do que o dobro da idade média das demais inscritas no torneio (23 anos) e o triplo dos 15 anos de Sabrina de Brito, do Estrela, a mais nova da competição. Mas engana-se quem pensa que a idade deixa a atleta em desvantagem na disputa com as mais jovens:
— Ela é uma patrola em campo! — falou uma das adversárias que enfrentou o Esporte Clube Ijuí, time de Tupã, como é conhecida a moradora de Tupaciretã, na Região Central do Estado.
A inspiração da jogadora explica a fama de aguerrida dentro de campo. Fã de Dunga, volante tetracampeão do mundo com a Seleção Brasileira, Tupã entra no gramado com duas palavras em mente: raça e disposição. Este pensamento, presente desde o início de sua carreira, aos 15 anos, a levou para grandes clubes do futebol brasileiro. Além de atuar pela dupla Gre-Nal, jogou pelo Palmeiras.
Tupã nasceu em 1969, ano em que as mulheres eram proibidas por lei de jogar futebol. O decreto, assinado em 1941, afirmava que a prática do esporte era incompatível com a natureza feminina. Quando a modalidade foi liberada, na década de 1980, incentivada pelo pai, Arcanjo, Tupã jogou seu primeiro campeonato municipal pelo Cruz Alta.
Dois anos depois, ela engravidou do primeiro filho, Junior Daniel, e, aos 18, interrompeu o sonho de ser jogadora. A segunda gestação, de Jean Carlos, prolongou a pausa no esporte. Mas, aos 26, uma nova oportunidade reavivou o desejo que estava adormecido havia oito anos: o Cruzeiro, de Porto Alegre, estava fazendo uma peneira para disputar a Taça Brasil. Ainda amamentando o bebê mais novo, ela se dividia entre a maternidade e o futebol.
Não demorou muito para Tupã empilhar equipes e títulos em seu currículo: venceu o Gauchão três vezes — uma pelo Inter, em 1998, e duas pelo Grêmio, em 2000 e 2002. Neste intervalo, ainda jogou pelo Palmeiras e pelo Capivariano, de Sorocaba, em São Paulo.
— Abandonar os filhos para realizar um sonho é muito difícil. Uma vez fiquei longe oito meses sem ver eles. Foi um período doloroso, em que sofri muito. Mas hoje eles são meus maiores incentivadores, eles têm orgulho. Me apoiam, assistem quando podem. Isso é que me dá mais vontade ainda para continuar — contou.
Tupã teve a sorte de seu auge acompanhar uma fase em que o futebol feminino era mais valorizado no Estado e no Brasil. Ela estava no último grupo gremista antes de a direção extinguir a categoria, em 2003.
— Os clubes não veem o futebol feminino como vantagem, e sim como despesa. Esse pensamento é ruim. A gente honra a camiseta do time em outras cidades e outros países e merece reconhecimento — reivindicou.
Com mais de três décadas de experiência na modalidade, Tupã considera que os times do Interior são, na verdade, uma reunião de amigas que gostam de jogar futebol, já que há pouca ou quase nenhuma estrutura para que a prática seja enfrentada de outra maneira. A maioria de suas colegas trabalha durante o dia e estuda à noite, o que fez com que o Ijuí treinasse apenas duas vezes antes de o Gauchão iniciar.
Hoje recepcionista na Secretaria de Agricultura e do Meio Ambiente, Tupã ainda atua como árbitra em jogos da cidade e se prepara para a aposentadoria. Ela pretende parar no Estadual de 2019, quando completa 50 anos.
— Vai ser o dia mais triste da minha vida. É como se estivessem arrancando alguma coisa de mim — lamentou.