A dor de cabeça, a tontura e a garganta seca são alguns dos primeiros sintomas sentidos pela reportagem de GZH logo após o pouso em La Paz, na noite desta segunda-feira (1º). Para o Grêmio, que jogará 90 minutos em alta intensidade nesta terça (2), contra o The Strongest, a atenção é ainda maior. Porém, pauta recorrente nos jogos de times brasileiros na Bolívia, o debate sobre a altitude é um tema que incomoda os bolivianos.
Na visão de jornalistas, ídolos e autoridades do país, os efeitos da baixa pressão atmosférica da capital boliviana, situada 3,6 mil metros acima do nível do mar, são "superdimensionados" e, por vezes, utilizados por estrangeiros para tirar o mérito dos times locais nos jogos da Libertadores e da Sul-Americana.
— É um tema que incomoda porque, quando o time boliviano perde, dizem que é porque o time brasileiro é mais forte. Agora, quando o time brasileiro perde, dão toda a atribuição à altitude e tiram os méritos da vitória do time boliviano. Então me parece que este tema da altitude se usa mais como uma desculpa — disse o jornalista Miguel Ardiles, da Rádio Monumental, de La Paz.
Para o jogo contra o The Strongest, o Grêmio adota todos os cuidados possíveis para evitar os efeitos do chamado "mal da montanha", que pode gerar falta de ar e dor de cabeça, em virtude do ar rarefeito.
Para minimizar o impacto, a delegação tricolor está concentrada em Santa Cruz de la Sierra, de altitude inexpressiva, e chegará à capital boliviana apenas 3h30min antes do jogo, marcado para às 21h (horário de Brasília), no Estádio Hernando Siles. Além disso, o clube alugou um cilindro de oxigênio para ter no vestiário em caso de necessidade.
Já o jornalista Roberto Acosta, da Rádio Deporte, de La Paz, acredita que os brasileiros dão um valor excessivo ao tema e avalia ainda que o estilo de jogo do The Strongest não permite à equipe boliviana o uso da altitude como uma vantagem significativa.
— (A altitude) É uma coisa superdimensionada. Há times que até usam muito bem a altitude, como o Bolívar, que tem uma equipe muito rápida e intensa. Já o The Strongest é um time que usa muito a bola parada e movimenta bem a bola de um lado para o outro. Não é uma equipe tão intensa como o Bolívar. Mas penso que o impacto da altitude é muito individual. Já tivemos times brasileiros correndo mais do que os times locais aqui em La Paz. E já tivemos times colapsando aos 60 minutos — opina.
Por fim, a jornalista Edsy Gilbert, da Revista Cábala, da Bolívia, alega que os estrangeiros valorizam muito a altitude, mas ignoram que os times de La Paz também enfrentam condições diferentes da que estão acostumados quando jogam fora de casa.
— O The Strongest, os demais clubes bolivianos de cidades de altitude e a própria seleção boliviana sabem que só a altitude não ganha jogos. Quando a Fifa debateu um possível veto à altitude, foi clara ao dizer que se joga onde se mora. Nós moramos aqui e jogamos aqui, assim como jogamos fora de casa em lugares extremamente quentes e úmidos, que também impactam quem mora em cidades com grandes altitudes — defende.
O jornalista Miguel Ardiles sugere, inclusive, que os jogadores do Grêmio — e os demais times brasileiros que jogarem em La Paz — não deem tanta importância ao ao tema.
— A altitude é algo muito psicológico. Não digo que não exista ou que não se sinta. Mas é algo que se tu pensa muito, te afeta muito. Se tu vens com medo da altitude, isso termina te afetando desde a cabeça pela ideia que tu já tens. Mas se tu vens e joga sem pensar na altitude, podes obter resultados. Por exemplo, nas Eliminatórias passada, o Brasil veio e ganhou por 4 a 0 da Bolívia com uma equipe alternativa — sugere.
Desde 2000, o The Strongest enfrentou 17 vezes os times brasileiros em La Paz, com 10 vitórias, quatro empates e apenas três derrotas. Uma das vitórias foi sobre o Juventude, por 5 a 1, na Libertadores 2000. Outra foi sobre o Inter, por 3 a 1, na Libertadores 2015. Há ainda o empate por 1 a 1 com o Inter, na Libertadores 2012.
Já o Grêmio nunca enfrentou o time boliviano neste período. Os únicos brasileiros a vencerem o Tigre, como a equipe é conhecida, em La Paz, em uma Libertadores, foram o Corinthians (2003), o São Caetano (2004) e o Atlético-MG (2013).
O tema, contudo, é polêmico. Em 2021, ao definir a disputa de jogos de futebol em La Paz como "desumano", o então técnico da Seleção Brasileira, Tite, foi duramente repreendido por ídolos e autoridades do país, o que motivou o comandante a pedir desculpas ao povo boliviano. Afinal, trata-se de um tema sensível no país andino.