De Belford Roxo, na região metropolitana do Rio de Janeiro, para Uruguaiana, na fronteira oeste do Rio Grande do Sul. Essa foi a mudança feita por Marly Isabel Inácio Carvalho ou, simplesmente, Bebel, para dar sequência à carreira no futsal. Em terras gaúchas desde março do ano passado, a pivô de 25 anos foi campeã gaúcha com a Celemaster em 2022 e 2023, além de ter sido eleita a melhor em quadra na última final, com três dos seis gols uruguaianenses diante da Malgi.
Em todo o campeonato, Bebel balançou as redes 12 vezes em 14 jogos. O talento para a artilharia está no sangue. A pivô é neta de Aluísio Francisco da Luz, o Índio, que fez 142 gols com a camisa do Flamengo entre os anos de 1951 e 1957. Até o início deste ano, ele estava entre os 10 maiores artilheiros da história do rubro-negro, mas foi ultrapassado por Gabigol.
Na entrevista abaixo, Bebel conta como se aproximou do futsal, a paixão pela posição de pivô, e os preconceitos ainda sofridos pelas mulheres no esporte. Ela também é estudante de Educação Física, profissão que também pretende seguir.
Como você começou no futsal?
Meu início no futsal foi bem engraçado. Cheguei no futsal profissional no início do ano passado. Sempre gostei, admirei e assistia à modalidade, mas não tinha noção de padrão de jogo, marcação, jogadas. Não entendi o porquê de algumas situações em quadra. Eu jogava por jogar, porque gostava de estar com uma bola no pé. Eu vim do futebol de campo e do futebol sete.
O gosto pelo esporte veio de berço. Meu pai e meu avô foram atletas profissionais de futebol. Meu avô não está mais entre nós, mas é e sempre será meu maior ídolo dentro dessa modalidade, tem uma história linda e um currículo gigante. Foi o décimo artilheiro da história do Flamengo. Esse amor pelo esporte sem dúvidas corre nas veias.
Por uma incrível coincidência, fui descoberta pela Marina Loures (fixa da Celemaster) jogando um torneio de futsal em Paulo de Frontin, um cidade do Rio. Marina me indicou para o André (Malfussi, técnico da Celemaster). Vim para Uruguaiana com a cara e a coragem, sem saber se conseguiria me adaptar. No início foi bem desafiador. Pensei em desistir, mas o André foi um cara bem paciente e cauteloso. Ele me ensinou tudo que eu sei hoje dentro do futsal. Sou muito grata a esse cara pela oportunidade e confiança no meu trabalho.
Como foi a escolha pela posição de pivô?
Desde quando comecei a jogar com os meninos na rua, sempre fui de fazer muitos gols e decidi optar por ficar na frente e brigar pela última bola para por ela para dentro. Sempre gostei de estar perto do gol e nunca me arrisquei a jogar em outra posição. Sou feliz assim. Minha família sempre me incentivou muito. Meu avô e meu pai são as pessoas que mais me ajudaram nessa escolha. Na minha opinião, uma pivô completa é aquela que segura, gira, tem uma boa finalização e um bom passe, tem um tempo de bola excelente e é goleadora.
Chegava a me vestir com roupas mais largas para que eles deixassem eu jogar. Tinha dias que minha mãe me proibia e me colocava de castigo.
BEBEL
sobre preconceito no esporte
O que significou o título do Gauchão de Futsal 2023?
A Celemaster é pentacampeã da competição, mas junto dela é meu segundo título como atleta profissional de futsal. Isso é um presente. A sensação que fica na gente é aquela de dever cumprido de um trabalho no dia a dia que, no final, foi coroado como merecemos. Esse ano foi especial para mim porque, além de ter ajudado a equipe com três gols, fui eleita a melhor jogadora da partida e estive na seleção da rodada como melhor pivô. Consegui colocar em prática tudo que eu aprendi desde quando cheguei aqui. A temporada foi e tem sido incrível.
Quais são os seus planos para a carreira?
Meu maior sonho hoje dentro dessa modalidade é a seleção brasileira. É um sonho de criança. Pretendo jogar em outros lugares, novas competições, como Liga Nacional, entre outros. E pretendo conhecer outros países e ver meu trabalho sendo reconhecido, levando alegria por onde quer que seja.
A mulher ainda sofre muito preconceito dentro do esporte? Como é no futsal?
Infelizmente, o preconceito é uma coisa que ainda vivenciamos e lutamos dia após dia. Graças a Deus nunca sofri dentro do futsal, mas em outra modalidade e quando era mais nova, sim. Ouvia sempre que lugar de mulher não era dentro de campo, que devia brincar com bonecas, que futebol era coisa de homem. Isso era sempre desconfortável, mas, por ser rebelde, batia o pé e não desistia e sempre me enfiava no meio dos meninos. Chegava a me vestir com roupas mais largas para que eles deixassem eu jogar. Tinha dias que minha mãe me proibia e me colocava de castigo. Hoje, é suportável viver nesse meio e encarar com mais coragem essa realidade.
Qual mensagem você deixa para quem sonha em ter uma carreira no futsal?
A gente sabe que não é fácil jogar futsal. Tem que ter apoio, incentivo, dedicação e amor pelo que faz. Mas a mensagem é de que acreditem nos seus sonhos, foquem, estudem e nunca, jamais desistam do sonhos de vocês. Temos um Deus que faz o impossível ser possível. "Acreditar" é a palavra mágica, até o fim.