Com a retomada das aulas presenciais nas próximas semanas e o receio de surtos de covid-19, a maior parte das universidades federais do Rio Grande do Sul exigirá passaporte vacinal e oferecerá testagem grátis a funcionários e alunos da graduação e pós-graduação que estiverem em atividades presenciais.
Poderão realizar exame RT-PCR apenas estudantes e funcionários que frequentarem a instituição e que estiverem com sintomas de coronavírus ou que tiverem entrado em contato com caso positivo. Não será ofertado teste a quem estiver apenas em ensino remoto. No geral, o serviço será para quem tiver disciplinas práticas ou para trabalhadores.
A possibilidade de testes não é exigência das autoridades, mas um serviço a mais que instituições oferecerão para evitar surtos cancelamento de aulas. Não há verba do Ministério da Educação (MEC) para a medida, e a aplicação em massa, por livre-demanda, esbarra nos cortes orçamentários operados pelo governo federal. No Exterior, universidades oferecem testes a alunos na entrada do campus.
A exigência de comprovante de vacinação não é consensual. O ministro da Educação, Milton Ribeiro, proibiu a requisição, sob o argumento de que a medida deve estar em lei. No entanto, em 31 de dezembro, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski derrubou o despacho do MEC e alegou que universidades têm autonomia para a medida.
Questionada se exigirá passaporte vacinal, a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) informou que o Conselho Universitário tornou obrigatória a exigência, mas que a última portaria do reitor, Carlos André Bulhões, traz entendimento contrário. O gabinete do reitor encaminhou a questão à Procuradoria da universidade (representante dos interesses do governo federal), que até o momento não se manifestou.
Para o retorno às aulas presenciais em 7 de fevereiro, a UFRGS oferecerá testes a funcionários e alunos que apresentarem sintomas ou entrarem em contato com caso confirmado de covid-19, medida iniciada em novembro, diz Ilma Brum, diretora do Instituto de Ciências Básicas da Saúde (ICBS).
O indivíduo precisa frequentar presencialmente a universidade. A instituição chegou a testar a comunidade acadêmica em atividades presenciais independentemente de ter sintomas, entre janeiro e novembro de 2021, mas restringiu a oferta a sintomáticos e contactantes. No ano passado, foram 6.308 testes – 127, positivos.
Em meio a cortes orçamentários que dificultam o funcionamento das universidades, o custeio para os testes vem da própria UFRGS, mediante recursos da Reitoria ou dos convênios do ICBS, que processa exames PCR para o Sistema Único de Saúde Porto Alegre e outras instituições.
— Essa testagem nos dá segurança, não tivemos nenhuma ocorrência de surto na universidade. Quando teve positivo, rastreamos e isolamos. Mas o governo não nos dá nada para este fim. É difícil, como estamos em trabalho remoto, temos o trabalho de muitos voluntários — afirma Ilma Brum.
A Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA) analisa a possibilidade de implementar o passaporte vacinal para frequentar a instituição, mas a reitora, Lucia Pellanda, destaca que a comunidade acadêmica é formada por profissionais e estudantes da área da saúde, cuja adesão à vacina é maciça.
A UFCSPA testa desde o início da pandemia funcionários e estudantes em atividades presenciais com sintomas ou que tenham tido contato com uma pessoa positiva para coronavírus. Os exames são analisados na Santa Casa, por meio de um acordo. A testagem em massa é um desejo, mas não há verba suficiente, explica a reitora. Uma possível saída em andamento é a possibilidade de acordo com a Universidade Federal do ABC (UFABC), que criou um teste rápido de baixíssimo custo com tecnologia RT-PCR (leia mais ao fim do texto).
— Testamos todos que estavam no presencial em 2020, mas chegamos à conclusão de que o custo do rastreamento para a comunidade acadêmica inteira seria inviável. Desde março de 2020, temos programa de telemonitoramento, que telefona para a pessoa, seja servidor ou aluno, e orienta para o teste PCR, se for indicado. O que estamos vendo é se esse exame da UFABC será possível. O teste deles é de R$ 20, faz toda a diferença — diz Pellanda.
A Universidade Federal de Rio Grande (Furg), cujas aulas terminam em fevereiro e serão retomadas em abril, exige passaporte vacinal desde o fim do ano passado. A instituição estuda a oferta de testes, mas esbarra no estrangulamento financeiro. O exame criado pela UFABC também é visto como opção.
— Estamos com orçamento muito enxuto, então, a questão orçamentária é limitação para fazer testagem em massa. É uma demanda da comunidade, é justo, mas infelizmente temos limitações. O autoteste, se for aprovado, pode mudar esse cenário. Se a gente tivesse recurso (federal) específico para isso, seria muito bom. Mas acaba tendo que sair do recurso da universidade, que para este ano é insuficiente — diz o reitor da Furg, Danilo Giroldo.
A Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) não tem política de testagem aos frequentadores, mas o campus em Palmeira das Missões inovou ao realizar rastreamento, em janeiro, dos funcionários e alunos que retomaram aulas práticas presenciais, independentemente de sintomas.
Entre 150 alunos e servidores que fizeram PCR, 25 tiveram resultado positivo. Chamou a atenção que apenas cinco tinham sintomas – os outros 20 com covid eram assintomáticos. A ação é financiada com a verba paga por prefeituras da região com as quais a UFSM tem convênio para analisar exames dos moradores.
— Propusemos esse projeto de extensão de testagem para o retorno ser o mais seguro possível — explica a microbiologista e professora Terimar Ruoso Moresco, coordenadora do projeto UFSM-Detecta, responsável pelos exames.
A vice-reitora da UFSM, Martha Adaime, explica que o Comitê de Operações de Emergência (COE) é favorável à cobrança do passaporte vacinal, mas que a procuradoria jurídica da instituição se posicionou contra. O MEC, cita a vice-reitora, não regulamentou o ensino híbrido para 2022. Há insegurança sobre a possibilidade de um aluno não vacinado processar a universidade se rodar por falta após ser impedido de acessar as aulas.
— As procuradorias jurídicas das federais não chegam a um consenso, algumas são a favor e outras, contra. O MEC lançou aquele despacho dizendo que não podia exigir passaporte e que caiu através de uma liminar. É um assunto controverso — diz Adaime.
A Universidade Federal de Pelotas (UFPel), a Universidade Federal do Pampa (Unipampa) e a Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) informam que não possuem testagem própria de estudantes e servidores, mas que exigirão comprovante de vacinação.
— Vamos avaliar a viabilidade (de um programa de testagem). São por volta de 12 mil alunos. Para fazer uma testagem efetiva, precisaria testar ao menos uma vez por semana, como jogador de futebol. O custo disso é incrível, as universidades estão enfrentando corte de orçamento, é uma situação bem complicada. E o próprio insumo está quase indisponível no mercado — afirma o biólogo Jeferson Franco, coordenador do projeto de diagnóstico molecular da Covid-19 da Unipampa São Gabriel.
GZH questionou na terça-feira (25) o MEC se há planos para incentivar universidades federais a testarem alunos e servidores e se recorrerá da decisão do STF que permite a exigência do passaporte vacinal, mas não obteve retorno até a tarde desta quarta (26).
Entenda o teste da universidade paulista avaliado pela UFCSPA e pela Furg
A UFABC, em São Paulo, desenvolveu, em parceria com a Faculdade de Medicina do ABC (FMABC), um RT-PCR que coloca um cotonete na boca do indivíduo, em vez de no nariz, ao custo de apenas R$ 20 - no mercado tradicional, um exame com as mesmas características custaria entre R$ 75 e R$ 80, segundo a universidade.
A instituição afirmou a GZH que “o grau de precisão e confiabilidade do teste é alto, por isso a chance de um ‘falso positivo’ é quase nula” e que todos os insumos são aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
— Caso houvesse condições de promover parcerias com laboratórios especializados e garantir mais recursos operacionais, esse modelo de testagem poderia ser ampliado e aplicado em diversas outras esferas da sociedade, inclusive em escolas de ensino infantil, devido à técnica simplificada e indolor de coleta de amostra — afirmou a professora Márcia Sperança, coordenadora do estudo que desenvolveu o exame, em comunicado da instituição.