Nove meses após o apagão no Campus do Vale da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a instituição ainda sente os efeitos do problema. A interrupção da energia elétrica ocorreu nos 12 e 13 de fevereiro, no campus na zona leste de Porto Alegre, e causou prejuízo de R$ 784.773,55, conforme estimativa da universidade. Até agora, o valor não havia sido divulgado.
O relatório acerca das consequências do apagão foi emitido no dia 15 de abril de 2024. Questionada pela reportagem de Zero Hora, a universidade informa que o relatório é interno e não será divulgado publicamente. A comissão responsável pela elaboração do documento concluiu que “houve danos materiais, imateriais, institucionais e acadêmicos para a UFRGS”.
No entanto, perdas relativas a horas de trabalho dos pesquisadores e atrasos no andamento das pesquisas não foram computadas no valor. Na prática, as consequências da interrupção de abastecimento de energia ainda se fazem presentes, seja para as pesquisas, seja pelo impacto no orçamento da universidade, segundo o vice-reitor da UFRGS, Pedro Costa.
— Esse valor de indenização não é um valor total do que nós temos [de prejuízos]. Nós adiantamos algumas parcelas de recursos orçamentários nossos, como uma forma de repor os danos. Uma parcela que não é tão significativa no orçamento da universidade, mas ela é importante, porque foram outras coisas que a gente deixou de fazer, que ficaram descobertas — afirma o professor.
O vice-reitor destaca que foram utilizadas verbas que seriam destinadas a questões de manutenção, como obras e reparos, para recuperar ou substituir equipamentos e estruturas importantes do Campus do Vale que foram danificadas por conta do apagão. No momento, a UFRGS aguarda ressarcimento dos R$ 784.773,55 da CEEE Equatorial, empresa que ficou responsável pela indenização.
Segundo o vice-reitor, não há prazo para o pagamento ser efetuado, mas o vencimento da guia de recolhimento emitida cobrando o valor apurado seria no final de setembro. Contudo, a empresa solicitou acesso ao processo judicial e pediu esclarecimentos à UFRGS sobre como se chegou ao valor, conforme a assessoria de imprensa da universidade. A instituição de ensino está reunindo os documentos.
— Esperamos que seja rápido, ainda neste ano, para poder fazer uso destes recursos. Essa é a nossa expectativa. Ainda temos quase 60 dias [antes do final do ano], estamos esperando que isso se resolva — diz Costa.
O relatório foi elaborado por uma comissão técnica, que foi responsável por apurar as causas e consequências do incidente e pelo levantamento de prejuízos às unidades acadêmicas. O Campus do Vale conta com 29 unidades, sendo que todas levantaram, junto aos Programas de Pós-Graduação, laboratórios e outras estruturas, os impactos da interrupção do serviço.
Perdas inestimáveis
Dentro do que foi possível mensurar, chegou-se ao valor de R$ 784 mil. Entretanto, muitas das perdas imateriais e acadêmicas, como experimentos inacabados, horas de dedicação dos pesquisadores e atrasos em cronogramas de pesquisas não entraram na conta. À época do incidente, diretores das unidades ouvidos pela reportagem estimavam prejuízo na casa dos milhões de reais.
Segundo o vice-reitor, somente bens físicos, como equipamentos, mobiliários e amostras foram levados em consideração, como puderam ser quantificados. Também há danos que ainda estão sendo avaliados, em função de amostras de pesquisa que não foram descongeladas, entre outras questões.
No Instituto de Ciência e Tecnologia de Alimentos (ICTA), por exemplo, houve danos mais graves nos laboratórios de Biotecnologia e de Equipamentos Especiais. As principais perdas foram de amostras e reagentes, bem como equipamentos que ficaram danificados. Até o final de fevereiro, haviam sido contabilizados problemas que somavam prejuízo de R$ 173.550.
Um freezer, uma geladeira, baterias de nobreaks, um disjuntor e um gerador estão entre os equipamentos que estragaram e precisaram de reparo ou substituição. Após, o levantamento foi atualizado, conforme a diretora do ICTA, Florencia Cladera Oliveira, e novos problemas foram constatados.
Em função da falta de gerador, que estragou durante o desabastecimento de fevereiro, dois equipamentos de alto valor apresentaram problemas. Juntos, os consertos dos aparelhos somam cerca de R$ 72 mil. O espectrômetro de massas é avaliado em R$ 1,5 milhão, e o ultrafreezer danificado custa cerca de R$ 35 mil.
Dois dias de apagão
No dia 12 de fevereiro – uma segunda-feira em meio ao feriado de Carnaval –, a interrupção do fornecimento na linha de transmissão que atende o Campus do Vale da UFRGS foi identificada pela CEEE Equatorial por volta das 14h30min. O motivo do problema foi a ruptura de dois cabos subterrâneos, ocorrida durante obra de escavação da CPFL Energia, dentro do pátio de subestação da empresa.
Um novo ponto de suprimento de luz foi viabilizado pela CEEE Equatorial durante a madrugada, enquanto a rede foi disponibilizada aos técnicos da UFRGS às 13h30min de terça-feira (13). O restabelecimento da energia ocorreu às 19h. O conserto definitivo dos dois cabos subterrâneos aconteceu ainda em fevereiro, segundo a CPFL Energia.
Segundo a universidade, a linha alternativa de energia elétrica que abasteceu o Campus do Vale funcionou até 27 de fevereiro de 2024, quando foi restabelecido o abastecimento pela linha principal. A falta de luz provocou perdas de equipamentos, insumos e pesquisas com plantas e animais que exigiram alto investimento financeiro e meses de dedicação.
Conforme o vice-reitor, já foi concluída a investigação a respeito do incidente. Ele afirma que foram identificadas falhas nos sistemas de controle dos geradores, bem como áreas que ainda estão descobertas e que precisariam de geradores. Atualmente, 45 geradores atendem instalações no Campus do Vale. O plano de abastecimento desses equipamentos também apresenta falhas e precisa de melhorias.
— Temos um plano de investimento, para que tenhamos sistemas de geradores com maior capacidade, com uma resposta mais pronta. Tivemos algumas falhas nos sistemas de backup e de redundância, que estão alimentando um plano de gestão para que possamos melhorar essas estruturas e ficarmos menos dependentes de intercorrências de concessionárias externas — afirma.
Zero Hora procurou a CEEE Equatorial, mas não obteve resposta até o fechamento desta reportagem.
Nota da UFRGS
A Comissão Administrativa instaurada pelo reitor à época emitiu relatório em 15 de abril de 2024 no qual conclui que houve danos materiais, imateriais, institucionais e acadêmicos para a UFRGS. Dentro do que foi possível mensurar, chegou-se ao valor de R$ 784.773,55. Ressalta-se que as perdas relativas a amostras de pesquisas, a horas de trabalho dos pesquisadores e a atrasos no andamento das pesquisas não foram computadas nesse valor.
O relatório da Comissão Administrativa recomendou que seja buscado o ressarcimento dos prejuízos junto à empresa CEEE Equatorial. Nesse sentido, foi emitida guia de recolhimento contra a CEEE Equatorial cobrando o valor apurado. A empresa ainda não efetuou o pagamento e solicitou informações e documentos à UFRGS, os quais estão sendo providenciados.
A linha alternativa de energia elétrica que abasteceu o Campus do Vale funcionou até 27 de fevereiro de 2024, quando foi restabelecido o abastecimento pela linha principal.
Há 45 geradores que atendem instalações no Campus do Vale. A UFRGS tem contrato de manutenção destes equipamentos com empresa contratada por licitação. Dois tipos de manutenção são realizadas: a manutenção preventiva é realizada mensalmente; a manutenção corretiva é realizada quando é detectada falha no acionamento do gerador ou quando, no momento da manutenção preventiva, detecta-se algum problema.