Estudantes da UniRitter e da Fadergs beneficiados pelo Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies) encontraram dificuldades na hora de fazer a rematrícula, no início deste ano. Aberto no dia 25 de janeiro, o período para se inscrever para o próximo semestre letivo começou bloqueado para parte desses alunos, dos quais eram cobrados débitos pendentes que eles alegam não ter e que, se tivessem, deveriam ser quitados junto à Caixa Econômica Federal, e não à instituição de Ensino Superior (IES).
Apesar de a rematrícula ter sido liberada na última sexta-feira (2) para esses discentes, os estabelecimentos de ensino condicionam a manutenção deles ao início da negociação das dívidas até 18 de março. Em nota a GZH, a UniRitter e a Fadergs – ambas pertencentes ao grupo educacional Ânima – informaram que pendências financeiras são impeditivas à realização do procedimento, mas que ele foi permitido “por mera liberalidade” de forma temporária, e que condições especiais para a quitação dos valores serão negociadas individualmente.
Entre os atingidos, o clima é de preocupação. Na semana passada, o Diretório Central de Estudantes (DCE) realizou atos em frente aos campi, chamando a atenção para a situação e reivindicando o desbloqueio das rematrículas. No WhatsApp, um grupo reunia cerca de 400 alunos que diziam passar pela mesma situação: não conseguirem se inscrever para o próximo semestre letivo e serem cobrados por dívidas que alegam não ter. Em uma planilha que criaram para organizar uma denúncia à Defensoria Pública do Estado, os discentes relatam serem demandados, pelas IES, pagamentos que vão de R$ 562,52 a R$ 112 mil.
O caso envolve estudantes que não têm 100% de suas mensalidades cobertos pelo Fies e, por isso, devem pagar uma parte delas, o que é chamado de coparticipação. Sophia Betat, por exemplo, ruma para o sexto semestre da faculdade de Medicina Veterinária e tem uma parcela coberta pelo Fies desde o segundo semestre.
— Sempre paguei tudo direitinho, e o nosso vínculo sempre foi com a Caixa, tanto que, em dezembro, eu fiz o aditamento com o banco, e não teria como eu ter feito, se não estivesse tudo quitado. Mas, no dia 25 de janeiro, abriu a rematrícula, todos os meus colegas que não têm Fies fizeram ela normalmente e eu não consegui — lamenta Sophia.
A discente relata que passou por uma dificuldade semelhante no semestre passado, mas que conseguiu contornar, porque, até então, a Caixa disponibilizava aos beneficiários do financiamento um relatório de repasse da coparticipação às IES. Desta vez, porém, a estudante foi informada de que o documento é sigiloso, e só pode ser mostrado pela agência financeira diretamente ao estabelecimento de ensino. Os alunos afirmam não saber de que se tratam os valores cobrados – no caso de Sophia, são quase R$ 5 mil.
A graduanda e muitos de seus colegas buscaram Defensoria Pública do Estado, da União, Juizado Especial Cível e Procon, na tentativa de resolver o problema. Fernanda Tatsch, como já havia enfrentado essa situação no semestre passado, contratou um advogado para atendê-la. Bolsista do Fies desde 2018, a estudante diz que chegou a entrar na dívida ativa, por conta dos valores exigidos, mas que o caso se resolveu após ingressar no Juizado Especial Cível, conhecido popularmente como “pequenas causas”.
— Nesta semana, entrei em contato para falar com eles (a UniRitter) e me falaram que eu estou com uma dívida de R$ 18 mil, mas que vão me dar um desconto e eu posso pagar R$ 7 mil. E, no site, é um terceiro valor que aparece. Estou pagando para a Caixa em dia e todo dia a instituição coloca um valor diferente — reclama a aluna atingida.
Bernardo Bertuol, advogado de Fernanda, aguarda a sentença de uma ação de declaração de inexistência de débito que move contra a IES, relativa ao semestre passado. No caso dela, seu financiamento contempla 70% do valor das mensalidades, precisando ser pagos outros 30% em boleto único no final de cada semestre letivo.
— Desde a metade do ano passado estamos acompanhando o caso, porque eles já haviam trancado a matrícula dela. No início, eu tinha a sensação de que o problema era uma falta de comunicação da instituição com a Caixa. Hoje, acho que é falta de organização ou até má-fé, porque nem os valores cobrados fecham — pontua Bertuol.
Ruth Pereira e o marido, Wendell Fiúza, são bolsistas do Fies na UniRitter. Quando viu que sua rematrícula estava bloqueada mais uma vez, Ruth entrou com uma ação em regime de urgência, pedindo a liberação do procedimento, e venceu: em 26 de janeiro, a juíza Thais Helena Della Giustina estabeleceu prazo de cinco dias para que a matrícula fosse autorizada. No caso da estudante, a preocupação é que, se não conseguisse cursar a graduação neste semestre, perderia o financiamento estudantil pela segunda vez.
— Eu já tinha trancado a minha faculdade por dois semestres seguidos, que é o máximo permitido, e era obrigada a voltar no segundo semestre de 2023. Fui me matricular e, no dia, recebi uma mensagem deles (UniRitter) dizendo que eu estava impedida, por ter esses valores residuais a pagar, que eu nunca soube que tinha. Acabei perdendo o Fies, mas recuperei a bolsa, por meio de um acordo extrajudicial que o meu advogado conseguiu, mas preciso obrigatoriamente cursar a faculdade neste semestre — explica Ruth.
Divergência
Há uma divergência entre os posicionamentos da Caixa Econômica Federal – banco que intermedeia os contratos do Fies – e das instituições nesse sentido. Enquanto as IES pontuaram, em nota, que esses alunos devem quitar a coparticipação diretamente com o estabelecimento de ensino, a agência financeira informou, também em nota, que a parcela da semestralidade é paga ao banco, que repassa o valor à instituição.
Segundo a Caixa, o que pode ser pago pelo beneficiário do Fies diretamente ao local onde faz a graduação é a diferença de valores, nos casos de reajustes de mensalidade no mês anterior ao aditamento de renovação do financiamento estudantil, que acontece a cada semestre.
Confira abaixo na íntegra as notas da UniRitter/Fadergs e da Caixa Econômica Federal.
UniRitter/Fadergs
Em resposta ao questionamento de GZH, a UniRitter e a Fadergs informam que há alguns estudantes com pendências financeiras com a Instituição, relativas ao Financiamento Estudantil - FIES e isso, por si, é um impeditivo à realização da rematrícula. Contudo, por mera liberalidade, a Instituição liberou temporariamente a rematrícula para estes casos, incentivando-os a virem até dia 18 de março tratar de condições especiais para a quitação das dívidas individualmente.
É importante destacar que cada contrato realizado por meio do FIES é único. Alunos que financiam 100% das mensalidades pagam diretamente ao banco, enquanto os demais integram um grupo que conta com FIES parcial e, por isso, têm coparticipação - uma parcela não financiada pelo FIES e que deve ser repassada diretamente à instituição de ensino.
A Instituição está empenhada em oferecer um atendimento especializado para demonstrar a situação financeira de cada aluno e disponibilizar condições facilitadas para a quitação dos débitos, reiterando assim seu compromisso com a qualidade da formação.
Caixa Econômica Federal
A CAIXA esclarece que, de acordo com a resolução CG-FIES nº 6/2017, compõe o boleto pago pelo estudante a parte relativa à coparticipação, que é o percentual da parcela da semestralidade não financiada pelo Fies e repassada pelo banco diretamente à instituição de ensino.
A cada semestre, no caso de reajuste, a mensalidade do curso do estudante pode ser alterada pela Instituição de Ensino, o que refletirá no valor de coparticipação cobrado do aluno no momento do aditamento de renovação.
Caso o aditamento aconteça em mês posterior ao reajuste da mensalidade, podem ocorrer cobranças de diferenças nos valores das prestações geradas antes do processo de renovação, que devem ser pagas pelo aluno diretamente à instituição de ensino.