Quando se trata do ambiente organizacional, não é raro ver profissionais esgotados com a rotina de trabalho, muitas vezes desempenhando tarefas que vão além de suas funções e trabalhando mais horas do que o previsto. O grande problema, segundo especialistas ouvidas por GZH, é quando os trabalhadores não percebem que chegaram a um ponto de exaustão e seguem vivenciando uma rotina intensa, com poucos momentos de descanso.
Embora não seja algo novo, esse fenômeno tem sido debatido nas redes sociais. Surgiu até um nome para descrever a situação – “burnon”, termo usado popularmente para descrever o estado de profissionais ou estudantes com altos níveis de estresse.
No entanto, esse termo não foi validado cientificamente, alertam especialistas. Segundo a doutora em Psicologia Social e Institucional, Carmem Giongo, o “burnon” nada mais é do que o princípio do burnout, patologia reconhecida globalmente pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
— A descrição dada para o burnon é exatamente o que caracteriza o burnout. Essa doença se estabelece nas pessoas mais apaixonadas pelo trabalho, que acabam se envolvendo muito com a atividade profissional, e não percebem o limite da exaustão. Com isso, acabam trabalhando além da conta e não percebem que estão adoecendo. Não há comprovação científica de que exista outra condição, o que diagnosticamos é o burnout — explica a pesquisadora e professora da Universidade Feevale.
Princípio do burnout
Cunhado por pesquisadores alemães (Timo Schiele e Bert te Wildt), autores de um livro sobre o assunto, o “burnon” é utilizado para descrever um estado em que o sujeito consegue manter um certo nível de produtividade, apesar do esgotamento, não percebendo que está próximo do colapso. Mas esse processo faz parte da própria síndrome de burnout, condição que pode levar meses ou anos, até a pessoa chegar no limite.
Desde 2022, a síndrome do burnout está entre as patologias listadas na 11ª versão da Classificação Internacional de Doenças (CID-11), da OMS. Para Carmem, esse reconhecimento das patologias ocupacionais é fundamental, para que seja possível diagnosticar e afastar os trabalhadores para tratamento, quando necessário. A disseminação de novos termos sem embasamento científico, entretanto, pode atrapalhar esse processo.
Ela explica que o burnout se manifesta com três sinais principais: a exaustão emocional, a despersonalização – quando a pessoa não vê mais propósito no trabalho ou não se enxerga mais naquele ambiente –, e a falta de realização com a atividade profissional. É isso que compõe o quadro de burnout. Mas esses sintomas aparecem aos poucos, e não de uma só vez, e esse adoecimento gradual é um princípio da síndrome.
— Quando o burnout começa a se instalar, nem sempre o trabalhador se dá conta de que está com um nível elevado de estresse. O burnout se caracteriza por um estresse crônico. Assim, a pessoa não percebe que os impactos na saúde estão relacionados ao trabalho e continua trabalhando num ritmo exaustivo, agravando o quadro — completa Carmem.
Como evitar o colapso
O burnout é capaz de trazer prejuízos para vida social, bem-estar, saúde física e mental dos indivíduos. Por isso, é importante ficar atento aos sinais, como irritabilidade, dificuldades na alimentação e no sono, e prevenir essa condição. Segundo a psicóloga e orientadora de carreira Luana Rambo, da Unisinos Carreiras, é necessário buscar equilíbrio na rotina.
De acordo com ela, esse problema tem origem na cultura organizacional adotada por muitas empresas e indivíduos, que endossa que o trabalhador bem-sucedido é aquele que mais entrega resultados e com maior velocidade, aquele que ultrapassa os limites e tem alta performance o tempo todo. Com o passar do tempo, isso provoca o adoecimento dos empregados, e esse comportamento não deve ser incentivado pelas empresas.
— O sofrimento vai aparecendo gradualmente. Aos poucos, o sujeito vai deixando de lado outras áreas da vida e colocando o trabalho acima de tudo, quando se vê diante de escolhas. Se a empresa ou instituição não permite ter equilíbrio, a gente se perde em relação a isso e acaba não enxergando os limites do que é saudável — destaca Luana.
Conforme a especialista, é importante buscar prazer em outras dimensões da vida, para além do trabalho. Também é necessário que as próprias organizações desenvolvam ferramentas para garantir o bem-estar dos colaboradores. É preciso criar momentos de pausa, limitar a jornada de trabalho e ter políticas de saúde mental, de modo a identificar quando acontecem esses problemas, e não deixar que o profissional chegue ao ápice do burnout.
— As empresas precisam implementar políticas e ter um sistema de prevenção. É importante capacitar as lideranças, porque quem precisa identificar esses problemas são os líderes. As patologias ocupacionais afetam diretamente o desempenho e o relacionamento entre os colegas de trabalho. É necessário reconhecer uma situação de sofrimento quando acontece, porque é normal que o trabalhador não se dê conta disso — afirma Carmem.