Nos últimos 10 anos, a oferta de cursos de graduação no modelo de ensino a distância (EaD) aumentou 486% no Brasil. A expansão é puxada pela formação de professores, cuja maioria também se forma pelo EaD, mostrou uma pesquisa do Movimento Todos pela Educação. No ano de 2020, pela primeira vez na história da educação brasileira, o país teve mais alunos ingressando em cursos de graduação online do que em cursos presenciais. Dos cerca de 8,7 milhões de universitários brasileiros, 5,6 milhões estão em salas de aula presenciais e 3,1 milhões no ensino remoto, conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) analisados pelo Instituto Semesp.
O quadro Mais Vozes, do programa Gaúcha + da Rádio Gaúcha desta terça-feira (2), conversou com pesquisadores e líderes de entidades de educação sobre os pontos positivos e negativos do ensino a distância. Participaram do quadro o coordenador do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Sérgio Franco, o diretor da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior, Sólon Caldas, a diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da Faculdade Getúlio Vargas (FGV), Dr. Claudia Costin, a vice-presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped), Gisele Real e o coordenador de políticas educacionais do Todos pela Educação, Leonardo Yada.
Para Sérgio Franco, o ensino remoto não pode ser o modelo protagonista da educação brasileira, mas sim um complemento para a formação acadêmica. Segundo Franco, não pode se pensar em formação superior como mera transmissão de conhecimento.
— Quando se pensa em formação superior, não se pensa na formação de pessoas letradas que tenham muitas informações. Mas pessoas que aprendam a pensar, e a gente não aprende a pensar assistindo aulas transmitidas ou só lendo material. A gente aprende a pensar nos processos que são interativos. E aí a presencialidade é muito importante. Pode acontecer isso em situações a distância? Pode. Mas não abrindo mão completamente da presencialidade e não reduzindo a educação a distância a mera transmissão — pontuou.
Entre os pontos destacados por Sólon Caldas, um questionamento aos conselhos profissionais de áreas como Arquitetura, Psicologia, Engenharia, Medicina e Farmácia, que se opõem a cursos de formação EaD para as respectivas áreas. Para ele, o modelo híbrido não torna precário a formação dos futuros profissionais.
— Diferente do que os conselhos profissionais defendem, não existe no Brasil cursos 100% a distância. Ou seja, as aulas práticas são realizadas presencialmente e as teóricas é que são realizadas no formato EaD. A função dos conselhos profissionais é a fiscalização da profissão, da formação acadêmica, o MEC é que tem a responsabilidade definida, inclusive na Constituição Federal. O mercado de trabalho não faz distinção alguma entre profissionais formados no presencial ou no EaD. Em recente pesquisa realizada pela BMS, em parceria com a Simplicity sobre empregabilidade, 69% dos egressos com até um ano de formado estão trabalhando. Independentemente da sua modalidade de formação. A tendência daqui para frente é o modelo híbrido, onde a metodologia de ensino oferece duas ou mais formas de ensino aprendizagem. Esse modelo durante a pandemia foi o mais utilizado, e portanto, já testado e aprovado pelos alunos — reforçou Sólon.
Claudia Costin pondera que "educação a distância não necessariamente é mais barata" ou de "baixa qualidade", e que o EaD ajuda pessoas que trabalham ao longo do dia e querem continuar com os estudos.
— O fato de que cada vez mais pessoas buscam a educação a distância pode estar conectado com o desejo (de adultos) de prosseguir na sua aprendizagem, num termo que vem sendo muito utilizado, que é a aprendizagem ao longo da vida. Nem sempre um profissional que passa o seu dia no trabalho consegue se qualificar pegando um carro depois que sai do trabalho e se dirigindo a um local de cursos.
Para a vice-presidente da Anped, Gisele Real a educação a distância pode ser um caminho para encurtar as desigualdades.
— O que se propõe é uma educação a distância que não massifique a Educação Superior e a pós-graduação, mas que ela abra espaços para esse movimento de inclusão no sentido de minorar as assimetrias regionais e as assimetrias socioeconômicas que nós temos no Brasil, especialmente focando na Educação Superior e a pós-graduação. Então para isso, os pesquisadores vêm amplamente discutindo e apontando indicadores que pensam uma pós-graduação com a qualidade socialmente referenciada, é disso que eu acho que nós temos que avançar a partir de agora — salientou Gisele.
Para Leonardo Yada, é impossível determinar a qualidade dos cursos EaD de formação inicial docente, mas ele defende que o Ministério da Educação precisa rever os critérios para validação destes cursos.
— Então, se a gente olhar para os dados, a gente já vê que a percentual de concluintes na modalidade EaD nos cursos de formação inicial docente é o dobro do percentual de concluintes na modalidade EaD de mais cursos. Se a gente olhar para outros, que não de formação inicial docente, nesse sentido é importante que o MEC aprimore os processos avaliativos regulatórios dos cursos de formação de professores, para que se tenha uma noção da qualidade desses cursos.