Alvo de polêmica por ter sido escolhido pelo presidente Jair Bolsonaro como reitor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) mesmo sendo o terceiro colocado nas consultas acadêmicas, Carlos André Bulhões Mendes confirmou que assumirá o cargo e afirmou que não guarda rancor de adversários. Professor do Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH) da UFRGS, Bulhões havia afirmado durante a campanha ter o "desejo de respeitar" o resultado do pleito interno mesmo que a chapa escolhida por Brasília não fosse a vencedora.
Nesta quinta-feira (17), em coletiva de imprensa online, ele mudou o discurso. Disse que sua nomeação cumpre os regimentos internos e que foi "lembrado" por assessores de ter firmado um compromisso, junto aos demais candidatos, de assumir a reitoria caso estivesse na lista tríplice enviada ao Ministério da Educação (MEC).
— Minha coordenação de campanha me lembrou: "O senhor disse isso mas se equivocou, pois assinou junto com os demais candidatos a declaração de investidura no cargo, onde declaramos que se estivesse na lista tríplice, aceitaria ser nomeado como reitor" — disse Bulhões aos jornalistas. — E, como servidores públicos, somos obrigados a cumprir o que assinamos.
A controvérsia se impôs porque, embora o presidente tenha a prerrogativa legal de optar por qualquer uma das três chapas que integram a lista, a aceitação da vencedora nas consultas internas costuma ser vista como um sinal de respeito à autonomia acadêmica. Neste caso, seria o atual reitor, Rui Oppermann, que ficou em primeiro.
Parte dos professores, dos servidores e o Diretório Central Estudantil (DCE) têm apontado a indicação de Bulhões como uma tentativa de interferência de Bolsonaro na universidade. Nesta quinta-feira, houve uma manifestação de grupos contrários à posse no pátio da universidade.
— Estou sendo discriminado ao longo da minha caminhada, gerou-se um sentimento de preconceito, julgamentos e prepotência. Espero que pelo menos minha integridade física e da minha família estejam garantidos — desabafou.
Durante a coletiva, Bulhões procurou adotar um tom conciliador e repetiu diversas vezes sua intenção de respeitar o regimento interno da UFRGS. Disse que desde a indicação de seu nome tem tentado conversar com o atual reitor, mas sem sucesso.
— Eu ainda não consegui conversar com eles (os adversários), devem estar alinhando seus sentimentos. A campanha terminou no dia 13 de julho. A partir daí, todos podemos dialogar juntos, com tolerância, paz, prosperidade e educação — afirmou.
Corte no orçamento
O novo reitor afirmou que um processo de transição "sem grandes disrupções" será iniciado na segunda-feira (21). A partir daí, será feita uma análise no calendário para tentar encerrar o primeiro semestre até 2 de dezembro, após a instituição ter passado meio ano paralisada por causa da pandemia de coronavírus, e planejar o próximo vestibular. Uma das prioridades será a revisão itens do atual regimento que "caducaram" mas permanecem. No entanto, ele não explicitou quais seriam.
Bulhões mostrou enxergar com naturalidade uma eventual redução de 16,5% no orçamento das universidades proposto pelo Ministério da Educação para 2021, em razão do efeito econômico da pandemia. Conforme a atual reitoria, a proposta de orçamento para 2021 (PLOA 2021) enviada pelo governo federal ao Congresso Nacional prevê uma redução de R$ 165 milhões para R$ 138 milhões na verba de custeio da UFRGS.
— O primeiro compromisso é honrar o pagamento de servidores, inclusive os aposentados. Para uma universidade do porte da UFRGS, o que sobra é muito aquém das necessidades. Esta é a nossa principal dor de cabeça. Por isso que financiamento da educação superior é uma prioridade — avaliou.
Bulhões disse que a UFRGS passará a tentar equilibrar as finanças com geração própria de recursos, em parcerias de pesquisa e geração de conhecimento que rendam dividendos à universidade:
— O pós-pandemia será realidade cada vez mais difícil. Vamos encaminhar a criação de uma Pró-reitoria de Inovação para negociar com os setores público e privado, organizações nacionais e internacionais. Isso não quer dizer que não deveremos fazer cortes nas despesas e garantir nossa cota da verba pública. Mas também temos que procurar nossa autonomia administrativa e financeira.
Universidade de 32 mil alunos
Conforme o Ministério da Educação, ainda não foi definida a data da posse para o novo reitor da UFRGS. Bulhões assumirá uma universidade que em 2019 obteve pela oitava vez consecutiva a melhor avaliação do Inep/MEC entre as universidades federais brasileiras. Com mais de cem cursos de graduação (presenciais e a distância) em todas as áreas do conhecimento, a UFRGS tem cerca de 32 mil graduandos.
Na pós-graduação, são 82 cursos de mestrado acadêmico, oito de mestrado profissional, 72 de doutorado e 170 especializações. A universidade se destaca também como um dos maiores centros da produção científica no Brasil. Além do crescente número de artigos publicados, totalizando 15.806 no período de 2013 a 2017, a UFRGS aparece em levantamento realizado pela Clarivate Analytics como a quinta maior produtora de pesquisa científica do Brasil, a primeira fora do eixo Rio-São Paulo e a segunda maior universidade federal.
Em julho, a revista britânica Times Higher Education (THE) colocou a UFRGS entre as 20 melhores universidades da América Latina, assim como a Pontifícia Universidade Católica do RS (PUCRS). A mesma publicação indicou a instituição entre as oito melhores universidades do Brasil.
Trabalham na UFRGS 2.942 professores, sendo a grande maioria (2.692) com título de doutor, e 2.522 técnico-administrativos, sendo 490 mestres e 150 doutores.