A folha de pagamento é uma questão central quando se fala em bancar a universidade federal. Trata-se do principal gasto e ele não para de crescer. Representava uma despesa de R$ 29 bilhões em 2014, mas neste ano atingiu R$ 42 bilhões — o que significa 86% do orçamento total das instituições. Em outros países, o peso da folha de pagamento costuma estar em um patamar mais baixo.
Especialistas veem nessa situação uma espécie de bomba-relógio. Como a emenda constitucional 95, de 2016, estabeleceu um teto para os gastos públicos, mas o custo com pessoal continua a ter crescimento vegetativo, a consequência é que as demais verbas para a universidade vão encolhendo. E essas são justamente as verbas que chegam de fato aos reitores, para que eles possam pagar as contas e abrir as portas.
Neste mês, por exemplo, a UFRGS não conseguiu pagar uma fatura de energia elétrica de R$ 1,8 milhão — e isso antes de que o bloqueio no orçamento anunciado por Weintraub começasse a causar algum impacto. É justamente nessas verbas para o dia a dia — pois está impedindo de cortar nos custos com pessoal — que o governo promoveu o contingenciamento de 30% responsável por levar uma multidão de manifestantes às ruas no último dia 15.
Sérgio Franco diz que, se os aposentados das federais estivessem em outra parte do orçamento da União, e não no orçamento das faculdades, seria um alívio:
— Bem, é um custo para o governo, sem dúvida nenhuma, mas o fato de os aposentados não aparecerem como gasto previdenciário é uma maneira de tirar mais recurso da universidade. Como estão dentro da folha e não se pode aumentar o teto de gastos, daqui a alguns anos só vai ter dinheiro para pagar pessoal.
Não há solução à vista para desatar esse nó. Não se pode retirar direitos de quem se aposentou ou de quem está já está na ativa, e uma mudança de plano de carreira, que valeria apenas para novos contratos, teria efeitos só a médio e longo prazo. É um modelo muito engessado, na opinião do economista Renan Pieri, da Fundação Getúlio Vargas (FGV) de São Paulo.
— Um problema estrutural do setor público brasileiro é que não pode demitir pessoal. As despesas só aumentam e, quando há queda de receita, por causa da situação fiscal, da queda de arrecadação, da falta de crescimento econômico, não tem como arcar com os custos. Daí se faz uma economia burra, que é cortar bolsas de pesquisa, manutenção de laboratório, segurança no campus, tudo que é essencial, porque não se consegue fazer ajuste na folha de pagamento. Se fosse uma empresa enfrentando uma situação dessas, cortaria pessoal dos setores menos eficientes — observa o economista.
O professor Renato Janine Ribeiro, ministro da Educação por seis meses em 2015, tem um ponto de vista diferente sobre a questão dos custos com pessoal na universidade. Ele ressalta que, quando se fala em ensino, o gasto envolvido sempre é basicamente salário. E que, na universidade, esse salário deve ser alto.
— A folha de pagamento não é o problema, porque se você quer ter uma boa universidade, tem de pagar bem o professor. A Lei de Responsabilidade Fiscal fala em cerca de 60% como limite de gastos com pessoal, mas na universidade isso é uma bobagem, porque lá faz mais sentido ter um professor bom do que uma sala bonita e bem iluminada. Se a universidade for boa, a folha de pagamento dela vai ser elevada. Não existe universidade boa com salários baixos — defende Janine.
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Por que fizemos esta matéria?
Declarações do presidente Jair Bolsonaro e de Abraham Weintraub, ministro da Educação, levantaram a discussão em torno dos gastos com educação. A fim de trazer dados necessários e relevantes a esta discussão, o Comitê Editorial do Grupo RBS sugeriu à Redação Integrada uma reportagem profunda sobre financiamento da Educação Superior no Brasil, comparando-o com outros países.
Como apuramos esta matéria?
Um dos principais investimentos foi buscar estatísticas que revelassem a situação do financiamento da educação do Brasil e também que permitissem compará-la com a de outros países. Foram consultados dados e notas técnicas do Ministério da Educação, além do relatório Education at a Glance 2018, um alentado estudo comparativo da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Ainda foram entrevistados professores e especialistas em Educação que têm se dedicado ao tema e que contemplam diferentes pontos de vista sobre a questão.