Durante sabatina na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, nesta terça-feira (8), Gabriel Galípolo, indicado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para comandar o Banco Central a partir de 2025, disse que sempre ouviu de Lula a garantia da liberdade na tomada de decisões da instituição.
— Toda vez que me foi concedida a oportunidade de encontrar o presidente Lula, eu escutei de forma enfática e clara a garantia da liberdade na tomada de decisões e que o desempenho da função deve ser orientado exclusivamente pelo compromisso com o povo brasileiro.
Galípolo comentou ser um privilégio ter sido indicado para presidir o Banco Central pelo presidente Lula.
Ele também salientou que compete ao BC ser o guardião da moeda.
— A confiança depositada à instituição é um dos pilares centrais da sociedade civil organizada como nós conhecemos. Então isso por si só já é uma enorme responsabilidade. Ela é amplificada pelo desafios impostos, pelo quadro histórico em que a gente vive, mas também pela confiança que é depositada em mim e em toda a diretoria do Banco Central— mencionou.
Galípolo disse que, apesar de poder estar "meio fora de moda", a tentativa é de evitar antagonismos e cizânias para tentar construir e exaltar a convergência e o diálogo.
— Faço questão de reafirmar: todas as conversas com as senadoras e senadores, independente do partido, se oposição ou situação, também foram todas no sentido de me assegurar a liberdade na gestão e de manter o compromisso com o nosso povo e com o nosso País", descreveu.
Sobre a taxa Selic
Gabriel Galípolo declarou que cabe à instituição (Banco Central) colocar o juro em nível restritivo pelo tempo necessário para atingir meta, durante sabatina.
— Sou daqueles que defendem que o Banco Central não deveria nem votar na meta de inflação dentro do Conselho Monetário Nacional (CMN). Hoje temos uma meta estabelecida de 3%, que cabe ao Banco Central perseguir de maneira efetiva, colocando a taxa de juros em um nível restritivo pelo tempo que for necessário para se atingir essa meta. Essa é a função do Banco Central, assim que funciona o arcabouço institucional e legal do Banco Central— explicou.
Ele comentou sobre o tema ao abordar a questão da autonomia da instituição.
— Sou relativamente novo na vida pública, mas aprendi que nos debates da vida pública existem algumas palavras-chave, que são quase um gatilho. E eu aprendi que autonomia é uma dessas palavras que costumam gerar um debate acalorado. Eu costumo brincar: a gente precisa fazer um rebrand, a gente precisa reexplicar a ideia de autonomia— disse.
Galípolo salientou que o BC tem autonomia operacional para buscar as metas que foram estabelecidas pelo poder democraticamente eleito. "A gente só pode até a adolescência achar que fazemos o que bem entendemos. Depois disso, não podemos mais achar isso", considerou, continuando com a afirmação de que cabe ao BC e à sua diretoria perseguirem a meta de inflação.
A autonomia da autoridade monetária, de acordo com o diretor, não deve passar a ideia de que o BC deve "virar as costas" ao poder democraticamente eleito. Ele também reforçou a necessidade de haver um arcabouço institucional que permita ao BC desempenhar suas funções.
Avanço do Banco Central
Ao lado do autor da PEC 65, que dá autonomia orçamentária e financeira ao Banco Central, senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO), Galípolo defendeu que a autarquia esteja disponível para conduzir seu avanço institucional.
— É necessário a gente dar as condições necessárias para que as pessoas possam trabalhar. Não só com o serviço remuneratório delas, mas da infraestrutura necessária, e entendo que hoje está se discutindo muito mais o formato que vai se dar essa discussão de uma evolução institucional— defendeu.
O diretor disse concordar com o senador Sergio Moro (União-PR) sobre a importância também de o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) ter a infraestrutura necessária para a função que desempenha.
Sobre o câmbio flutuante
Gabriel Galípolo repetiu que o regime de câmbio brasileiro é flutuante e, com isso, a cotação da moeda serve para absorver eventuais choques que atinjam a economia.
Galípolo, que é diretor de Política Monetária e responsável pelo departamento que cuida da política cambial no BC, lembrou que as preocupações sobre o câmbio oscilam. Ele disse que, quando foi indicado para a diretoria, em meados do ano passado, havia a preocupação de que a autarquia se tornaria mais intervencionista Depois, esse polo mudou.
— No ano de 2023, foi o primeiro ano que a gente não fez nenhuma intervenção extraordinária no final do ano. Aí eu passei a ser acusado de ser mão fraca, 'ele não intervém, ele deixa correr.' Então, essas coisas às vezes oscilam muito — ele disse, respondendo a perguntas de senadores.
Galípolo repete Campos Neto ao falar sobre gastos fiscais de países avançados, na pandemia
Galípolo disse concordar "integralmente" com o que vem defendendo Campos Neto e citou uma fala do ex-primeiro-ministro britânico Winston Churchill durante sua fala.
— Sobre a questão da pandemia, existe uma correlação com o tema climático e com o custo da dívida. Durante a pandemia, Roberto Campos Neto tem dito em vários fóruns, e vou reproduzir a fala porque concordo integralmente: os países avançados fizeram um esforço fiscal maior que países emergentes ou de baixa renda para responder à pandemia. Imediatamente, começa a discussão sobre o processo inflacionário — disse o diretor.
Galípolo observou que esse "é um grande debate global, o quanto aquele processo correspondia a um choque de oferta pela desarticulação das cadeias produtivas e dificuldade de produzir, e quanto correspondia a uma questão de demanda decorrente dos programas de transferência de renda e socorro por causa da pandemia".
— Existia essa discussão. Minha posição, eu recorro sempre quando tem esse debate a uma fala do Churchill, é que a verdade é uma adúltera, nunca está com uma pessoa só. Provavelmente você consegue encontrar explicações nos dois elementos. Não precisa ser um ou outro. Me parece que é um e outro — completou o diretor.
O Banco Central e as bets
Gabriel Galípolo explicou que a instituição não tem atribuição para regular sites de apostas.
— O Banco Central não versa ou não tem qualquer tipo de atribuição sobre a regulação de bets, não é o papel do Banco Central. A discussão em si é sobre qual é o impacto das bets do ponto de vista de consumo.
Ele voltou a dizer que, ao analisar dados do crescimento da renda, do consumo e da poupança foi constatada a existência de um vazamento que não era simples de identificar.
— Nós passamos a fazer estudos internos e a dialogar com diversos bancos e instituições financeiras que podiam ter dados e acessam a informação sobre isso — descreveu, acrescentando que, no início, estava desconfiado da grandeza dos dados.
Ele citou o estudo feito pelo Banco Central sobre o tema e voltou a dizer que a instituição não tem qualquer solução sobre a regulação de jogos e apostas.
— A nossa função é muito mais tentar entender qual é o impacto disso em consumo, em endividamento das famílias, como é que a gente consegue explicar a relação entre a atividade econômica, despesas e o impacto para a inflação— enumerou.
Relação entre BC e Executivo
— Eu sinto que eu gerei uma grande frustração, talvez, na expectativa que existia de que ao entrar no Banco Central fosse começar um grande reality show, com grandes disputas e brigas ali dentro — afirmou.
Ex-secretário-executivo da Fazenda na gestão Haddad, Galípolo foi indicado para a diretoria de Política Monetária do BC em julho do ano passado, com o objetivo de "harmonizar" a relação entre a autoridade monetária e a equipe econômica.
Na sabatina, o diretor afirmou que tem "a melhor relação possível" tanto com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, quanto com o presidente do BC, Roberto Campos Neto.
— Faço uma mea culpa: eu gostaria de, dentro das minhas funções, ter colaborado para que essa relação entre o Banco Central e o próprio Poder Executivo fosse melhor ainda do que ela tem sido — afirmou.
Galípolo não respondeu a um questionamento do senador Izalci Lucas (PL-DF), que havia perguntado se Galípolo considera as críticas de Lula a Campos Neto "justas".
Sobre superávit
Galípolo lembrou que o Brasil enfrentou durante os anos 80 uma crise profunda, levando à moratória da dívida externa e à exclusão do circuito financeiro internacional.
— Hoje o Brasil é credor líquido internacional com mais de US$ 350 bilhões de reservas. O Brasil apresenta hoje um superávit comercial sólido e estrutural graças à produtividade e à competência dos seus empresários com destaque à competitividade — afirmou.
Além disso, segundo ele, o Brasil se solidificou como exportador de produtos como o petróleo, combinado com uma matriz energética limpa e diversificada.
O diretor também falou que a segurança alimentar e energética são vantagens especialmente relevantes em momentos de tensões políticas elevadas.