A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou na terça-feira, após quase seis horas de debate, por 20 votos a seis, o texto-base do senador Eduardo Braga (MDB-AM) sobre a reforma tributária. O resultado atingiu as expectativas dos interlocutores do governo federal, que estimavam de 18 a 20 votos favoráveis à proposta no colegiado.
O texto segue, agora, para análise no plenário, onde há previsão na pauta para ser deliberado nesta quarta-feira (8) a partir das 14h. Para ser aprovado será preciso ter ao menos 49 votos dos 81 senadores.
Na CCJ, a aprovação se deu após uma série de modificações feitas por Braga em uma complementação de voto. A quantidade de alterações e as novas exceções criadas levaram a um receio de um aumento na alíquota-padrão a ser criada com a reforma tributária.
Por outro lado, integrantes do governo e parlamentares envolvidos com a discussão da reforma avaliam que essas mudanças são "acessórias" e que o cerne da proposta, que é a unificação dos impostos e a simplificação tributária, está mantido.
A reforma tem objetivo de simplificar o sistema tributário e transformará cinco tributos (ICMS, ISS, IPI, PIS e Cofins) em três: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto Seletivo. Cada novo tributo terá um período de transição. A CBS e o IBS, que tributam o consumo, são formas de imposto sobre valor agregado (IVA), que incide apenas nas etapas do comércio que geram novo valor ao produto ou serviço e assim evita novas cobranças sobre impostos já pagos.
Braga anunciou que pedirá ao Ministério da Fazenda um novo estudo sobre a alíquota com base no texto que for aprovado no Senado, que incluiu novas exceções.
— Da mesma forma que eu fui no Ministério da Fazenda pedir que apresentasse um estudo sobre a alíquota com base no texto aprovado pela Câmara dos Deputados, nós vamos pedir também um estudo sobre a alíquota do texto aprovado no Senado Federal — afirmou.
A pedido do Senado, o Ministério da Fazenda divulgou um estudo, no início de agosto, com estimativas da alíquota somada do IBS e da CBS com a reforma tributária.
Pelas contas da equipe econômica, o texto da Câmara levaria a uma alíquota-padrão geral de 25,45% (em um cenário chamado de "factível") a 27% (em um cenário "conservador"). Caso não houvesse nenhuma exceção, a Fazenda calculou que a alíquota poderia ser de 20,73% (no cenário "factível") a 22,02% (no "conservador"). Na segunda-feira, o secretário extraordinário da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, estimou que a alíquota-padrão ficará entre 25,9% e 27,5%.
Braga aceitou quase 250 emendas apresentadas pelos senadores, sendo 93 dos partidos do bloco de oposição, o que mostra a disposição em negociar com os críticos ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para viabilizar a aprovação da reforma tributária.
A reação
Em nota, a Federação das Indústrias do Estado (Fiergs) considerou "inaceitável" uma alíquota de 27,5% para o futuro IVA.
"Essa alíquota difere dos cálculos anteriores, quando no máximo chegaria a 24% e, nesse patamar, seria neutra em relação à carga tributária vigente. O valor maior em três pontos percentuais _ mais de 10% _ decorre de exceções de benefícios incluídas na proposta original", aponta o comunicado.
A federação avalia que qualquer elevação da carga tributária inviabiliza o desenvolvimento do país e destaca que "a questão fiscal só será resolvida efetivamente quando os governos realmente reduzirem seus gastos e não pelo simples aumento de impostos".
A tramitação
- Para ser aprovada, uma PEC depende do apoio de três quintos da composição de cada Casa, em dois turnos de votação em cada plenário.
- A Câmara dos Deputados aprovou o relatório da reforma em julho. Ontem, foi a vez da CCJ do Senado. Falta a votação no plenário da Casa, onde são necessários 49 votos dos 81 senadores.
- O texto só é aprovado se houver completa concordância entre a Câmara e o Senado. Como Eduardo Braga, relator no Senado, apresentou um substitutivo, o texto passará por nova análise dos deputados.
Alterações
Mais uma série de emendas na reta final de articulação amplia o rol de exceções e setores beneficiados com o novo sistema tributário. Confira algumas delas
Setor automotivo
Ampliado dos benefícios fiscais a montadoras de Norte, Nordeste e Centro-Oeste. O regime diferenciado para as que produzem carros elétricos é estendido aos que fabricam também carros movidos a etanol e modelos flex.
Revitalização de áreas
Isenção ou redução de até 100% dos impostos para atividades de reabilitação urbana de zonas históricas e de áreas críticas de recuperação urbanística.
Saúde 1
Zerada a alíquota para a aquisição de medicamentos e equipamentos médicos adquiridos pela administração pública e por entidades de assistência social sem fins lucrativos.
Saúde 2
Composições para nutrição enteral ou parenteral e fórmulas nutricionais são consideradas medicamentos e, desta forma, também têm regime diferenciado de tratamento tributário.
Taxistas e pessoas com deficiência
Mantida a atual isenção na compra de automóveis.
Clube de futebol
Incluída no rol de regime específicos as chamadas SAFs (sociedades anônimas do futebol), para manter o atual formato de recolhimento unificado dos tributos aplicáveis.
Plataformas
Isentado de IPVA os locais com finalidade principal de exploração de atividades econômicas em águas territoriais e na zona econômica exclusiva.
Botijão de gás
Pessoas de baixa renda (cadastradas no CadÚnico e no Bolsa Família) são incluídas no modelo de receber de volta parte do dinheiro pago na compara de gás de cozinha. Regulamentação será por meio de lei complementar.
"Premiação"
Reduzido o percentual que será repartido da arrecadação do IBS, que substituirá o ICMS e o ISS, por meio de uma média ponderada entre a arrecadação com os tributos atuais e com o novo imposto. Na prática, beneficia os quem forem mais eficientes na arrecadação
Ciência
Foi zerada também a alíquota do IBS para serviços prestados por instituição científica, tecnológica e de inovação. Na versão anterior, havia sido zerada somente a alíquota de CBS.
Centro-Oeste
Institui nova contribuição em substituição aos fundos estaduais de infraestrutura. Na prática, permite cobrança de tributos pelos Estados dessa região sobre exportações de grãos, produtos primários e semielaborados até 2043.