Quem trafega pela BR-116, entre Canoas e São Leopoldo, já deve ter percebido a diferença no preço da gasolina comum. Nos últimos dias, reajustes de R$ 0,30 a R$ 0,80 por litro foram aplicados em alguns postos da região.
A equipe de reportagem de GZH circulou pela região metropolitana de Porto Alegre e pelo Vale do Sinos. Houve aumento em, no mínimo, 10 estabelecimentos ao longo do trajeto. Curiosamente, há semanas a Petrobras não anuncia aumento do preço.
Em dois postos postos de Esteio, por exemplo, dois reajustes foram identificados desde o início da semana. No primeiro local, a semana começou com a gasolina custando R$ 4,99, passou para R$ 5,49 e, por fim, chegou a R$ 5,79.
Próximo dali, o combustível podia ser encontrado por R$ 5,76 o litro na quarta-feira (15), sendo que, dias antes, chegou a ser vendido por R$ 4,99 e R$ 5,46.
Sulpetro elenca série de motivos
Como a Petrobras não anunciou qualquer aumento do preço, a cobrança de centavos a mais na gasolina comum tem causado estranhamento para muitos motoristas.
Para entender a lógica por trás da flutuação dos preços, GZH entrou em contato com o sindicato que representa os postos de combustíveis do Rio Grande do Sul, o Sindicato Intermunicipal do Comércio Varejista de Combustíveis e Lubrificantes no RS (Sulpetro). A entidade elencou vários motivos para explicar o cenário atual.
Como pano de fundo, o presidente João Carlos Dal´Aqua afirma que muitos postos têm operado "no vermelho", passando por uma realidade distante da que a população costuma ter sobre quem vive do negócio.
— Vou te citar Porto Alegre como exemplo. Se tu pegares a Avenida Icaraí, na Zona Sul, tinha um posto que fechou. Na sequência, faz a curva perto do (Barra) shopping, um posto fechou. Aí você vai subindo em direção ao Beira-Rio, mais um posto que fechou. Descendo, ao lado do asilo (Padre Cacique), tinha um posto que fechou. Seguindo a (Avenida) Praia de Belas, outro posto que fechou. Vamos dobrar agora na (Avenida) Ipiranga, perto da (Rua) Múcio (Teixeira), fechou um posto. E vamos indo! Em frente ao Bourbon (Ipiranga) tinha outro, fechou. Lá do lado da PUC-RS também. Há uma mudança de cenário porque a margem de lucro está muito ruim há muito tempo. A dificuldade dos postos é tentar um equilíbrio.
Reajuste dos funcionários
De acordo com Dal'Aqua, se o litro da gasolina comum é vendido a R$ 5,00, o posto costuma ter uma margem bruta de lucro em torno de 10% e 12% — o que representa aproximadamente R$ 0,50. Desse valor, o proprietário ainda precisa tirar uma parte para destinar às despesas. Um dos itens com maior peso é a folha de pagamento de funcionários.
— Está entrando exatamente agora o reajuste salarial dos funcionários dos postos, definido em convenção. Também estamos nos preparando para o final de ano, que tem 13º salário e outras oscilações.
O piso salarial de frentistas, lavadores, secadores, serviços gerais e outras funções exercidas nos postos de Porto Alegre agora é de R$ 1.643,23. Já o salário-base para zeladores, guardas e vigias para jornada normal de trabalho é de R$ 1.478,37.
No caso dos frentistas e outros profissionais que trabalharem a menos de 7,5 metros das das bombas de abastecimento, a remuneração recebe um adicional de 30%, chegando a R$ 2.130,99, devido à periculosidade.
Concorrência acirrada
É bastante comum encontrarmos preços iguais ou bastante próximos em postos de combustíveis diferentes de uma determinada região. Por não haver tabelamento, fatores como demanda e concorrência costumam influenciar no quanto é cobrado pelo combustível.
— O consumidor às vezes não entende porque é difícil mesmo. Explicar porque subimos ou baixamos se não teve anúncio da Petrobras não é simples. A competição é desenfreada. Ela é tão grande que tem muitos postos fechando — afirma João Carlos Dal'Aqua.
Segundo o Sulpetro, quando um posto de combustíveis baixa o preço, atraindo mais clientela, ele costuma ser acompanhado por outros estabelecimentos, que se obrigam a reduzir o valor cobrado pela gasolina para não perder tantos motoristas.
Só que a margem de lucro varia de posto para posto. Enquanto alguns possuem uma maior capacidade financeira, podendo baixar mais para competir e seguir conquistando novos clientes, outros passam a operar no vermelho — é nesse momento que, mesmo não havendo reajuste da Petrobras ou até mesmo um dia antes de um aumento entrar em vigor, o combustível passa a ficar mais caro para compensar as perdas.
É importante destacar que a flutuação de preços movida pela concorrência não é a mesma coisa que o acerto de preços entre diferentes empresas para controle do mercado - esta conduta caracteriza a formação de cartel, que é crime e pode levar à prisão.
— Se nós perguntássemos aos donos de postos se eles gostariam que o preço fosse tabelado, tenho certeza de que 99% diriam: "tabela o preço, pelo amor de Deus, e me dá uma margem de lucro" — comenta Dal'Aqua.
Lojas de conveniência para redução de prejuízos
Algo bastante comum de encontrarmos nesse tipo de negócio é a instalação de lojas de conveniência, restaurantes e farmácias. A formação desses centros comerciais, segundo o sindicato que representa os postos de combustíveis, busca não só atrair clientes, como também reduzir os impactos de eventuais prejuízos em torno da venda de gasolina.
— Muita gente está tentando (por meio) do combustível (mais barato) uma maneira de atrair o cliente para que ele consuma em lojas de conveniência ou outros negócios para, daí, rentabilizar o posto e não ficar dependendo exclusivamente do combustível, da gasolina ou do que quer que seja — explica Dal'Aqua.
"Cada posto, uma realidade"
O Sulpetro defende a não generalização da realidade dos postos a partir de um ou outro estabelecimento específico, pois cada local possui características próprias, como números distintos de funcionários, o pagamento ou não de aluguel, a presença ou não de serviços e comércio, horário de funcionamento reduzido ou aberto 24 horas. Fatores que podem refletir no preço cobrado do consumidor.
— Hoje, qualquer posto paga R$ 20 mil, R$ 30 mil de aluguel. Aí tu tem 10, 20 funcionários, no mínimo. Tudo isso vai somando. Também está muito caro para o posto o dinheiro porque hoje tu vende só no cartão praticamente ou gestão de frotas, que é aquele de empresas. Isso come, ligeiramente, metade da margem de lucro do negócio — conclui o presidente do Sulpetro.