A cotação do dólar passa por uma desvalorização neste primeiro semestre de 2023 que não se via há sete anos no mercado brasileiro. A moeda americana caiu dos R$ 5,23 com que começou o ano para R$ 4,77 na última quinta-feira (22) — o menor patamar para o câmbio desde maio de 2022.
Entre o dia 1º de janeiro e o dia 19, o dólar Ptax para venda — índice de referência para as operações de câmbio no mercado financeiro calculado pelo Banco Central (BC) — registrava um recuo de 8,38%. Este é o maior declínio para um primeiro semestre desde 2016, quando a cotação caiu 17,8%.
O fortalecimento da moeda brasileira reflete uma melhora brusca no humor com que o mercado iniciou o ano em meio às incertezas macroeconômicas globais e o novo governo no Brasil. No final de 2022, logo após as eleições, pesquisas indicavam que gestores, estrategistas e economistas viam o dólar acima dos R$ 5,40 em 2023; em março, uma enquete dizia que o dólar ultrapassaria os R$ 5,30.
Ainda que 2023 esteja apenas se aproximando da metade, boa parte dessa instabilidade foi atenuada, e o país conseguiu se colocar como destino do capital estrangeiro entre os emergentes.
— Temos reservas cambiais bastante robustas e uma certa estabilidade política e econômica, que muitos países emergentes não têm — destaca Bruno Perottoni, diretor de tesouraria do Braza Bank.
O atual patamar da taxa de juros do país também ajuda a manter o real valorizado. Com a Selic estacionada em 13,75% ao ano e a queda dos indicadores de inflação, o Brasil tem o maior juro real do mundo — o que também atrai investidores estrangeiros, que vêm atrás de boa rentabilidade a um risco relativamente baixo.
— É um movimento que chamamos no mercado de carry trade, onde você pega o dinheiro do seu país e leva para outro onde vai receber um juros maior, no caso, o Brasil — explica Gabriel Moraes, assessor de investimentos do escritório Arcani Investimentos.
Com mais dólares entrando no mercado brasileiro, o real conseguiu se fortalecer e se estabilizar abaixo dos R$ 4,80 nos últimos pregões. Para o segundo semestre, no entanto, pairam algumas dúvidas sobre a continuidade dessas quedas.
A projeção mais recente do Boletim Focus indica um dólar a R$ 5 até o final do ano. Moraes destaca que, embora o Focus reúna um resumo das expectativas do mercado, ainda há divergência entre os agentes. Nem todos, diz ele, acreditam que a tendência para o segundo semestre é de valorização do dólar.
De olhos nos juros
— Para o dólar voltar para R$ 5, duas coisas precisam acontecer: os juros dos Estados Unidos ficarem altos por mais tempo, o que atrai o dinheiro para lá; e os juros do Brasil caírem muito rápido — explica.
— Se o BC baixar os juros em uma velocidade muito rápida, isso pode fazer o dólar se apreciar de novo. Talvez isso explique a tese do dólar aos R$ 5.
Mas esse não parece ser o cenário base até o momento. Na reunião do último dia 21, o BC surpreendeu o mercado ao manter o tom ainda duro contra o combate à inflação, sem sinalizar o início do ciclo de cortes na Selic para agosto, como esperavam analistas.
— Se houver um corte de juros exagerado e sem fundamentos para isso podemos ter uma desvalorização do real. Mas é algo que eu não acredito que o Banco Central vá fazer — diz Bruno Perottoni.
Mantidas as outras condições, o especialista vê espaço para uma cotação mais baixa do que os R$ 5 ao final do segundo semestre.
A cotação do dólar é uma das variáveis mais difíceis de se prever no mercado, por isso especialistas não conseguem cravar o futuro da trajetória da moeda. Ainda assim, para aqueles investidores interessados em dolarizar o portfólio ou turistas com viagens agendadas que precisam comprar a moeda, a desvalorização atual pode indicar uma boa janela de oportunidade.
— Estamos falando da menor cotação em mais de um ano. Considerando o contexto atual, o risco de uma correção é maior do que a oportunidade de uma queda mais acentuada — diz Diego Costa, chefe de câmbio para o Norte e Nordeste da B&T Câmbio.
A recomendação, no entanto, é sempre fazer múltiplos aportes — ou seja, ir comprando aos poucos.
— Nós sempre indicamos que os clientes façam suas compras em partes — diz Haryne Campos, especialista em câmbio na WIT Exchange. — Analisando graficamente, o dólar ainda tem margem para continuar em queda; mas também temos fatores que podem influenciar a alta.