Aprovada com adesão maior do que a esperada — foram 372 votos a favor e 108 contrários —, a nova regra fiscal abre espaço para um controle maior dos gastos no país. A avaliação é de fontes ouvidas pela reportagem de GZH. Especialistas nas áreas econômica, tributária e de mercado enxergam na nova âncora fiscal do país uma possibilidade de equilíbrio entre o manejo das contas públicas e do aumento dos investimentos.
O professor do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFRGS Pedro Dutra Fonseca afirma que o novo marco fiscal atinge um meio termo entre rigidez e flexibilidade. Na avaliação do especialista, a âncora fiscal anterior, o teto de gastos, era muito inflexível, o que criava ambiente para descumprimento, como ocorreu em algumas ocasiões. Nesse sentido, Fonseca estima que o modelo proposto para os próximos anos tem maior chance de controlar os gastos e criar ambiente fiscal mais seguro no país:
— Se você faz uma regra extremamente rígida, como era a anterior, isso não vai ser cumprido. O novo marco, apesar de ter rigidez, pode ser cumprido, com exceção do ano de 2024, porque está muito em cima para ter uma reversão de cenário.
Além disso, Fonseca afirma que o arcabouço fiscal aprovado até o momento dificulta a ocorrência de uma explosão da relação entre a dívida e o PIB, que era um dos maiores temores do mercado e de demais agentes econômicos:
— Mesmo que a taxa de crescimento da economia seja muito grande, vai ter esse limite.
O professor deixa claro que a reforma tributária e o avanço do PIB e da inflação são componentes importantes para uma avaliação mais detalhada sobre a efetividade do modelo nos próximos anos.
Tiago Sbardelotto, economista da XP, também avalia que a flexibilidade do novo marco fiscal permite que a regra seja mantida por um tempo maior, porque o governo tem mais espaço para ajustes e reformas. No entanto, Sbardelotto afirma que o governo fica muito dependente de arrecadação para fechar as contas, o que pode prejudicar a economia:
— O ponto positivo é que tem esse limite, de 0,6% a 2,5%, que se aplica a quase todas as despesas que a gente tem no orçamento. O relator teve essa proposta de incluir mais despesas. No lado negativo, esse valor de 2,5% não estabiliza a dívida no longo prazo e vamos depender muito da receita para fechar a conta nos próximos anos.
O economista da XP cita que o mercado reagiu bem à aprovação em termos de arranjo político, levando em conta a contagem de votos em si, que mostrou maioria significativa. Isso reduz a incerteza e mostra força política, segundo Sbardelotto.
Professor convidado da FGV Direito Rio, o tributarista e mestre em Economia Gabriel Quintanilha afirma que a aprovação do marco fiscal é importante para promover o equilíbrio da economia do país, com queda do juro e crescimento da atividade. No entendimento de Quintanilha, o novo regramento conversa com a realidade do país, permitindo um aumento de gastos controlado. Isso porque a economia do Brasil depende historicamente do investimento público para o desenvolvimento. No entanto, o especialista também alerta para o perigo de um gerenciamento fiscal baseado na arrecadação:
— Esse novo arcabouço traz uma certa segurança, porque limita a realização de despesas à efetivação do aumento da arrecadação. Mas preocupa porque o poder público pode, para aumentar o espaço de despesas, buscar crescimento de arrecadação, o que pode prejudicar a economia brasileira, porque nossa carga tributária já é elevada.
A Febraban cumprimentou a Câmara dos Deputados pela “aprovação célere do projeto”. "Considerando o cenário desafiador para o equilíbrio orçamentário, o país contar com novo marco fiscal é um passo fundamental para a economia brasileira”, destacou, em nota, a entidade, que representa o setor bancário.
A reportagem de GZH procurou a Confederação Nacional da Indústria (CNI) para repercutir o efeito do arcabouço fiscal no setor produtivo. A entidade informou que "avalia os detalhes do que está sendo votado, para poder se posicionar".
Efeito na desoneração
Os especialistas ouvidos pela reportagem de GZH afirmam que o arcabouço não deve ter efeito imediato sobre a desoneração da folha de pagamento, que beneficia 17 setores que mais geram emprego no país. No entanto, em caso de indefinição da renovação dessa concessão no Congresso ou de inclusão na reforma tributária, esse cenário pode mudar nos próximos anos.
Como adiantou a colunista Giane Guerra, alguns segmentos temem que ponto do texto do marco fiscal que veda a concessão ou ampliação de incentivos ou benefícios tributários em eventual situação fiscal negativa acabe com a desoneração.