Nova regra para controlar as contas públicas do governo, o arcabouço fiscal foi aprovado com ampla folga na noite de terça-feira (23), mas um fato chamou atenção: a proposta teve mais votos favoráveis dos parlamentares do Partido Liberal, sigla do ex-presidente Jair Bolsonaro, do que da federação PSOL/Rede, que faz parte da base de Luiz Inácio Lula da Silva e tem dois ministros na Esplanada: Marina Silva, do Meio Ambiente, e Sonia Guajajara, dos Povos Originários.
A federação PSOL/Rede orientou seus integrantes a votar contra a proposta. Todos os deputados do PSOL e Túlio Gadêlha, único membro da Rede, rejeitaram o texto. Do outro lado do espectro político, o PL liberou a votação de seus 99 parlamentares e o placar garantiu 31 votos da sigla a favor do texto — cerca de 32% da bancada.
Tanto a Rede quanto o PSOL têm ministérios no governo: respectivamente Marina Silva (Meio Ambiente e Mudança Climática) e Sonia Guajajara (Povos Originários).
Para o PSOL, a nova regra fiscal pode prejudicar os investimentos na áreas de saúde e educação.
— O Brasil precisa de investimento em áreas sociais, rejeitando a lógica neoliberal. Não aceitamos punir saúde, educação e o serviço público em nome de um ajuste fiscal — disse Sâmia Bomfim (PSOL-SP).
A sigla também havia votado contra o pedido de urgência na tramitação da proposta no dia 17.
O resultado final do texto-base na Câmara dos Deputados foi de 372 votos favoráveis, 108 contrários e uma abstenção. Por ser um projeto de lei complementar, o arcabouço precisava de 257 votos favoráveis (maioria absoluta) para ser aprovado.
Aliados de Lula no Congresso trabalham para usar a votação da nova regra fiscal como uma amostra de que o governo é capaz de aprovar a reforma tributária ainda neste ano — que precisa de pelo menos 308 votos favoráveis em dois turnos de votação. A ideia é reverter a imagem de base fraca deixada pela derrota na Câmara com os decretos do saneamento. Mesmo assim, o próprio PT, apesar de votar a favor, rachou.
Divergência dentro do PT
Dos 68 deputados petistas — que compõem uma federação com PC do B e PV, somando 81 parlamentares —, praticamente um terço da bancada do PT alegou ter votado a favor apenas por "lealdade ao presidente Lula". Os divergentes apresentaram, ainda na noite desta terça, uma declaração separada de voto para reiterar suas críticas ao arcabouço fiscal.
No documento, assinado por 22 petistas e por Orlando Silva (PC do B-SP), o relator do PL das Fake News, os parlamentares dizem que o relatório do deputado Claudio Cajado (PP-BA) "agravou sobremaneira as normas de contração dos gastos públicos, limitando fortemente a capacidade do Estado de fazer justiça social e comandar um novo ciclo de desenvolvimento".
O texto foi a forma encontrada por petistas relevantes na estrutura da sigla, como o presidente da Comissão de Constituição e Justiça, Rui Falcão (SP), para explicitar suas restrições ao projeto depois que o presidente Lula enquadrou seu partido e avisou que não admitiria dissidências na votação.