Até o fim de março, o governo do Estado vai implementar o autolicenciamento ambiental como mecanismo de liberação de novos empreendimentos de até 49 atividades produtivas. A atualização do sistema online do governo do Estado é a etapa que falta ser concluída para abrir, no Rio Grande do Sul, essa modalidade de licenciamento ambiental, que é duramente criticada por entidades de defesa do meio ambiente e almejada por setores produtivos.
No sistema tradicional, a emissão da licença depende de análise e aprovação de técnicos do órgão ambiental. No modelo de autolicenciamento, o empreendedor envia os documentos exigidos pelo sistema online, se compromete a respeitar as regras e a permissão é automaticamente emitida pela internet. Sem as etapas de análise prévia, o novo formato promete acelerar a emissão de licenças.
O autolicenciamento ambiental - tecnicamente chamado de licença ambiental por compromisso (LAC) - já existe no Rio Grande do Sul em lei desde o início de 2020. Para ser aplicado, contudo, dependia de uma regulamentação do Conselho Estadual de Meio Ambiente (Consema), o que ocorreu em novembro de 2021, quando o colegiado aceitou a proposta do governo Eduardo Leite e autorizou que 49 atividades de baixo a alto potencial poluidor possam ser liberadas por autolicenciamento.
— A primeira frente agora é de operacionalização do sistema. Essa forma de licenciamento tem etapas importante e o sistema precisa de adequação. É o que estamos fazendo, ajustando o sistema. Vamos disponibilizar (a licença ambiental por compromisso) de forma gradual. Nossa previsão: no máximo até março que estejamos disponibilizando a maior parte dessas licenças ambientais por compromisso, pelo sistema online. E, ainda no primeiro semestre, todas as 49 atividades — projeta Marjorie Kauffmann, presidente da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), órgão responsável pelo licenciamento e fiscalização.
A preparação do sistema para emitir as novas licenças vai considerar não apenas as atividades econômicas que serão alvo de autolicenciamento, mas também características do empreendimento. É o caso dos projetos de negócio que, mesmo enquadrados em algumas das atividades de autolicenciamento, prevejam a retirada de vegetais ou estejam inseridos em uma área de proteção permanente. Nessas situações, o sistema negará a emissão da licença automática e direcionará o empreendedor para o licenciamento tradicional.
— Não é uma forma de licenciamento para qualquer atividade, e tem prerrogativas. Dessas 49 modalidades, temos situações que vão impedir a solicitação de licença ambiental por compromisso — garante a presidente da Fepam.
Sem realizar uma análise prévia do impacto ao meio ambiente, no autolicenciamento, o governo do Estado parte do pressuposto de que os empresários seguirão todas as regras previstas para preservação do meio ambiente. Com menos técnicos envolvidos na avaliação dos projetos, a promessa é usar mais recursos humanos para a fiscalização, após o empreendimento já estar em operação.
O aumento de fiscalização passa, segundo a Fepam, pelo aumento no quadro de profissionais e investimento em tecnologia. A presidente do órgão ambiental diz que o governo do Estado já autorizou a realização de concurso para a contratação de mais 52 analistas, que se somarão aos cerca de 200 que já trabalham no órgão.
— Tivemos a aprovação oficial pelo governo do Estado para a contratação de 52 analistas que vão ser incorporados. Mas a fiscalização não se da só por vistoria às propriedades. Temos uma gama de sistemas que permitem fiscalização e identificação de delitos ambientais, como georreferenciamento e imagens de satélite. É uma utopia pensarmos que podemos estar em toda parte todo o tempo. A licença ambiental por compromisso vem como um voto de confiança, mas todos somos responsáveis pela fiscalização – projeta a presidente da Fepam.
O autolicenciamento ambiental é defendido por setores produtivos como uma forma de reduzir a burocracia e agilizar a liberação de novos empreendimentos. Já entidades de defesa ambiental e o Ministério Público afirmaram, ao longo do debate no Rio Grande do Sul, que esse formato de licença gera riscos de degradação do meio ambiente.
Nas próximas semanas, o Conselho de Administração da Fepam definirá o valor exato que será cobrado dos empreendedores para o autolicenciamento ambiental. O preço, segundo a presidente do órgão, será equivalente aos custos atuais da licença prévia (primeira etapa do sistema tradicional de licenciamento ambiental).
Lei que autoriza autolicenciamento segue em análise pelo STF
A lei que abriu espaço para o novo formato de licenciamento no Rio Grande do Sul está sendo questionada, em sua constitucionalidade, no Supremo Tribunal Federal (STF), desde o final de 2020. Na ação, a Procuradoria-Geral da República (PGR) criticou a previsão do mecanismo para atividades de médio e alto potencial poluidor e, citando a Associação Brasileira de Membros do MP de Meio Ambiente, apontou: “Ao criar a licença ambiental por compromisso, o Rio Grande do Sul converte parte do licenciamento ambiental em um procedimento cartorário, verdadeiro simulacro de avaliação ambiental”.
— Não entendemos a licença ambiental por compromisso como fragilização, banalização ou facilitação. Entendemos como antecipação do controle e fiscalização. Defenderemos essa causa até o fim. Se houver decisão contraria do STF, temos um modelo que nos permite retroagir e voltar ao licenciamento ordinário — defende a presidente da Fepam.
No STF, o tema aguarda decisão do ministro Ricardo Lewandowski. Não há previsão de julgamento, segundo o tribunal.