Terceira estatal gaúcha a ser privatizada neste ano, a Companhia de Gás do Rio Grande do Sul (Sulgás) vai a leilão nesta sexta-feira, na B3, em São Paulo, às 14h. A comercialização tem preço mínimo de R$ 927,8 milhões, e segundo especialistas do setor, deve atrair número importante de concorrentes.
O que o Estado está negociando é a sua participação de 51% na estatal. Os outros 49% pertencem à Gaspetro, associação entre a Petrobras (51%) e a japonesa Mitsui (49%). Em julho, a Petrobras vendeu a sua participação na Gaspetro para a Compass, mas a transação ainda está sujeita à aprovação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
Para Diogo Lisbona, pesquisador do Centro de Regulação e Infraestrutura da Fundação Getulio Vargas (FGV CERI), a composição acionária pode ser um “complicador”.
— É diferente dos outros ativos. Neste, o Estado está vendendo a participação e ele tem um sócio. Não é o Estado privatizando um ativo onde vai chegar um novo dono e tomar conta sozinho. Já tem um casamento de sócios — explica Lisbona.
Ainda assim, a expectativa em torno do certame é grande por causa do desenvolvimento do mercado de gás natural. Segundo Lisbona, o novo marco legal, o contexto de harmonização das regulações estaduais e um reposicionamento da Petrobras na indústria abrem caminho para a entrada de novos agentes.
A solidez e o nicho de mercado ocupado pela companhia são apostas do governo do Estado para o sucesso na comercialização da sua fatia.
A Sulgás é responsável pela comercialização e distribuição de gás natural canalizado no Estado. A empresa atende 42 municípios gaúchos e 68.116 clientes, com uma rede de distribuição que soma 1.355,1 quilômetros, concentrada no eixo Porto Alegre-Caxias do Sul. O corpo de colaboradores é enxuto, com 128 funcionários ao todo. Sua boa condição financeira também é um dos atrativos para os interessados. O valor total da Sulgás foi estipulado em R$ 1,819 bilhão.
— A diferença entre a situação financeira da Sulgás e da CEEE-D é da água para o vinho. É uma diferença abissal em termos de solidez financeira e condições gerais da empresa. O múltiplo que se conseguiu no preço de largada e que mesmo assim está puxando grupos interessados para participar do leilão é em parte também da boa condição que a Sulgás se encontra hoje — diz o especialista no setor de energia e sócio da Bateleur, André Trein.
Concorrentes
Pelo menos quatro grupos teriam demonstrado interesse no processo de privatização da Sulgás. Dois deles, grandes, de capital aberto, estariam entre os mais cotados: Cosan e Ultra. O grupo Cosan é dono da Compass Gás e Energia, uma holding que tem atuação na região metropolitana de São Paulo através da Comgás, a maior distribuidora de gás do país. Enquanto a Sulgás distribui cerca de 2 milhões de metros cúbicos por dia, a Comgás distribui algo próximo de 14 milhões, segundo Trein.
— A Compass adquiriu recentemente a participação da Petrobras na Gaspetro, que é o outro acionista da Sulgás. Já foi uma forma de adquirir participação em várias das distribuidoras de gás do Brasil. Um movimento agora de comprar o controle da Sulgás faria muito sentido porque eles já têm indiretamente uma participação na Sulgás através da Gaspetro — avalia o consultor.
Já o grupo Ultra é dono da Ipiranga e também da Ultragás, onde já tem uma atuação no mercado de GLP (gás liquefeito de petróleo, comumente conhecido pelo gás de cozinha), que é um mercado correlato. Para o pesquisador da FGV Diogo Lisbona, o interesse no mercado de gás natural através da Sulgás possibilitaria uma integração horizontal do grupo.
Expansão
A expectativa é de que o novo acionista possa ampliar os investimentos no Estado e imprimir ritmo mais forte na expansão da malha de gasodutos. Segundo o secretário-chefe da Casa Civil do Rio Grande do Sul, Artur Lemos, por restrições logísticas, a companhia comercializa há mais de 20 anos o mesmo teto de 2 milhões de metros cúbicos de gás por dia. O apetite do setor privado fará com que se amplie o alcance do insumo.
— Com a expansão da rede logística e tendo mais gás para fornecimento, com certeza demandará mais mão de obra. Claro que isso dentro de uma construção que vai ser objeto de planejamento do setor — projeta Lemos.
— Se for olhar a atuação da Sulgás hoje, eles estão muito concentrados na Região Metropolitana e na região da Serra. São basicamente dois clusters de um Estado que é bem maior que essas duas regiões. Há outras áreas que poderiam receber alguma canalização de gás, então existe um potencial bastante grande de crescimento da empresa — avalia André Trein, da Bateleur.
O engenheiro e consultor na área da energia Ronaldo Lague, porém, menciona que para ampliar a operação é preciso ter mais oferta de gás. Por isso, o crescimento de mercado depende de uma nova fonte de suprimento, que pode ser GNL (gás natural liquefeito). Ele cita a perspectiva de um terminal GNL em Rio Grande, no Sul do Estado, para injeção do insumo no setor industrial.
— Os grandes consumidores comerciais e industriais são os que viabilizam economicamente os investimentos para atender aqueles pequenos consumidores, que na realidade, pela quantidade depois se justificam. Mas na fase inicial, para atender um novo município com gás, por exemplo, só por residencial, tem que ser feito muito cálculo para ver se justifica — diz Lague.
— O contexto de capital privado pode favorecer, mas ele por si só não é uma geração espontânea, vai ter que ter competitividade do energético e atração de clientes. É um desafio do gás em todo o contexto nacional — acrescenta o pesquisador da FGV, Diogo Lisbona.
A Sulgás em números
- Municípios atendidos: 42
- Clientes (setembro 2021): 68.116
- Rede de distribuição (setembro 2021): 1.355,1 km
- Funcionários ativos: 128
- Acionistas: Estado (51%) e Petrobras Gás S/A (49%)
- Lucro líquido (2020): R$ 79,4 milhões
- Investimentos (2020): R$ 41,5 milhões