O agravamento da pandemia de coronavírus no Rio Grande do Sul nas últimas semanas e as mudanças nas medidas restritivas adotadas por Estado e prefeituras vêm afetando o planejamento das empresas gaúchas. Em meio ao cenário de incertezas, líderes de diferentes setores reconhecem que está mais difícil tomar decisões no dia a dia e, em alguns casos, até mesmo sustentar planos de expansão nos próximos meses.
Com a inclusão de 11 regiões na bandeira preta dentro do sistema de distanciamento controlado do governo estadual, o comércio não essencial teria de fechar as portas e bares e restaurantes só poderiam atender nas modalidades de pague e leve ou telentrega. No entanto, o sistema de cogestão com as prefeituras foi mantido e a maioria dos municípios segue sob as regras da bandeira vermelha, que permitem as atividades mesmo com a redução do quadro de funcionários e da capacidade de atendimento de clientes.
Ao mesmo tempo, o governo estadual optou por restringir o horário de abertura de estabelecimentos, que agora devem permanecer fechados das 20h às 5h. A partir desta definição, a presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes no Estado (Abrasel-RS), Maria Fernanda Tartoni, diz que alguns locais que costumavam atender apenas à noite e não trabalham com aplicativos ou entregas acabaram optando por fechar por uma semana.
A dirigente ainda constata que, com pouca margem para atuar à noite, bares e restaurantes passam a ter mais dificuldades para escalonar os turnos de trabalho dos funcionários. Até então, era comum que uma parte da equipe atendesse no almoço e outra na janta. Podendo usar apenas 50% do quadro de funcionários, Fernanda lembra que não há mais como reduzir jornada ou suspender contratos.
— Claro que pior seria se estivéssemos fechados, mas voltamos a viver um momento de instabilidade. Fica muito conturbado para tomar decisões. Como tu vais pensar em expandir o negócio, se amanhã tu não sabes se vai estar aberto ou não — aponta, lembrando que o setor foi um dos mais afetados no início da pandemia com fechamento para atendimento presencial por meses a fio.
Comerciantes adiam Liquida Porto Alegre
Com o aumento das internações levando o sistema de saúde da Capital à beira do colapso, a Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre (CDL-POA) optou por adiar o Liquida Porto Alegre. A temporada de promoções envolve 4 mil empresas e começaria na sexta-feira (26). Agora, foi transferida para o final de julho.
“Lojistas foram ouvidos e o calendário do varejo avaliado, na expectativa de um ambiente de maior controle da pandemia e mais propício para os negócios. Por isso, optou-se pelo adiamento do Liquida Porto Alegre, que será realizado no final de julho deste ano”, apontou a entidade em nota.
O presidente do Sindilojas Porto Alegre, Paulo Kruse, reconhece que o cenário de dúvidas sobre a evolução da pandemia e eventuais novas restrições acaba atrapalhando principalmente os planos dos pequenos negócios. Mesmo assim, o dirigente celebra a manutenção da cogestão com as prefeituras, o que permitiu que os estabelecimentos não essenciais se mantivessem abertos na Capital, ainda que tenham de fechar mais cedo. A avaliação é de que os impactos para as empresas seriam maiores em caso de fechamento total das lojas.
— As vendas tendem a cair com a redução do horário de abertura. As empresas vinham se preparando para o inverno. Por enquanto, não há risco de fechamento e defendemos que o empresário procure manter o seu planejamento — avalia.
Kruse vê a situação atual da pandemia como "preocupante", mas espera que, com o avanço da vacinação, a instabilidade se dissipe e o volume de vendas se recupere. Para adequar o quadro de funcionários às regras da bandeira vigente, as lojas da Capital acabam recorrendo à suspensão da jornada dos trabalhadores, que está prevista em convenção coletiva da categoria.
Até mesmo em setores essenciais, que não chegaram a fechar em nenhum momento durante a pandemia, as novas normas têm exigido adaptações. Com menos tempo para atendimento, o presidente da Associação Gaúcha de Supermercados (Agas), Antônio Cesa Longo, salienta que a tendência é que as empresas comecem a utilizar o banco de horas acumulado pelos funcionários nos últimos meses.
— Vamos seguir todas as orientações dos governantes. Entendemos que é por um período curto, em que as empresas podem acabar fazendo algum ajuste nos bancos de horas para se adaptar às novas regras — aponta Longo.
"Vai ser necessário algum tipo de auxílio"
A disparada no número de casos de coronavírus e de internações pela doença vem em um momento no qual muitas empresas seguem em busca de recuperação. A nova onda da doença coincide com o término dos auxílios implementados pelo governo federal em 2020, como a possibilidade de redução ou suspensão da jornada de trabalho, e o Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe), que disponibilizou crédito de baixo juro com até oito meses de carência.
Em entrevista ao programa Gaúcha Atualidade, da Rádio Gaúcha, na terça-feira (23), o coordenador do conselho de assuntos tributários, legais e cíveis da Federação das Indústrias do Estado (Fiergs), Thômaz Nunnenkampe, defendeu a reedição do programa do governo federal que permite a suspensão ou redução da jornada de trabalho para atenuar impactos da nova onda de covid-19 na economia nos próximos meses.
— Vai ser necessário algum tipo de auxílio. Seria algo pontual, para os meses de março, abril, maio e junho — destacou Nunnenkampe.
Também em entrevista à Gaúcha, o presidente da Federação do Comércio de Bens e Serviços do Rio Grande do Sul (Fecomércio-RS), Luiz Carlos Bohn, considerou positiva a manutenção da cogestão e reforçou a importância da abertura das empresas para que elas se recuperem.
— A gente mantém minimamente tudo funcionando, para que a gente volte a funcionar aos poucos e saia dessa situação. Estamos torcendo que este período seja curto e que possamos recuperar as atividades — disse.