Após o período eleitoral, o ministro da Economia Paulo Guedes deve retomar a discussão sobre propostas que já foram vetadas pelo presidente Jair Bolsonaro. A lista de medidas sugerias pela pasta inclui a redução de benefícios, como o abono salarial e a possibilidade de congelamento de benefícios, além da criação de um novo imposto nos moldes da CPMF. As informações são do jornal Folha de S.Paulo.
Durante um evento realizado em Minas Gerais, em 28 de agosto, Bolsonaro classificou a redução de medidas como "tirar de pobres para dar a paupérrimos".
O ministro defende que existem soluções técnicas simples para abrir espaço no orçamento e ampliar o programa Bolsa Família. Segundo ele, falta apenas uma decisão política para adotar as medidas, que já foram consideradas excessivamente amargas pela ala política do governo.
De acordo o jornal, Guedes afirmou a interlocutores que a base da ampliação do programa social deve ser formada pela consolidação de 27 benefícios já existentes e que não deve "furar" o teto de gastos. Sem isso, o ministro afirma que o novo programa não será criado.
A equipe econômica decidiu manter planos de mudar o abono —espécie de 14º salário pago a pessoas com renda de até dois salários mínimos. Recentemente, o ministro disse que o benefício poderia ser incorporado ao novo programa, o que renderia até R$ 20 bilhões. Uma proposta alternativa limitaria o pagamento a quem recebe até 1,4 salário mínimo —com resultado de R$ 8 bilhões nas contas.
As sugestões de mudança, entretanto, já provocaram choques públicos entre o presidente e a equipe econômica. Ao ser informado sobre a ideia, em agosto, Bolsonaro fez críticas ao time de Guedes e mandou suspender pela primeira vez a formulação do novo programa social, que até então se chamava Renda Brasil.
Para turbinar o programa, o ministro estuda outras medidas que ampliariam a arrecadação do governo. Uma das ideias é extinguir o desconto de 20% concedido a contribuintes que optam pela declaração simplificada do Imposto de Renda. Nesse caso, ainda seria necessário fazer cortes em outras áreas para abrir espaço no teto de gastos —regra que limita o crescimento das despesas públicas à variação da inflação.
Guedes pretende manter a posição de aprovar a proposta de desvincular, desindexar e desobrigar o orçamento —ideia que também recebeu um veto explícito de Bolsonaro. Essa mudança permitiria, na prática, que o salário mínimo não seja mais corrigido pela inflação e que benefícios previdenciários sejam congelados. Atualmente, o reajuste desses valores é automático, determinado pela Constituição.
Em estudo pela equipe econômica, essa possibilidade abriu uma crise entre o time de Guedes e Bolsonaro. Em setembro, o presidente barrou a proposta e chegou a proibir discussões sobre o Renda Brasil:
— Por parte de governo, jamais vamos congelar salários de aposentados, bem como jamais vamos fazer com que os auxílios para idosos e para pobres com deficiência sejam reduzidos para qualquer coisa que seja.
Membros do governo ponderam que não há briga entre Bolsonaro e Guedes. Segundo relatos, Bolsonaro está alinhado a Guedes e afirma que só haverá novo programa social dentro dos limites da regra fiscal.
Contra opositores da proposta, Guedes tem argumentado que o sistema econômico exige a manutenção do rigor fiscal, independentemente das razões daqueles que pressionam por novos gastos.
O ministro afirma que, uma eventual quebra do teto de gastos levaria a uma perda de confiança dos mercados no país, com efeito negativo imediato sobre as taxas de juros, a inflação e a capacidade do governo de gerir a dívida pública.
O novo programa chegou a ser anunciado e rebatizado de Renda Cidadã, mas a proposta gerou forte reação negativa. A ideia era bancar a assistência com a limitação do pagamento de precatórios —dívidas do governo reconhecidas pela Justiça. Guedes reconheceu que a ideia de limitar esse gasto partiu de sua equipe, mas disse que a iniciativa não tinha relação com o Renda Cidadã.
Segundo o jornal, na área do emprego, o ministro da Economia vai insistir na substituição de encargos trabalhistas por um imposto sobre transações nos moldes da CPMF —tributo visto com ressalvas pelo presidente e criticado por congressistas. Sem ele, Guedes afirma que a redução da tributação sobre as empresas não será feita. A discussão sobre o novo imposto chegou a ser proibida por Bolsonaro e levou à demissão do então secretário da Receita Federal Marcos Cintra, em setembro do ano passado.
Guedes conseguiu convencer o presidente a testar a medida, mas a resistência de parlamentares ainda representa um entrave à proposta. Por falta de acordo, a ideia não foi apresentada formalmente. Em reunião interna, o ministro afirmou que foi "encurralado" pelo novo tributo. Ele reconheceu que o imposto não é positivo e traz cumulatividade, mas argumentou que os encargos sobre a folha salarial existentes hoje são ainda mais pesados.
No caso da nova CPMF, a equipe econômica mantém nos planos um mecanismo que é considerado politicamente delicado dentro do governo. Os responsáveis pela criação do tributo dizem que ele deve incidir inclusive sobre operações feitas por igrejas.
O então secretário Cintra disse, em abril de 2019, que até os dízimos recolhidos nos templos seriam taxados. A declaração foi duramente criticada por Bolsonaro que disse "nenhum novo imposto será criado, em especial contra as igrejas". Guedes, segundo auxiliares, ainda considera que o novo tributo deve incidir também sobre as movimentações de grupos religiosos.