A decisão do Magazine Luiza de colocar apenas negros em seu próximo programa de trainees, embora tenha surpreendido muitos, é apontada por defensores da igualdade racial como natural em um contexto em que se debate formas de ampliar a presença de pretos e pardos nos cargos de chefia de grandes empresas. A varejista justificou a iniciativa dizendo que, embora 53% de seus funcionários sejam negros, apenas 16% dos líderes são pretos e pardos.
Ainda que desparelho, o quadro da Magalu é mais diverso do que a média brasileira. Conforme o Instituto Ethos, apenas 5,8% dos quadros executivos brasileiros são preenchidos por negros.
— O movimento da empresa é importante porque traz à luz a discussão sobre a baixa presença de negros nas empresas. Mesmo que o movimento possa ter um cunho também de marketing, para posicioná-la como inclusiva, ele tem o mérito de reforçar a importância das ações afirmativas — avalia o economista e advogado João Carlos Almeida dos Santos, presidente da Frente Negra Gaúcha (FGN).
Santos entende que a iniciativa é resultado de dois debates em alta na sociedade: uma pressão dos movimentos negros para mais acesso a oportunidades de emprego e educação e a conscientização, também entre os brancos, da desigualdade do tratamento racial no Brasil.
— Isso mostra que os brancos precisam participar e estão participando do debate — diz o especialista.
O assunto abriu uma disputa nas redes sociais no último sábado (19) entre os que elogiam a medida e aqueles que acusam a Magalu de "racismo reverso" com brancos, usando a hashtag #MagazineLuizaRacista.
Dentre os críticos, estão o vice-líder do governo na Câmara, Carlos Jordy. O deputado federal (PSL-RJ) afirmou que entraria com representação no Ministério Público contra a empresa para que seja apurado crime de racismo.
— A razão do espanto com este tipo de seleção é o puro desconhecimento. Muitas empresas, inclusive do setor bancário, têm feito movimentos para abrir mais espaço para a contratação de pessoas negras, inclusive com apoio do Ministério Público. E isso está totalmente dentro da normalidade de uma sociedade que busca superar a desigualdade racial histórica — avalia o presidente da Comissão de Igualdade Racial do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), Humberto Adami.
A empresa Magazine Luiza se manifestou respondendo às declarações do deputado: "Estamos absolutamente tranquilos quanto a legalidade do nosso Programa de Trainees 2021. Inclusive, ações afirmativas e de inclusão no mercado profissional, de pessoas discriminadas há gerações, fazem parte de uma nota técnica de 2018 do Ministério Público do Trabalho", respondeu a empresa em postagem no Twitter.
O programa seletivo
As inscrições para o programa de trainee do Magalu tiveram início na sexta-feira passada (18) e podem participar profissionais formados entre dezembro de 2017 e dezembro 2020, em qualquer curso superior. O conhecimento em língua inglesa e experiência profissional anterior não fazem parte dos pré-requisitos para a seleção - o que também favorece pessoas que não tiveram condições de buscar qualificação extra e que tiveram dificuldades em iniciar a vida profissional.