Apesar de a inflação ter fechado 2019 ligeiramente acima do previsto pelo governo e por grande parte dos analistas do setor privado, a expectativa é que o índice de preços ao consumidor recue ao longo de 2020 e permita ao Banco Central (BC) manter a taxa básica de juro em níveis historicamente baixos.
Influenciado pela alta no preço da carne, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de dezembro ficou em 1,15%, o maior resultado para o mês desde 2002, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgados nesta sexta-feira (10).
Para janeiro, as projeções estão abaixo de 0,5%. Nos últimos 20 anos, o IPCA do primeiro mês do ano foi de 0,7%, em média. No acumulado do ano passado, o índice ficou em 4,31%, ligeiramente acima dos 4,25% fixados como meta pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), mas dentro do limite de variação de 1,5 ponto percentual. Para 2020, a meta é de 4%, com o mesmo intervalo de tolerância, e as estimativas continuam abaixo desse patamar. As projeções de pesquisa Focus realizada até a semana passada apontavam inflação de 0,39% em janeiro e 3,6% neste ano.
A economista do Itaú-Unibanco Julia Passabom diz que a tendência é que a carne bovina sofra deflação no primeiro trimestre de 2020, pois o preço do boi tem recuado no atacado em relação ao pico atingido no ano passado.
— Vamos observar uma desaceleração maior nesse componente, com alívio no começo do ano. O preço deve ficar alto um tempo, mas espero que devolva o choque — afirma Passabom.
A instituição projeta inflação de 3,5% neste ano.
— Esperamos para janeiro uma inflação de 0,26%, desaceleração bem relevante em relação ao registrado em dezembro, e em meio a esse 0,26% projetamos a deflação da carne bovina, que deve ir ao terreno negativo rapidamente — afirma a economista.
George Sales, professor de Finanças do Ibmec-SP, também afirma que a inflação deve cair neste início de ano e terminar 2020 abaixo de 4%. Ele diz que a liberação do saque adicional do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) pode ter contribuído para um aumento da demanda no último mês do ano e para uma inflação mais alta, mas avalia que esse efeito não deve se manter ao longo do ano.
Para Sales, apesar da expectativa de queda do índice de preços, o Banco Central deverá parar de cortar o juro neste ano.
— Não acho que tenha espaço para novos cortes. Até porque o cenário internacional não está resolvido, com a questão entre Estados Unidos e Irã. Há que se ter cautela neste momento — avaliou.
Em relação à carne, afirmou que o preço tende a se estabilizar neste ano.
O professor de Macroeconomia da Faculdade Fipecafi Silvio Paixão afirma que a elevação da inflação em novembro e dezembro não está relacionada ao aumento da demanda interna e que, por isso, não há necessidade de o Banco Central subir o juro para conter a alta de preços:
— Mesmo que haja impacto na inflação decorrente dessa maior demanda externa (por carnes), não entendo que a política monetária venha a ser alterada. Não vejo o que aconteceu em novembro e dezembro como uma tendência.
Paixão afirma que o preço da carne se estabilizou em um patamar mais elevado: não deve cair em 2020, mas também não continuará a subir indefinidamente.
Antônio Corrêa de Lacerda, professor da PUC-SP e presidente do Conselho Federal de Economia, diz que os resultados recentes não alteraram substancialmente o cenário para a inflação e permitem novos cortes de juro.
— O Copom não deveria mudar a trajetória de queda da taxa de juros em função de uma pressão localizada. Se não houver nenhum grande efeito provocado por conflitos no Oriente Médio ou que altere essa trajetória de desaquecimento da economia mundial, a infração não deve fugir muito ao centro da meta em 2020 — afirma o economista.
Em relatório divulgado nesta sexta-feira, o Bradesco manteve as projeções de inflação em 3,6% e de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em 2,5% neste ano. A instituição também projeta corte adicional de juros, de 4,50% para 4,25%, embora diga que o BC pode adotar uma postura mais cautelosa.