Na lista das estatais que serão privatizadas, estão duas empresas federais no Rio Grande do Sul: a Trensurb e a Ceitec, que acumularam prejuízo de R$ 111,5 milhões em 2018. De setores distintos (a primeira opera o serviço de trens, enquanto a segunda produz chips), as companhias têm um ponto em comum: empilham saldos negativos e nunca conseguiram dar conta de todos os seus custos com receitas próprias.
O governo federal, além de defender a bandeira de reduzir o tamanho do Estado, tem sustentado o anseio pelas privatizações justamente na fragilidade de caixa das empresas. Por serem deficitárias, ambas ofereceriam poucos atrativos e exigiriam um plano de negócios que vencesse o rombo, ampliasse o mercado e gerasse sustentabilidade, avaliam especialistas.
Em 2018, a Trensurb teve prejuízo de R$ 103,9 milhões. Mesmo com o rombo, foi um resultado 20,2% menos pior do que no ano anterior (R$ 130,1 milhões negativos). Porém, registrou aumento no socorro financeiro do Tesouro Nacional, que, para manter os trens nos trilhos, precisou depositar R$ 286,4 milhões na conta da empresa.
Para Luiz Afonso Senna, professor de transportes da UFRGS, o fato de o governo parar de dar subsídio já representa uma vantagem. Afinal, hoje, quem está "bancando" a Trensurb é o contribuinte.
— Precisamos de uma empresa eficiente que ofereça uma tarifa a um preço justo, ou seja, que remunere adequadamente os serviços prestados e cobre um valor que caiba no bolso dos seus clientes. Isso é mais importante do que quem é o dono — diz Senna.
O presidente do Sindimetrô-RS, Luiz Henrique Chagas, coloca a responsabilidade do rombo da Trensurb na má administração e na influência política dentro da empresa. O representante dos metroviários lamenta a possibilidade de que os 1,1 mil funcionários da estatal percam os seus trabalhos, tornando mais aguda a crise do desemprego que assola o país.
— O governo irá transferir o patrimônio público para as mãos de um empresário, e o resultado será o aumento da tarifa e a queda na qualidade do serviço — afirma Chagas.
Criada na década de 1980, a Trensurb é a mais antiga das duas estatais. Hoje, transporta 51,8 milhões de passageiros por ano, de Porto Alegre a Novo Hamburgo, em uma única linha. Embarcar mais gente será um dos desafios de quem ficar responsável pela empresa. Desde 2014, quando chegou ao seu pico de usuários, de 58,8 milhões, o número vem caindo ano a ano.
Fábrica de chips
Já a Ceitec, que consumiu R$ 1,08 bilhão de recursos públicos desde que foi federalizada, há uma década, nunca deslanchou. Instalada no bairro Agronomia, na zona leste de Porto Alegre, a empresa teve prejuízo de R$ 7,6 milhões em 2018. Mesmo o resultado negativo representou uma recuperação na comparação com o ano anterior, quando o rombo foi ainda mais fundo, de R$ 23,9 milhões.
Criada para fomentar a produção de circuitos integrados no país, a estatal produz o chip do boi, seu mais conhecido produto. O item, usado para a rastreabilidade bovina no campo, ganhou escala comercial em 2011, mas nunca alcançou a capilaridade que se esperava.
Um dos entraves na decolada da Ceitec foram as demandas criadas pelo próprio governo federal, em gestões passadas, que nunca se concretizaram. Em setembro de 2012, por exemplo, a estatal assinou com a Casa da Moeda do Brasil um convênio para desenvolver o novo chip do passaporte brasileiro. O primeiro módulo foi finalizado quase seis anos depois e, ainda hoje, o seu uso está pendente no Ministério da Justiça.
Por causa do risco de que a estatal fosse eliminada, lideranças da área de microeletrônica passaram a defender a proposta de privatizá-la. O atual presidente da Ceitec, Paulo de Tarso Mendes Luna, disse que só se manifestaria depois de o plano do governo federal ser anunciado oficialmente.