Mesmo com os 12 cortes que levaram a taxa básica de juro ao menor nível já registrado no país, as linhas de crédito oferecidas a consumidores e empresas seguem em patamar elevado.
Entre o começo do ciclo de reduções, em outubro de 2016, e maio de 2018, a Selic passou de 14% para 6,5% ao ano, queda de 53,5%. Em igual período, as taxas médias para pessoas físicas e jurídicas tiveram baixas de 19,2% e de 22,1%, respectivamente, ritmo um terço menor. O levantamento é da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac).
A Selic serve de referência para as linhas de crédito brasileiras. Ao reduzi-la a partir do segundo semestre de 2016, o Banco Central (BC) buscou tornar empréstimos mais atrativos e, consequentemente, estimular o consumo e os investimentos de indústrias para auxiliar na retomada da economia após a recessão.
A diferença na amplitude dos cortes em relação às linhas de crédito oferecidas aos brasileiros decorre de uma conjunção de fatores, explica o diretor-executivo de estudos e pesquisas econômicas da Anefac, Miguel José Ribeiro de Oliveira. Conforme o analista, a Selic representa apenas 20% do custo dos empréstimos ao consumidor final praticados no país. Os outros quatro aspectos avaliados são risco de inadimplência (32%), margem de lucro das instituições (27%), impostos e compulsório (20%) e despesas administrativas (1%).
— O risco de inadimplência ainda é o fator que mais pesa na oferta de crédito — destaca.
Segundo Oliveira, a concentração no sistema bancário também freia cortes nas taxas de empréstimos em velocidade mais acentuada. O analista lembra que a concorrência entre as instituições perdeu força por conta das recentes aquisições confirmadas no setor.
No primeiro trimestre deste ano, os cinco maiores bancos do país tiveram, juntos, lucro de R$ 19,4 bilhões, com crescimento em relação ao mesmo período de 2017: R$ 6,3 bilhões no Itaú (alta de 3,8%), R$ 4,4 bilhões no Bradesco (9,7%), R$ 3,2 bilhões na Caixa (114,5%), R$ 2,8 bilhões no Santander (12,5%) e R$ 2,7 bilhões no Banco do Brasil (12,5%).
— A economia brasileira é instável. Ao longo do tempo, é comum haver picos de inadimplência. Essa característica do país faz com que as instituições financeiras tenham postura mais defensiva na concessão de crédito — acrescenta o economista Mauro Rochlin, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV).
Em maio, conforme a Anefac, a taxa média para pessoa física caiu para 127,25% ao ano no país. Em outubro de 2016, quando o BC havia iniciado o ciclo de cortes na Selic, estava em 157,47% ao ano. A marca registrada no quinto mês de 2018 é a menor desde julho de 2015 e leva em conta seis modalidades disponíveis a consumidores. A Anefac informa que, em maio, a taxa média de juro para pessoas jurídicas também baixou. Segundo o levantamento, a marca de 59% ao ano é a menor desde março de 2015 — em outubro de 2016, estava em 75,72% ao ano.
— No curto prazo, desde outubro de 2016, os bancos têm feito reduções. A questão é que, antes da recessão, houve alta nas taxas por conta do aumento de riscos. Os bancos ainda não conseguiram baixá-las para o nível de 2013, quando a Selic inclusive estava em patamar mais alto do que hoje — afirma Oliveira.
Mercado deve prosseguir com recuo
O Banco Central (BC) interrompeu em maio o ciclo de 12 cortes seguidos na taxa básica de juro. De lá para cá, o Comitê de Política Monetária (Copom) da instituição teve mais uma reunião, em junho, na qual decidiu manter a Selic 6,5% ao ano.
— A imprevisibilidade aumentou. A greve dos caminhoneiros e a alta do dólar elevaram expectativas para a inflação. Se a taxa de câmbio continuar subindo, não será estranho se o BC elevar a Selic até dezembro — explica o economista Mauro Rochlin, professor da Fundação Getulio Vargas.
Apesar desse cenário, analistas avaliam que a concessão de crédito deve seguir com condições mais favoráveis nos próximos meses. Para analistas, a economia parece ter deixado a pior fase da crise no retrovisor, mesmo que em velocidade lenta.
— A tendência é de que as taxas de juro para pessoas físicas e jurídicas sigam caindo no segundo semestre. Apesar da existência de riscos, a economia brasileira parou de piorar — pondera o diretor-executivo de estudos e pesquisas econômicas da Anefac, Miguel José Ribeiro de Oliveira.