O abalo econômico causado pelo coronavírus atingiu em cheio os planos da advogada Sylvia Urquieta, 51 anos, de retornar ao mercado formal. Desde o início de 2020, ela busca uma vaga de emprego em Porto Alegre. Sem trabalhar com carteira assinada desde 2013 e passar os últimos anos atuando como autônoma, Sylvia via na multiplicação das empresas de tecnologia uma oportunidade para prestar consultoria jurídica em temas como a Lei Geral de Proteção de Dados.
— Iniciei uma consultoria de carreira e vinha me aproximando de startups e negócios digitais, que me atraem e sei que tenho muito a contribuir, mas veio a pandemia e tudo mudou — conta. — Tive que construir imediatamente em um Plano B.
Ciente de que a vaga aspirada poderá demorar mais do que o previso, Sylvia mergulhou em cursos online, se aperfeiçoando em direito digital — já são cinco concluídos desde o início da pandemia —, e passou a gerar em redes sociais conteúdo de interesse a empresas de Tecnologia da Informação (TI).
— Tenho procurado me estabelecer como referência nesta área do direito, e, quando a pandemia passar, acho que isso poderá me favorecer — planeja.
A busca de Sylvia ocorre em um contexto de alta no desemprego e perspectivas pouco promissoras para a economia no Brasil. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) Contínua divulgada nesta quinta-feira (30) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostra que a taxa de desemprego saiu de 11% no último trimestre de 2019 para 12,2% nos primeiros três meses de 2020. A população desocupada chegou a 12,9 milhões, 1,2 milhão a mais ao trimestre anterior.
Conforme o IBGE, a alta é considerada sazonal em razão das demissões de temporários após o período de festas de final de ano, e ainda não reflete um eventual aumento do desemprego por conta da quarentena. No primeiro trimestre de 2019, a taxa de desemprego era ainda maior, de 12,7%.
Com uma queda estimada no Produto Interno Bruto (PIB) de 3,3% neste ano, segundo o Boletim Focus, do Banco Central, a expectativa de profissionais de Recursos Humanos (RH) é que contratações sejam discretas nos próximos meses.
— Já temos visto uma redução grande no número de vagas abertas — afirma Luciana Adegas, diretora de RH da Metta Capital Humano, agência localizada em Porto Alegre.
Normalmente, a Metta abre recrutamento para 70 postos com carteira assinada mensalmente, mas nos últimos 30 dias apenas 18 oportunidades surgiram. Para estágios, a quantidade caiu de uma média de 300 vagas/mês para 45.
— É um período no qual empresas e até profissionais estão mais cautelosas para iniciar processos de recrutamento, em razão de preocupações com a saúde — percebe Luciana.
O marasmo deixado pelo período de isolamento pode ser compensado com um empenho maior por parte de desempregados para se qualificar. A economista Gloria Yacoub, especialista em produtividade e recrutamento, afirma que a quantidade de cursos e programas de capacitação gratuitos abertos nos últimos meses devem ser aproveitados ao máximo por quem busca recolocação.
— São oportunidades que podem ajudar o profissional a se destacar diante de empregadores, cursos oferecidos por organizações como como Fundação Bradesco, FGV, Udemy e LinkedIn — elenca Glória.
Consultora de RH e diretora da Casa de Assessoria, de Porto Alegre, Monica Riffel afirma que, em meio a tantas oportunidades de qualificação, o profissional precisa colocar o foco em treinamentos que acrescentem novas habilidades ao currículo.
— As pessoas tendem a fazer cursos em áreas que já conhecem. Mas é fundamental enxergar onde estão suas carências reais e então buscar treinamento que preencham estas lacunas — sugere.
Embora boa parte da economia esteja patinando, Monica lembra que há setores que mantêm o ritmo de contratações mesmo no atual contexto, como empresas de saúde, agronegócio, tecnologia.
— Certamente haverá novos perfis de vagas após a pandemia, que trabalhem mais com relacionamento, ferramentas digitais e vendas online. São habilidades que o profissional precisa desenvolver independentemente da formação — diz a especialista.
Cinco sites para se qualificar gratuitamente
Fundação Bradesco - A Escola Virtual da entidade oferece trilhas de qualificação em áreas como administração, informática, desenvolvimento profissional e finanças. Há programas específicos para o período da quarentena.
FGV - A Fundação Getulio Vargas oferece cursos gratuitos em áreas como finanças e sustentabilidade. Há amplo conteúdo para profissionais das áreas financeira e administrativa, como gestão empresarial e cálculo de custos.
Senac - O Serviço Nacional do Comércio liberou vídeo-aulas e cursos gratuitamente em sua plataforma durante a quarentena. São lições em áreas como Tecnologia da Informação, Gestão, Turismo, Saúde, entre outras.
Senai - O Serviço Nacional da Indústria disponibiliza diversas capacitações profissionais focadas em profissionais do segmento fabril. São cursos como Eletrônica, Manutenção Industrial, Segurança do Trabalho e Desenho Industrial.
Udemy - O portal tem cursos pagos e gratuitos, e dentro deste grupo há conteúdo para preparar para o uso de ferramentas digitais, melhorar a elaboração de currículos e até cursos de idiomas.