A aprovação do PL dos Agrotóxicos (1.459/2022) pelo Senado, na terça-feira (28), encerrou uma tramitação de mais de duas décadas do projeto no Congresso. Mas não encerrou a polêmica em torno do tema. Enquanto o setor do agronegócio comemora o resultado, destacando a modernização da lei, ambientalistas avaliam que as mudanças trazem risco à saúde humana.
Entidades representativas do agro, como a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e a Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), consideraram o desfecho do trâmite positivo, ao menos no que diz respeito à previsibilidade do registro de novos produtos. A expectativa no setor é de que o PL seja sancionado.
Do outro lado, ambientalistas demonstram preocupação ao que chamam de “PL do veneno”. Segundo o Fórum Gaúcho de Combate ao Uso de Agrotóxicos, a saúde das pessoas e a preservação do meio ambiente ficam em segundo plano com o texto aprovado.
O que muda com a aprovação
Entre as principais mudanças do PL, o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) ficará responsável pela liberação dos registros dos agrotóxicos. Hoje, a pasta concede o registro após avaliação da Anvisa e do Ibama. Com o PL, os órgãos atuarão como apoio para assuntos técnicos.
O texto também traz uma separação entre os produtos. Enquanto o Mapa passa a coordenar a liberação dos “pesticidas”, caberá ao Ministério do Meio Ambiente a coordenação dos registros de “produtos de controle ambiental”.
Na avaliação do setor produtivo, a chancela pelo Mapa não altera o rigor de avaliação dos demais órgãos (Anvisa e Mapa). Domingos Velho Lopes, ex-secretário de Agricultura e coordenador da Comissão de Meio Ambiente da Farsul, diz que a modificação apenas “normatiza a eficiência de uma análise mais célere dos produtos”.
— As moléculas modernas são menos agressivas ao meio ambiente, mais seletivas à saúde humana e mais eficientes para a produção. Alguns registros demoravam até oito anos para serem liberados e nisso se perdia o tempo da eficiência, porque a evolução tem sido muito rápida. Com o novo regramento, concomitante pelos órgãos, acelera-se a análise e traz mais competitividade — diz Lopes.
Este é o principal ponto do PL criticado pelos ambientalistas. Para o presidente da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), Heverton Lacerda, deixar os agroquímicos sob aval do Ministério da Agricultura é “preocupante”.
— É o órgão mais cobiçado pela bancada ruralista e que está mais próximo dos interesses do setor — diz o ambientalista.
Coordenador do Fórum Gaúcho de Combate ao Uso de Agrotóxicos, Noedi Rodrigues da Silva, que é também procurador do MPT, diz que a mudança facilita a liberação de produtos perigosos.
— Dada a complexidade da liberação, achamos que quanto mais órgãos envolvidos, melhor. Acreditamos (que o aval pelo Mapa) é uma facilitação à liberação, pois ficar condicionado (aos demais órgãos) é uma coisa e só consultar é outra — diz Silva.
Prazos
Outra mudança é em relação aos prazos. Segundo o relator da proposta, senador Fabiano Contarato (PT-ES), a atualização da lei se dá diante do desenvolvimento técnico e científico da produção dos químicos desde a edição da última lei.
O texto diz que o processo de registro de novos produtos deverá ser concluído em até 24 meses. Hoje, o trâmite chega a levar quase 10 anos em alguns casos. Agrotóxicos com fórmulas idênticas a outros já aprovados terão prazo reduzido de 60 dias.
Já o prazo máximo para inclusão e alteração de registro para pesquisa, produção, exportação, importação, comercialização e uso irá variar, conforme o caso, de 30 dias a dois anos.
Anuência tácita
A figura da anuência tácita, outro ponto polêmico, foi retirada do projeto. O mecanismo abriria a possibilidade para concessão de registro e comercialização no país de moléculas que não foram avaliadas pelos órgãos brasileiros competentes. Também foi retirada a concessão automática de registro temporário para novos agroquímicos que têm uso permitido por países-membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Para os ambientalistas, a retirada “reduziu muito suavemente” os problemas vistos no projeto.
— A ausência do mecanismo de anuência tácita poderia ter sido um avanço, não fosse o contexto. Incluir isso era absurdo — diz o coordenador do Fórum Gaúcho de Combate ao Uso de Agrotóxicos.
Na visão do setor produtivo, a licença provisória dos produtos seria importante para que as entidades de pesquisa pudessem desenvolver projetos-piloto, segundo Lopes, da Farsul.
Nomenclatura
O documento original do projeto, apresentado em 1999 pelo então senador Blairo Maggi, incluía a alteração da nomenclatura de “agrotóxicos” para "pesticidas". O texto atual aprovado suprimiu essa mudança.