A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) planeja iniciar um processo para rever a lista de ingredientes ativos de agrotóxicos autorizados no país e excluir substâncias já tidas como obsoletas – ou seja, aquelas pouco ou não usadas no mercado.
A previsão é que a diretoria apresente uma proposta nesta terça-feira (9) para exclusão de 34 monografias de agrotóxicos – lista que traz dados como tipo de produto, grau de toxicidade e culturas em que seu uso é permitido.
Na prática, a medida passará a impedir que novos agrotóxicos com essas substâncias sejam registrados e voltem a usados. Com a exclusão, o uso passa a ser proibido.
Segundo o gerente-geral de toxicologia, Carlos Alexandre Gomes, a proposta ocorre após um levantamento feito pelo órgão identificar a ausência de produtos com esses ingredientes no mercado.
Segundo o especialista, essa é a primeira vez desde 2005 que a Anvisa planeja rever a lista de monografias com base nesses critérios. Até então, a exclusão ocorria apenas nos casos em que havia reavaliação da segurança e de possíveis riscos à saúde.
Atualmente, 425 ingredientes ativos de agrotóxicos compõem a lista de monografias autorizadas pela Anvisa para registro de novos produtos.
Além da adequação ao mercado, a proposta representa uma tentativa da agência de minimizar críticas sobre a existência de agrotóxicos autorizados no Brasil que já foram banidos em outros países.
De acordo com Gomes, 30 das 34 monografias propostas para exclusão já não são mais usados nos Estados Unidos e na Europa. Com o tempo, também passaram a ter seu uso reduzido por aqui.
– Achamos ideal fazer essa 'limpeza' para harmonizar com as decisões internacionais. São produtos que já têm substitutos, que não representam um atrativo comercial ou que não se sustentam no mercado internacional – afirma Gomes.
Prevista para ser apresentada nesta terça, a proposta ainda deve passar por consulta pública. Entre os 34 ingredientes ativos que podem ser excluídos, estão a azociclotina, bromopopilato, edifenfós, oxassulfurom, sulfosato, entre outros.
Segundo Gomes, a previsão é que outros ingredientes ativos de agrotóxicos também tenham a situação revista neste ano.
Entre elas, estão quatro substâncias em processo de reavaliação toxicológica desde os anos de 2006 e 2008. Nem todas, porém, devem ser proibidas – é o caso do glifosato, que recebeu parecer inicial da agência para continuar no mercado com algumas restrições, medida que gerou críticas de especialistas.
Após a conclusão desse processo, uma nova lista de substâncias que devem passar por reavaliação de segurança deve ser divulgada até maio.
Para o pesquisador da Fiocruz na área de agrotóxicos e ex-coordenador de reavaliação toxicológica da agência, Luiz Cláudio Meirelles, a possibilidade de atualizar a lista de monografias e excluir ingredientes sem produtos no mercado é positiva. Ele faz um apelo, no entanto, para que outros produtos também sejam avaliados.
"A preocupação maior não são os agrotóxicos fora de uso, mas aqueles proibidos em outros países e ainda com largo uso no Brasil, como o acefato ou glifosato", afirma. "É isso que precisamos do ponto de vista sanitário."
Aumento nos registros
Além da tentativa de minimizar críticas sobre o aval a ingredientes ativos banidos em outros países, a proposta de rever a lista de monografias também ocorre em um contexto em que tem crescido a liberação para venda no mercado e uso industrial de produtos relacionados a agrotóxicos no Brasil.
Só em 2018, foram aprovados 450 registros desse tipo de produto, o maior número em ao menos 13 anos. Para comparação, em 2005, foram 91 registros, e em 2015, 139.
O avanço, que ganhou impulso nos últimos dois anos, no governo Michel Temer (MDB), tem chamado a atenção de especialistas, que veem a possibilidade de novo aumento na gestão de Jair Bolsonaro (PSL).
Isso porque representantes do novo governo têm se posicionado de forma mais favorável às demandas do agronegócio e intensificado críticas a algumas políticas ambientais.
Nos três primeiros meses deste ano, o número já chega a 93, de acordo com dados do Ministério da Agricultura.
Hoje, a análise de novos registros é dividida entre três órgãos: Agricultura, que avalia a eficácia dos produtos; Anvisa, que avalia a toxicidade; e Ibama, que analisa riscos ao ambiente.
Questionado, o Ministério da Agricultura diz que os registros não envolvem novos ingredientes ativos, mas produtos conhecidos do consumidor. Também atribui o aumento nas liberações a uma maior agilidade da Anvisa.
Já a Anvisa afirma que uma reorganização de processos de trabalho permitiu maior rapidez nas análises, mas que o volume de pedidos acumulados ainda inviabiliza que o prazo previsto em lei para registro, de até 120 dias, seja cumprido.