Por Rodrigo Valdez de Oliveira, coordenador do Fórum Gaúcho de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos, procurador da República
Somos os maiores consumidores de agrotóxicos, respondendo por 20% da comercialização mundial.
Os agrotóxicos estão na nossa mesa, no solo, nos nossos mananciais, foram encontrados em sistemas de abastecimento de água do RS, no leite materno, estão causando a mortandade de abelhas, prejudicando outras culturas (como o 2.4 D, no caso da vinicultura e citricultura gaúchas) e a saúde dos nossos trabalhadores rurais .
Dos 504 princípios ativos registrados no país, 149 são proibidos na Comunidade Europeia, dois dos quais (acefato e atrazina) estão entre os 10 mais usados no Brasil. Os limites máximos de resíduos (LMR) permitidos nos alimentos e na água são muito maiores aqui do que na União Europeia. No caso do glifosato, agrotóxico mais utilizado no Brasil, o LMR para água potável é 5 mil vezes maior em nosso país do que na Comunidade Europeia.
Seriam os brasileiros mais resistentes?
Não conhecemos os reais efeitos desses produtos na saúde humana, porque os estudos são realizados para cada princípio ativo isoladamente, desconsiderando a múltipla exposição e o consumo de alimentos variados contendo resíduos de diferentes agrotóxicos, bem como a interação entre essas substâncias.
Ou seja, a situação atual é alarmante.
E ficará muito pior se for aprovado o PL 6.299/02 – Pacote do Veneno. A pretexto de atualizar a "defasada" Lei 7.802/89 e agilizar o registro de produtos novos, retira o poder decisório da Anvisa (responsável pela avaliação toxicológica) e do Ibama, deixando a coordenação e decisão sobre o registro a cargo unicamente do Ministério da Agricultura, colocando a saúde e o meio ambiente em segundo plano.
Cria a figura do registro temporário, permitindo a comercialização de produtos novos caso o processo de registro não seja concluído em 24 meses. Por outro lado, não prevê a reavaliação periódica do registro, como ocorre no Japão, nos EUA e na Comunidade Europeia, nem possibilita a abertura de processo de reavaliação a partir de estudos científicos nacionais.
Se o processo de registro de agrotóxicos é moroso, por que não dotar os órgãos responsáveis (atualmente Mapa, Anvisa e Ibama) de melhor estrutura, ampliando o número de servidores e priorizando tal atividade?
Fiocruz, Inca, Abrasco, SBPC, MPF e MP de diversos Estados, MPT, Defensorias Públicas, Conselho Nacional de Saúde, Consea, Ibama, Anvisa, Associação Brasileira de Agroecologia, além de centenas de outras entidades, manifestaram-se de forma veemente contra a aprovação do PL 6.299/02. Não se trata de argumento de autoridade, tampouco de "questão ideológica", mas de observância da Constituição, a qual obriga o Estado brasileiro (e os congressistas) a defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações, assegurando a saúde como direito de todos e dever do Estado.