Produtores de uvas viníferas da região da Campanha, do município de Jaguari e representantes do Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin) se reuniram na tarde desta terça-feira (18) com a promotora Anelise Grehs, do Ministério Público Estadual, para reforçar os pedidos de providências contra o agrotóxico 2,4-D, usado por sojicultores antes da época de plantio para eliminar a erva-daninha conhecida como buva. Reportagem especial de GaúchaZH publicada na última sexta-feira (14) mostra que laudos confirmam danos milionários em parreirais e pomares causados pelo herbicida.
Alguns dos principais produtores de parreirais do Estado, com investimentos milionários em vinícolas, solicitaram que a promotora ingresse judicialmente para suspender a utilização do 2,4-D em todo o Rio Grande do Sul.
— Estamos insistindo que a solução é proibir. Somente programas de qualificação para reduzir a deriva não são suficientes. O Deriva Zero começou neste ano por Dom Pedrito e o resultado foi pífio. Sabe-se que 100% das oliveiras e videiras deste município foram afetados pelo 2,4-D — afirma Valter Pötter, proprietário da estância Guatambu.
Resultados de exames de laboratórios feitos pela Secretaria da Agricultura confirmaram, em 18 municípios, que a deriva do 2,4-D aplicado na soja, levado pelo ar, atingiu videiras, oliveiras e plantações de frutas. Até o momento, de 53 amostras coletadas e analisadas pela secretaria, 52 deram resultado positivo para a presença do herbicida. Como o agroquímico ataca o sistema hormonal de vegetais, ao entrar em contato com outras culturas, ele acaba causando atrofia, fazendo com que plantas não se desenvolvam e morram. Com isso, foram verificadas perdas de 40%, de 50% e até de 90% em propriedades que cultivam videiras e oliveiras, resultando em prejuízos milionários.
Para os produtores que foram ao encontro da promotora, criar áreas de exclusão onde o 2,4-D não poderia ser aplicado seria uma solução inócua. Eles alegam que a fiscalização seria inviável devido à quantidade de propriedades rurais. Acrescentam que o Rio Grande do Sul se caracteriza pela variedade de culturas dentro das mesmas regiões e até em campos vizinhos, o que poderia tornar o zoneamento ineficiente.
Pötter explica que os produtores irão contratar um escritório agrônomo independente para elaborar uma lista de agroquímicos que poderiam substituir o 2,4-D no combate às ervas-daninhas, com efeitos menos danosos às demais culturas. O relatório será entregue ao MP e também deverá conter a diferença de custo para a lavoura de soja com o uso do 2,4-D — mais barato — e o comparativo no caso de aplicação de outros herbicidas. A busca de produtos alternativos é considerada fundamental para encontrar um caminho que não prejudique o plantio de soja, principal cultura agrícola do Estado e do país.
— O nosso foco agora será comprovar que existem alternativas ao 2,4-D. O dano econômico para oliveiras, videiras e à fruticultura já está comprovado — diz Leocir Bottega, diretor-técnico da Ibravin.
Anelise classificou a reunião como "boa" e disse ter ouvido relatos de que a deriva de 2,4-D continuaria ocorrendo na região da Campanha — possível consequência do replantio de soja. Ela, contudo, afirmou não ter firmado convicção sobre qual será sua decisão. Até o momento, segue trabalhando com três hipóteses: requerer suspensão judicial da aplicação do agrotóxico, criar um acordo pelo uso de produtos alternativos ou estabelecer zonas de exclusão.
— Em meados de janeiro teremos um posicionamento definitivo, após a entrega dos laudos da Seapi — explica a promotora.
Reportagem Especial
Na Guatambu Estância do Vinho, em Dom Pedrito, premiada internacionalmente, o sentimento é de frustração na terceira safra com problemas de contaminação nos parreirais.
Além de investir em áreas próprias de olivais, o empresário Luiz Eduardo Batalha fomentou o cultivo de oliveiras em outras 30 propriedades na região.
Em Candiota, o mesmo sentimento de frustração é visto na Vinícola Galvão Bueno, do apresentador da Rede Globo, onde a estimativa é de redução de 30% da produção em 30 hectares de parreirais. Na safra anterior, as perdas chegaram a 50%.
Antes de os danos aparecerem, a colheita da cooperativa chegava a 1 milhão de quilos. Neste safra, a projeção é de 450 mil quilos. Cerca de 30% dos produtores associados arrancaram os parreirais, partindo para outras atividades.
O uso do 2,4-D nas lavouras de soja não é apenas uma escolha econômica, segundo produtores. A opção é justificada também pela eficiência da molécula química para conter o avanço de ervas daninhas.
Na região que concentra a maior parte do plantio de maçãs do Rio Grande do Sul, a deriva do 2,4-D começa a deixar rastros nos pomares.
Especialistas asseguram que o princípio do 2,4-D não se aloja no produto final.
O invisível é mais grave, pois é a qualidade das águas e a vida microbiana associada às vegetações, sem falar nos polinizadores – abelhas e pássaros –, que são afetados.
A aplicação de qualquer herbicida está sujeita à deriva se não forem seguidas boas práticas agrícolas, segundo Ulisses Antuniassi, professor da Unesp Botucatu e especialista em tecnologia de aplicação.