Há cinco anos, os parreirais de uva em Jaguari, na região Central, começaram a produzir menos cachos do que em safras anteriores. Os problemas eram comuns em diversas propriedades do município – conhecido pelos vinhos de mesa das variedades híbridas americanas bordô e goethe.
– No começo, não sabíamos o que estava acontecendo. Depois, com análises de técnicos, da Embrapa e do Ibravin, descobrimos o problema – lembra João Alberto Minuzzi (foto), presidente da Cooperativa Agrária São José, fundada há 86 anos e fabricante dos Vinhos Jaguari.
No município, as três amostras colhidas pela Secretaria da Agricultura nesta safra tiveram resultado positivo para resíduo do herbicida 2,4-D.
– Já suspeitávamos e agora, pela primeira vez, temos a confirmação oficial – afirma o presidente da cooperativa, que abrange 58 associados e 120 hectares cultivados.
Antes de os danos aparecerem, a colheita da cooperativa chegava a 1 milhão de quilos. Neste safra, a projeção é de 450 mil quilos. Cerca de 30% dos produtores associados arrancaram os parreirais, partindo para outras atividades, como fumo e soja.
O produtor Jeferson Chequim Guerra poderá engrossar a lista de abandono à uva em Jaguari. Com perda estimada em 90% da produção nesta safra, não vê como dar continuidade à atividade iniciada ainda pelo avô de 78 anos – filho de migrantes italianos que trouxeram do país de origem a cultura da uva e do vinho.
– É o pior ano de todos. Este parreiral tem menos de 20 anos, mas não vejo mais como recuperá-lo – lamenta Guerra, que recebeu o laudo confirmando a deriva do herbicida no último dia 5, no momento em que a reportagem visitava a propriedade.
Produtor de soja em uma área de seis hectares, Guerra usa um produto alternativo ao 2,4-D nas lavouras.
– Meus vizinhos também não usam 2,4-D na soja. Isso quer dizer que a deriva está vindo de mais longe – suspeita o agricultor.
Lei municipal para conter deriva
Diante dos danos recorrentes de deriva nos parreirais, Jaguari tentou disciplinar o uso de herbicidas com o princípio ativo 2,4-D por meio de lei municipal. Sancionada em 2017, a legislação proíbe o uso do produto de 15 de setembro a 15 de março na área produtora de videiras na localidade do Chapadão e na margem de proteção definida por zoneamento municipal.
– A intenção da lei é muito boa. O problema é que é difícil fiscalizar todas as áreas e saber de onde vem a deriva – diz João Alberto Minuzzi, presidente da Cooperativa Agrária São José.
Os prejuízos em Jaguari foram os primeiros a mobilizar o Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin), que neste ano financiou o custo dos laudos nas propriedades com relatos de perdas.
– O problema preocupa muito, estamos falando da nossa base produtiva, que é a uva – afirma Helio Marchioro, conselheiro do Ibravin e diretor-executivo da Federação das Cooperativas Vinícolas do RS (Fecovinho).
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Resíduo da aplicação do herbicida 2,4-D é apontado como causador de perdas em uvas, oliveiras e maçãs. Zero Hora visitou sete propriedades que receberam as confirmações da deriva em Bagé, Candiota, Dom Pedrito, Santana do Livramento, Jaguari e Monte Alegre dos Campos.