Geralmente associado à ordenha, o uso de robôs nas propriedades de leite fornece um arsenal de informações que ajuda o produtor a gerenciar a propriedade. Os dados servem, por exemplo, para o aprimoramento genético. Como o sistema gera relatórios em tempo real e armazena o histórico de produção, é possível identificar quais são os animais com melhores resultados e até qual é o momento mais adequado para a reprodução.
A tecnologia permite ainda detectar problemas de saúde e controlar melhor a alimentação. Isso porque a ração é fornecida pelo próprio robô, que libera alimento no momento da ordenha e de acordo com o rendimento da vaca, estimulando a produtividade.
Esses ganhos podem abrir oportunidades para a indústria, com maior qualidade dos produtos. O resultado, porém, deve ser sentido a longo prazo pelo consumidor, segundo Darlan Palharini, secretário-executivo do Sindicato da Indústria de Laticínios e Produtos Derivados do Estado (Sindilat-RS):
– No Rio Grande do Sul, há espaço para melhoramento genético. E, trazendo o robô para as propriedades, é possível aumentar o índice de sólidos no leite, o que gera uma conversão industrial maior em alguns produtos, como queijos.
Raças holandesa e jersey
A maior parte dos rebanhos que utilizam ordenha robotizada é da raça holandesa.Porém, as máquinas se adaptam a animais de menor porte, como jersey.
Animais mais saudáveis e produtividade maior
Matéria-prima dos queijos finos, o leite produzido por meio da ordenha robotizada na Granja Cichelero já resultou em ganhos nos sólidos, com incremento de gordura e proteína. Os R$ 1,4 milhão investidos na aquisição de dois robôs de ordenha e em melhorias estruturais também diminuíram a necessidade de mão de obra na empresa de Carlos Barbosa, na Serra.
– Conseguimos aumentar em 5% a produtividade do rebanho, mas o principal incremento é na qualidade do leite. Reduzimos em 60% a contagem de células somáticas desde que implantamos robôs (quanto menos células, mais saudável está o animal) – afirma o produtor Daniel Cichelero.
Escala de produção das cooperativas ajuda a disseminar tecnologia
As cooperativas devem ter papel importante na disseminação dos robôs de ordenha. Isso porque o investimento é alto e necessita de escala de produção para gerar retorno. O valor para adotar a tecnologia pode passar de R$ 1 milhão, incluindo reforma e custo do robô, que sozinho, fica a partir de R$ 600 mil.
Nos últimos anos, a Dália Alimentos investiu na estruturação de quatro granjas equipadas com três máquinas cada. Os chamados condomínios leiteiros estão em Arroio do Meio, Candelária, Nova Bréscia e Roca Sales e envolvem mais de 50 famílias associadas.
– Cada condomínio tem em torno de 210 vacas, atingindo produção de 6,3 mil litros por dia – destaca Igor Weingartner, gerente da divisão de produção agropecuária da Dália.
Já a Santa Clara, de Carlos Barbosa, foi a primeira cooperativa a ter um produtor com ordenha robotizada. Ezequiel Nólio segue como único que produz com a ajuda de robôs, mas outros associados pretendem adotar a tecnologia.
– É um caminho sem volta porque melhora a vida do produtor e ajuda a manter a atividade nas propriedades – afirma Maurício Bonafé, gerente do departamento de política leiteira da Santa Clara.
Processo mais eficiente sem interferência humana
Cheias de leite no úbere, as vacas se aproximam sozinhas da sala de ordenha. Assim que um animal se acomoda dentro da estrutura, um braço robótico começa a atuar. Em questão de segundos, a máquina encaixa as teteiras, por onde passará o leite com destino ao tanque resfriador. Todo o processo ocorre sem interferência humana. Há três anos, essa cena ocorre durante 24 horas por dia no Tambo Nólio, em Paraí. Aos poucos, a situação começa a se tornar comum também em outras localidades do Rio Grande do Sul.
A família Nólio foi pioneira na robotização da ordenha no Estado. Em 2015, o produtor Ezequiel Nólio e seus pais investiram mais de R$ 900 mil na aquisição de um robô e em melhorias estruturais para a adaptação ao sistema. Foi instalado um software, que gera relatórios em tempo real sobre a produtividade e a saúde dos animais. A opção pela tecnologia mudou radicalmente a rotina na produção.
– A prioridade não é mais fazer a ordenha, mas sim tomar decisões em cima dos dados gerados pela própria máquina. Hoje, dá para gerir melhor a propriedade e decidir, por exemplo, qual vaca fica e qual é descartada – relata Ezequiel Nólio, responsável por gerenciar o tambo.
O produtor salienta que o único arrependimento foi não ter adotado a tecnologia há mais tempo. Ele aponta como maior vantagem a melhora na qualidade de vida. Hoje, não precisa acordar às 5h para ordenhar as vacas, que agora “escolhem” o horário que desejam fornecer leite. O produtor trabalha pela manhã e tem as tardes livres. Além disso, não é mais necessária mão de obra na ordenha, que antes ocupava três funcionários.
No local, as mais de 60 vacas do rebanho geram em torno de 2,3 mil litros de leite por dia, que são entregues à cooperativa Santa Clara. Antes do robô, era produzida a mesma quantidade da bebida, mas a partir de 80 animais.
A adoção do sistema fez o Tambo Nólio virar atração turística em Paraí. Por mês, em torno de 500 pessoas, entre estudantes, pecuaristas e profissionais de diferentes áreas, vão conhecer de perto como opera o robô na ordenha.
Municípios com ordenha robotizada
No Estado, há robôs em propriedades de Arroio do Meio, Barão de Cotegipe, Candelária, Carlos Barbosa, Erechim, Guaporé, Muitos Capões, Nova Bassano, Nova Bréscia, Paraí, Pontão Roca Sales, Vacaria e Vespasiano Corrêa.
Cenário econômico impede maior expansão
Plantel de gado leiteiro com maior produtividade do país, o Rio Grande do Sul também é líder na robotização da ordenha. Em solo gaúcho, a tecnologia começou a ser utilizada em 2015 e hoje está presente em 16 propriedades. Essa expansão poderia ter sido mais rápida, não fosse a crise enfrentada pelo setor leiteiro, sobretudo no ano passado, com a queda da remuneração dos profissionais da atividade.
Mais recentemente, outro fator se tornou obstáculo para o avanço do sistema: a desvalorização do real frente ao dólar e ao euro. Atualmente, três fabricantes atuam no país e importam os equipamentos de Alemanha, Holanda e Suécia. E, por isso, o preço no mercado nacional acaba acompanhando a oscilação do câmbio.
– A crise no setor e a alta do dólar impactaram um pouco a procura pelos robôs, mas vemos tendência de aumento da robotização – aposta Valdair Kliks, representante comercial da holandesa Lely no Brasil.
Como o investimento é significativo, empresas começam a oferecer aluguel do equipamento. É o caso da sueca DeLaval, que já tem boa parte da demanda vinda desta modalidade.
– O custo do aluguel sai em torno de R$ 5,5 mil mensais, e a procura está muito forte. Devemos instalar 33 robôs até o final do ano, a maioria por aluguel – menciona Márcio Gato, gerente comercial da DeLaval no Rio Grande do Sul.
Custos à parte, a adoção dos equipamentos de ordenha passa pela melhora na qualidade de vida do produtor, que não precisa mais madrugar para tirar leite, e pela redução da necessidade de funcionários.
– O robô permite a flexibilização de horários. No modelo tradicional, o produtor fica preso sete dias da semana – compara Pedro Hepp, representante comercial da alemã GEA.
Sistema ajuda no bem-estar animal
Com o robô, os animais são ordenhados três vezes ou mais ao dia. Segundo criadores que já adotaram o sistema, a ordenha realizada em diferentes períodos melhora o bem-estar dos animais e diminui problemas de saúde, como a mastite (inflamação das glândulas mamárias).
No Rio Grande do Sul, o sistema está presente em 14 municípios, sendo sete na Serra. Apesar do avanço do modelo, a tecnologia é restrita a um grupo pequeno de produtores, em razão do custo do investimento.
Jaime Ries, assistente técnico da Emater-RS, avalia que é preciso alta produção ao dia – em torno de 2 mil litros de leite – para justificar o valor aplicado na tecnologia.
O Estado conta com cerca de 65 mil produtores de leite, mas no máximo mil teriam potencial para automatizar a ordenha, reforça o presidente da Associação Gaúcha de Laticinistas e Laticínios (AGL), Ernesto Krug. Mesmo assim, ele explica que a adoção do sistema é tendência mundial por ser mais eficiente do que a mão de obra humana e gerar ganhos de rendimento:
– Com o robô, a vaca vai à sala no horário que prefere, o que aumenta o conforto do animal e gera incremento médio de 10% na produtividade – avalia.
O dirigente destaca que a robotização é vantajosa para propriedades com mais de 60 animais e que adotam o sistema de confinamento. Mas ressalta a necessidade de análise individual para saber se o investimento efetivamente compensa.