No ciclo de vida humano, cada fase tem sua beleza e suas características particulares, e com o prazer sexual não é diferente. O orgasmo feminino passa por mudanças ao longo do tempo, impulsionado por um combo de fatores biopsicossociais: tem a ver com alterações nos níveis de hormônios e nas terminações nervosas, é claro, mas chegar lá também está relacionado ao autoconhecimento, à experiência e aos relacionamentos.
— Sexo é algo que se aprende com o tempo e, portanto, o orgasmo também. Tanto é que o ápice é na fase adulta, já que as mulheres vão evoluindo no seu prazer, seja por habilidade pessoal, tentativas, seja porque buscaram ajuda, informações e, somado a isso, tiveram experiências com parcerias habilidosas. Tudo soma — afirma a ginecologista e sexóloga Sandra Scalco.
Quando o assunto é orgasmo feminino, os contrastes são mais intensos em três momentos da vida: na adolescência/início da fase adulta, na adultez (entre os 25 e 40 anos) e no climatério/menopausa. Na adolescência, explica Sandra, é quando há mais chances do orgasmo ocorrer de forma “quase espontânea” ou “cair do céu”. Isso porque entra em cena um boom hormonal que desperta a curiosidade e o autoerotismo, e porque há uma resposta muito boa do ponto de vista da genitália.
— Se não houver agravos, como traumas ou muita repressão em casa, as experimentações e a masturbação vão ocorrendo e oportunizando a evolução sexual. Junto com isso há a resposta física dos hormônios, numa região extremamente sensível. Na adolescência, o padrão inicial do orgasmo é com uma resposta meio que "sem saber de onde veio". E essa resposta é bastante "genitalizada", é aquele orgasmo rápido e localizado – descreve a médica.
Com o tempo, vem mais aprendizado e intimidade, consigo e com as parcerias. A tendência é que a mulher na fase da adultez saiba se posicionar melhor e esteja mais madura, no ápice em termos de autoconhecimento sobre o que lhe dá prazer ou não. Tudo isso colabora para a qualidade do orgasmo.
— Na literatura consta que o ápice do orgasmo feminino é na fase dos 25 aos 40. Na adultez o orgasmo é mais controlado e é ela quem faz acontecer. A mulher aprende a ter orgasmo de diferentes formas, a segurá-lo, sabe dizer as posições que prefere, domina melhor a situação — explica Sandra.
Na fase adulta também é comum a pessoa conseguir associar imaginação, contexto relacional e experiência na hora do sexo, e com isso o orgasmo passa a ter uma resposta que vai muito além do clitóris e da vagina, afirma a sexóloga:
— Essa combinação faz com que, além da sensação local, a pessoa tenha uma sensação de prazer que se assemelha a uma "pequena morte", um êxtase que é bem cerebral mesmo. Além disso, pelos relatos que ouço em consultório, lá pelos 30 ou 35 anos é o momento em que muitas mulheres passam a dar alguma prioridade à esfera sexual, coisa que não tinham conseguido fazer até então.
Climatério e menopausa
No período dos 45 a 55 (aproximadamente, pois varia de pessoa para pessoa) a mulher começa a fase climatérica e, depois, passa a transição menopáusica. Nesses momentos, detalha a ginecologista, pode ocorrer um declínio de hormônios, do desejo sexual e, consequentemente, do orgasmo, que tende a mudar o seu padrão. Com o envelhecimento, também, a resposta do sistema nervoso pode ficar mais lenta, o que, consequentemente, pode vir a influenciar no aumento da dificuldade para chegar ao orgasmo.
— A mulher pós-menopausa também pode perder um pouco da força de ejeção, que é o pulso, o impacto. É como se antes o orgasmo fosse uma montanha russa com um pico bem alto, uma montanha e, na pós-menopausa, é menos alto. O orgasmo também tende a precisar de um período de estímulos mais longo para rolar. Mas, ressalto, não é impossível ter orgasmo na pós-menopausa, longe disso, mas talvez seja necessário trabalhar diferente — detalha Sandra.
Um declínio dos níveis de colágeno e o afinamento da pele eventualmente também podem estar nesse conjunto de fatores que aumentam a dificuldade para chegar ao orgasmo na maturidade, mas a questão das mudanças nas terminações nervosas, que tornam a resposta orgástica mais lenta, é a mais relevante, ressalta a médica. Nesse contexto, ferramentas para estimular ainda mais as zonas erógenas são grandes aliadas:
— Há um artigo que aponta que, com o tempo, a enervação da região do clitóris pode não responder mais tão bem à pressão, ao toque, mas pode responder superbem a vibrações e vibradores com sucção. Isso desmistifica ainda mais o uso de sex toys como algo "pejorativo" para tornar-se algo terapêutico. Então o fato de ter um declínio não quer dizer que não haja o que fazer para chegar ao orgasmo, o que muda é a perspectiva – afirma Sandra.
Relacionamentos
Um grande vilão do orgasmo e do prazer, aponta a terapeuta, é a automatização do sexo, coisa que acontece principalmente em relacionamentos que já duram décadas. Para ter prazer, é preciso investir no relacionamento para que o sexo e a erotização não saiam de cena.
— Para quem está tendo declínio na funcionalidade sexual e ainda por cima está num relacionamento onde o casal não sai, não prioriza a vida a dois, acha que o sexo tem que rolar de forma espontânea e não faz acontecer, talvez seja legal fazer terapia sexual para ressignificar essa parte. É importante aumentar repertório, não se contentar com aquele “beabá” que já conhecem. Aprender a segurar orgasmo e a chegar lá de outras formas e associar estímulos para intensificar o prazer são boas estratégias. Do ponto de vista comportamental, tudo pode ser trabalhado, tanto individualmente como em casal — afirma a ginecologista.