"A gente realmente tem uma conexão muito grande, a gente se ama muito, cuida um do outro", disse recentemente o apresentador João Vicente de Castro sobre a relação que mantém com Sabrina Sato, com quem namorou por cerca de dois anos entre 2013 e 2015. Os artistas, inclusive, estão trabalhando juntos e apresentam o novo reality Let Love, do Multishow e do Globoplay.
A estranheza que a declaração causou em parte do público mostra o quanto ainda não é normalizado o fato de ex-namorados continuarem amigos após o término. Para além de situações nas quais são obrigados a tentar estabelecer certa cordialidade (se têm filhos envolvidos na equação, por exemplo, ou quando seguem colegas de trabalho), por que pessoas que já se relacionaram de forma romântica não podem cultivar uma amizade, se ainda há carinho e afeto?
É saudável manter amizade com ex?
Para a psicóloga e terapeuta de casais Tatiana Perez, não manter uma amizade com o ex vem da lógica do amor romântico, que traz a ideia de que estamos no mundo para encontrar "a outra metade da laranja", a única que vai encaixar conosco, para, assim, vivermos juntos e felizes para sempre.
Essa construção faz com que as pessoas pensem, mesmo que de forma inconsciente: se terminamos, então ela não era minha alma gêmea. E por que manter uma amizade com alguém para quem investi tanto tempo de forma "errônea"?
— Na lógica do amor romântico, o outro é meu, ele me pertence. No momento em que ele decide não ser mais meu, ou que nós decidimos não sermos mais um do outro, a gente precisa cortar relações. A ideia de que, ao finalizar um relacionamento, eu tenho que romper relações com a pessoa e odiá-la para o resto da vida vai muito em uma lógica de posse, de "ela deixou de ser minha, então eu não posso mais gostar dela" — avalia a psicóloga.
Entretanto, o cenário mais favorável seria justamente entender que, apesar da conexão amorosa e sexual ter chegado ao fim, isso não significa que o afeto, o carinho e o respeito, entre outros fatores que caracterizam uma amizade, precisam acabar. Ou seja, o rompimento drástico (talvez o mais comum entre os términos) não necessariamente é o mais bem resolvido.
— Alguns teóricos da terapia sistêmica colocam que, quando rompemos uma relação e nunca mais queremos olhar na cara da pessoa, mantemos um laço com ela, ainda que seja de ódio. Agora, quando conseguimos desfazer esse laço com cuidado, com atenção, mesmo que a gente nunca mais encontre a pessoa, não vamos estar mantendo um nó ali — explica a terapeuta de casal.
Para ela, o término saudável é aquele em que não ficam mágoas.
— Isso significa que eu vou ter uma amizade? Não necessariamente, mas pelo menos não vai ter esse vínculo de ódio.
Portanto, de acordo com Tatiana, é saudável ser amigo de um ex em qualquer situação, desde que seja um desejo de ambas as partes.
Os limites
Os limites que serão estabelecidos na construção dessa amizade pós-término vão variar de casal para casal, ressalta a profissional. Mas o ponto central dessa transição passa por entender o novo papel que esse relacionamento terá na vida de cada um.
— Pode ser um pouco confuso no início. É por isso também que muitos casais optam por um rompimento muito brusco ou muito drástico, porque têm dificuldade de lidar com esses limites.
Ao não saber muito bem como se portar diante da nova dinâmica, muitos optam pelo extremo: cortar a pessoa de todos os aspectos da vida. Mas não precisa ser assim. A psicóloga dá algumas dicas para quem quer experimentar seguir amigo após o término: independentemente do que aconteceu, colocar o respeito em primeiro lugar e entender o espaço do outro, já que, por vezes, ele pode precisar de um tempo para digerir o fim do namoro.
Além disso, a profissional indica a terapia de casal.
— Existe, dentro da terapia de casal, a possibilidade de fazer uma terapia de separação, que ajuda o casal a organizar tudo nesse processo, construir novos limites e uma boa relação. Eu costumo dizer que a terapia de casal não é para salvar casamentos e também não é para forçar uma separação. É para ajudar o casal a ficar bem independente do resultado — explica.
Como fica o ciúme
Ok, tudo resolvido, você e seu (ou sua) ex são amigos. Mas aí você engata outro namoro e a nova pessoa sente ciúme dessa amizade. Como lidar? Em primeiro lugar, validar o sentimento, reforça a terapeuta.
— No sentido de "ok, eu entendo que exista esse ciúme, porque a construção social de amor na qual a gente vive entende que não se deve manter essa amizade" — diz.
Porém, na sequência, é importante que você converse com quem está entrando na sua vida e explique qual é o papel dessa amizade para você, deixando claro que não é a mesma relação que existiu no passado, que não há a mesma intimidade ou a mesma proximidade. E reforçar que é com ela que você quer construir um relacionamento romântico e formar um casal, buscando fazer com que ela se sinta segura.
— A melhor maneira de lidar com o ciúme do outro é validar, não achar que a pessoa é louca porque pensa isso, porque existe uma construção social de que ex não deve ser amigo de ex. O que é um mito, na verdade. E conseguir estabelecer esse limite, deixar claro para a outra pessoa o papel de cada uma na sua vida — resume Tatiana.
Por fim, caso você seja a pessoa que sente o ciúme da amizade que seu namorado (a) mantém com o (a) ex, a psicóloga indica uma reflexão, partindo de como você se relaciona com os seus antigos términos.
— É importante entender o que eu penso sobre isso. Como é, para mim, manter amizade com um ex? Como foram os meus términos anteriores e como eu me relaciono com os ex? Para conseguir ter clareza de quais são as minhas crenças sobre isso. O segundo ponto é conseguir olhar para a relação em que eu estou e avaliar se me dá segurança desse contato que a pessoa tem com o ex.
Se for o caso de você perceber que existe ali uma intimidade que faz esse ciúme existir, aí o indicado é conversar com o atual parceiro ou parceira para pontuar quais são os limites que não estão bem estabelecidos e podem ser ajustados. Por fim, compreender o quanto estar nessa posição faz sentido para você.
— Às vezes, pode acontecer de um casal não estar mais junto, mas ter uma vida muito parecida com a que tinha antes. E, quando uma nova pessoa entra na vida de alguém, se sentir deslocada — destaca.