A comunicação-não violenta entre pais e filhos já tem nome: trata-se da disciplina positiva. A abordagem, criada por Jane Nelsen, busca educar as crianças com firmeza e gentileza, desenvolvendo senso de responsabilidade, autonomia, cooperação e respeito por si e pelos outros.
A psicóloga clínica Keila Tres, especialista em análise transacional e educadora parental, explica como podemos fazer uso da disciplina positiva e construir uma relação mais empática com os pequenos. Abaixo, ela responde as principais dúvidas sobre o assunto:
Como a técnica se aplica no dia a dia?
Em situações de rotina, desafiadoras ou não. A proposta envolve uma mudança de paradigma: migrando de uma cultura autoritária e ancorada no medo para um formato de convivência colaborativa, onde todos são ouvidos, respeitados e desenvolvem um senso de comunidade.
Na prática, abre-se mão de posturas punitivas como castigos, gritos ou o famoso “cantinho do pensamento". Fica de fora também a lógica das ofertas de recompensas para obtenção da mudança de comportamento das crianças. A disciplina positiva traz uma visão de respeito e empatia pelas emoções do outro e também o convite para uma forma colaborativa de solução para as questões do dia a dia.
Há quem identifique a disciplina positiva como “falta de limites”. Isso é verdade?
Existe este preconceito e é um equívoco. Os limites são fundamentais e estruturantes para a personalidade que está se formando. Gosto de usar com os familiares a metáfora que compara os limites a uma rede de contenção para trapezistas: se a criança sabe que existem pessoas confiáveis e acolhedoras que estão prontas para mantê-las em um “lugar seguro" ao longo da vida, sem ameaçá-las, elas ficarão à vontade para experimentar sua autonomia e sentirão que existe abertura para pedir ajuda quando for necessário.
Qual é a principal dificuldade encontrada pelos pais hoje quando falamos em educação?
Um dos maiores desafios para os familiares é a disponibilidade de tempo com “qualidade de presença” para convivência com os filhos. A correria da rotina, as longas jornadas de trabalho, o cansaço e o tempo que dedicamos às telas em geral (celulares, televisores) são fatores que ocupam muito do espaço da convivência em família, sobrando pouca energia para as brincadeiras e o diálogo.
Na prática, encontrar o caminho da gentileza e da não-violência é um desafio importante, já que, na maioria dos casos, os familiares relatam histórias pessoais de processos educativos impositivos e violentos, baseados no conceito de “obediência cega”.
Além disso, muitas vezes os sentimentos de culpa, frustração e vergonha por sentirem-se falhando na missão de educar fazem com que os pais demorem a buscar apoio profissional, o que pode levar ao estado de exaustão e desequilíbrio de todo o sistema familiar.
3 dicas para conseguir cooperação na disciplina positiva
Mostre empatia: seja franca e diga à criança o que você percebe que ela está sentindo e que você entende esse sentimento. Use exemplos pessoais para garantir essa aproximação.
Encoraje: você pode auxiliar a criança a pensar em alternativas para melhorar seu desempenho na escola, por exemplo. Deixe a criança dar ideias. Se elas não virem espontaneamente, sugira opções para que vocês decidam juntos.
Use a brincadeira para ensinar: a criança não come? Que tal pensar em uma brincadeira que envolva comidas, frutas e verduras? Planejar um piquenique saudável, brincar de dar comidinhas para bonecas, bichinhos de pelúcia ou dinossauros. Brincar baseando-se nas cores dos alimentos também pode ser legal. Sempre existem tarefas seguras e divertidas que podem se transformar em estímulos de contato com os alimentos.
Vanessa Martini é mãe do Theo e jornalista. Tem um blog, o Mãezinha Vai Com As Outras, onde divida a rotina e os aprendizados da maternidade. Escreve semanalmente sobre o assunto em revistadonna.com.