Monalysa e Juliana, as duas finalistas Matias Borgström/BE Emotion
Desde o anúncio da vencedora do concurso Miss Brasil 2017 no último sábado (dia 19), a internet se dividiu. Monalysa Alcântara, miss Piauí 2017, 18 anos, venceu o maior concurso de beleza do país. E daí? Daí que ela é negra. Tem cabelos cacheados. E é uma miss Brasil negra pela segunda vez consecutiva. Foi o que bastou para muitos internautas saírem criticando a escolha de todas as formas.
Você sabia que, em 61 anos de concurso, só uma negra tinha sido eleita a mulher mais bonita do país até o ano passado? Isso mesmo, a primeira foi a gaúcha Deise Nunes em 1986. O período de 30 anos foi quebrado com o título dado à paranaense Raíssa Santana em 2016. Ou seja, desde que o concurso foi criado, só três mulheres negras venceram o Miss Brasil – e isto em um país com mais da metade da população negra. Por que isso nunca foi questionado? E por que agora que temos novamente uma negra eleita isso é considerado "cota"?
É claro que muitas pessoas apoiaram a jovem Monalysa imediatamente. Mas, com o Brasil do jeito que está, com discursos de ódio para todos os lados, inúmeras críticas surgiram. E, pior, muitas mensagens com palavras racistas e preconceitos generalizados contra nordestinos.
Li comentários irreproduzíveis aqui, nos quais comparavam as diferenças entre as duas finalistas do concurso. A miss Piauí disputou o título com a miss Rio Grande do Sul, Juliana Mueller, que ficou em segundo lugar. E só isso já foi suficiente para lermos muitos absurdos comparando a beleza e a origem de ambas. Li nas redes sociais pessoas falando que não teremos chance na etapa final do Miss Universo, gente questionando a beleza e a simplicidade da candidata, dizendo que Monalysa irá passar vergonha. Vergonha tenho eu de tanta gente preconceituosa!
Em tempos de ascensão do feminismo e liberdade capilar e corporal, uma nova mulher negra cacheada vencer o concurso de beleza mais importante do país é revigorante. Acho que concursos excluem a mulher “fora dos padrões” e podem influenciar nessa "busca pela perfeição" em que as mulheres vivem. Mas fatos como esses não podem ser ignorados: que este episódio possa ser um início de reestruturação desse tipo de concurso.
Monalysa é uma mulher deslumbrante e, além disso, tem todo o contexto que uma miss deve ter, além da beleza, muito carisma e simpatia. Porém, não concordo com o uso do termo "brasilidade" descrito por um dos jurados em voto aberto ao indicar a Miss Piauí para o título. Esse estereótipo aliás é extremamente fraco para um concurso deste porte. Nenhuma brasileira tem mais ou menos cara do Brasil – não importa a origem ou a cor. O que é essa tal brasilidade, afinal? E aproveitando: outros padrões representativos desta suposta "cara do Brasil", como mulata do Carnaval e "da cor do pecado", também não servem mais.
No passado, já gostei muito de concursos de beleza, depois que entendi o quão parciais sempre foram e estavam sendo, parei de me interessar. Agora, depois destes últimos dois anos, o Miss Brasil me despertou certa esperança, já que finalmente começou a me representar.
Quanto mais aparece a mulher negra em todos os lugares, mas elas (nós) iremos aceitar nossa imagem e isso atinge nossa autoestima diretamente. Ver que estamos integradas e somos lindas. Porque não se ver é não se sentir representada, é como se estivéssemos apagadas. Afinal, não é estranho termos mais da metade da população negra no país e mesmo assim sentirmos falta disso? A própria Monalysa diz que não se reconhecia como negra na infância e quer justamente ajudar a mulher negra a valorizar a própria beleza. Ela quer que através de sua história abra espaço para as mulheres negras poderem sonhar.
Por fim, uma mulher branca vencer um concurso de beleza é "mais do mesmo", uma mulher negra vencer são milhões de meninas que não se sentem representadas vencendo junto.
Leia também