Se eu conto, ninguém acredita: fui uma criança muito chata para comer. Daquele nível de chatice que tira as noites de sono dos pais, sabe? Sem motivo algum, não tive intolerância nem nada, era falta de apetite, mesmo.
Ouvi essa história tantas vezes que me enxergo nela como se fosse ontem. Eu, com uns três anos de idade, e meus pais vibrando quando, lá pelas tantas, numa das poucas e sofridas colheradas da minha massinha com guisadinho, o fundo do prato começava a se revelar.
Já no colégio, eu jogava bola e o dono da cantina vinha com um copo de leite e um prensado pra mim. Possivelmente porque eu devia ter comido pouquíssimo ou quase nada no almoço, e nesse momento todos já estavam avisados de que eu precisaria ingerir alguma caloria.
Em compensação, nunca tive problemas de saúde ou desenvolvi qualquer angústia nesse sentido, fruto da dificuldade em cumprir corretamente esse ritual da comida da maneira que os pais de toda a criança esperam ter. Vai ver, a minha fome era pouca, mesmo, e eu me satisfazia com o mínimo possível.
Deixei de ser uma preocupação neste sentido lá pelos 10 anos. Só que daí criei outras tantas que nem vale a pena elencar aqui. Hoje, na condição de pai, eu entendo muito bem o que os meus passaram.
Parece desaforo essa criança, tempos depois, resolver trabalhar com gastronomia e ser conhecido pelos amigos mais próximos como o cara que jamais diz não para comida. Desaforo maior ainda é ter tatuado no braço um garfo e uma faca.
E sabe do que mais? Não existe ingrediente no mundo que me cause repulsa, tenho paixão por itens polêmicos, como azeitona, alcaparra, pimenta e coentro.
Desta maneira, estou atualmente num nível de euforia que há tempos não me encontrava, justamente por causa da pimenta e do coentro. Ter mais um restaurante asiático em Porto Alegre é uma bênção.
Ainda mais com um cara como o Edu Sehn à frente, um dos responsáveis por nos apresentar a magia da cozinha tailandesa há mais de 20 anos. Vida longa ao Nuh, à pimenta e ao coentro. Itens que também tenho tatuado no braço!