Vivo me desafiando para pedir a conta de um jeito diferente, que não seja olhar para o garçom e falar em voz baixa pausadamente com a boca bem aberta “a continha faz favor”, erguendo a mão enquanto dou aquela assinada no ar com uma caneta invisível. É sempre um drama para mim esse momento.
Quando saio para jantar já entro no carro pensando numa maneira de fazer isso diferente. Quase nem presto atenção na comida, fico com os ombros tensos e o olhar perdido, em busca de uma saída para esse momento constrangedor. Postergo ao máximo o desfecho do jantar, louco de vontade que alguma alma solidária perceba tudo isso e proativamente me traga a maquininha do cartão, dizendo “pronto, passou, tá aqui, vai dar tudo certo”. Que sonho seria! Mas nunca acontece, e quando menos espero levanto a mão involuntariamente e gesticulo aquela fatídica assinatura no ar novamente. Isso estraga a minha noite, chego em casa me sentindo a pior pessoa do mundo, morrendo de inveja dos que conseguem fazer diferente.
Invisto boa parte do meu tempo observando as mesas ao meu redor fitando todo mundo e imaginando como será que saem dessa. Caso você já tenha recebido uma encarada de um maluco durante algumas garfadas, talvez esse cara tenha sido eu e aproveito para pedir desculpas.
A raiva é que esse gesto de assinar no ar com uma caneta invisível deve ser muito antigo, do tempo em que as pessoas pagavam com cheque. Só pode ser, pensando bem. No Japão não é diferente. Nem na Rússia. Lá, os caras, depois de tomar a última dose de vodca, fazem igualzinho. Com a diferença que lá é bem mais frio.
Me deixem mais tranquilo e digam que também sofrem com isso. Ou pelo menos digam como fazem para sair dessa. Me ajudaria bastante e evitaria transtornos. Caso contrário, é bem provável que você receba mais uma encarada minha durante o jantar, gritando internamente por ajuda. Peça para o garçom levar espontaneamente a máquina até a minha mesa, pelo amor de Deus, nunca te pedi nada!