Regina Duarte é a quarta Secretária Especial de Cultura a cair no governo Bolsonaro. A atriz deixou o cargo nesta quarta (20), depois de um processo de fritura coordenado pelo presidente e aliados.
Mas sua saída não é a única polêmica observada na subpasta desde a posse do presidente. Além do troca-troca no seu comando — Regina é, na realidade, a segunda a se manter mais tempo no cargo, depois de Henrique Pires —, o órgão ainda enfrentou censura, cortes de patrocínio e até mesmo uma homenagem nazista num pronunciamento oficial. Relembre:
Rebaixamento da pasta
Uma das primeiras ações do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) na área da Cultura foi rebaixar a pasta de Ministério a Secretaria Especial então, ela passou para o Ministério da Cidadania, comandada pelo médico Osmar Terra.
Em novembro, no entanto, o órgão passou a integrar o Ministério do Turismo. Relatos de Regina Duarte sobre as dificuldades burocráticas que enfrentou no tempo em que comandou a Secretaria Especial de Cultura indicam que a pasta hoje ocupa uma espécie de limbo administrativo, e depende de autorizações de ambos os órgãos, da Cidadania e do Turismo, para fazer ações básicas.
Corte de patrocínios nas empresas estatais
Outra medida imediata de Bolsonaro foi o questionamento do patrocínio de empresas estatais à cultura. Bolsonaro reduziu o montante de incentivos na Caixa Cultural, no Banco do Brasil e nos Correios.
Anunciou ainda que a fatia mais robusta, vinda da Petrobras, seria realocada para programas de educação e produção tecnológica. O resultado dessa interrupção se fez claro no transcorrer de todo o ano, com festivais de cinema tradicionais, como o Festival do Rio e o Anima Mundi, dependendo de vaquinhas virtuais para serem realizados em formato reduzido.
Nova lei Rouanet
Desde as eleições, Bolsonaro atacava a Lei Rouanet, questionando os subsídios públicos a produtores que, ele supunha, já andavam com pernas próprias. O teto de incentivos da lei caiu, em abril, de R$ 60 milhões para R$ 1 milhão, mas as mudanças mantiveram intactos os planos anuais dos museus, entre outros.
Os principais prejudicados foram os produtores de espetáculos musicais. No fim do ano passado, Roberto Alvim, afastado em janeiro por fazer apologia ao nazismo, anunciou um teto superior para produções do tipo, a princípio de R$ 10 milhões.
Censura
Em cerimônia de comemoração dos 200 dias do atual governo, em julho do ano passado, Bolsonaro causou indignação na classe artística ao afirmar a necessidade de implementar filtros de conteúdo na Ancine, a Agência Nacional de Cinema.
Na ocasião, ele disse que não podia admitir que o dinheiro público fosse destinado a produções que fazem ativismo, e criticou em específico o filme Bruna Surfistinha, estrelado por Deborah Secco, sobre uma prostituta. Ainda ameaçou privatizar ou extinguir a Ancine caso a aplicação de filtros não fosse possível. A fala foi encarada como uma tentativa de censura pelo setor.
Em agosto, o governo começou a colocar em prática a retaliação a obras com temas que desagradavam a ala bolsonarista, vetando trabalhos que falavam sobre regimes autoritários, sexualidade e questões de gênero. Naquele mês, houve o cancelamento de um edital da Ancine que incluía incentivo a projetos para TVs públicas com temática LGBT. Era o início de uma série de atos de censura que atingiriam também os programas de incentivos das empresas estatais, com o cancelamento de espetáculos como Abrazo, da companhia Clowns de Shakespeare, e Gritos, da Dos à Deux.
Em setembro, a Folha revelou que a Caixa havia implementado um sistema de censura prévia, determinando inclusive que funcionários investigassem as redes sociais dos artistas que se inscreviam em programas de incentivo.
Dança das cadeiras
O primeiro secretário de Cultura do governo Bolsonaro, Henrique Pires, pediu seu afastamento em agosto, citando o cancelamento do edital da Ancine. "Para ficar e bater palma para censura, prefiro cair fora", disse ele ao pedir a exoneração.
Pires foi substituído pelo economista Ricardo Braga, sem experiência no setor. Em menos de dois meses, ele também deixou a subpasta.
Braga foi substituído pelo dramaturgo bolsonarista Roberto Alvim. Em junho, ele tinha sido nomeado diretor do Centro de Artes Cênicas da Funarte e passou a usar as redes para defender uma guerra cultural contra o que avaliava ser uma visão da esquerda no campo das artes. Teve grande repercussão o episódio em que o diretor atacou Fernanda Montenegro, chamando a atriz de sórdida e de mentirosa.
Depois de assumir a secretaria, Alvim iniciou um processo de mudança nos postos da pasta e de entidades subordinadas — chegaram ao governo novos nomes responsáveis por áreas como promoção e diversidade cultural, fomento e incentivo à cultura e economia criativa. Alvim trocou também o comando da Fundação Palmares, da Biblioteca Nacional e da Funarte por nomes ligados à ala ideológica do governo.
O diretor foi afastado em 17 de janeiro, depois de ter sido acusado de imitar a estética nazista num pronunciamento oficial. Na mesma data, a atriz Regina Duarte foi convidada por Bolsonaro a assumir a subpasta.