Até duas gerações atrás era comum o estudante médio brasileiro ter uns anos de latim. Esses estudantes não eram a maioria da população em idade escolar mas eram muitos, e aprendiam logo que “regina” é “rainha”. No tempo em que Regina Duarte ganhou o grau de “namoradinha do Brasil” era assim. Ela sabe que seu nome é um título.
Sua entrada em cena agora, no governo Bolsonaro, foi uma reprodução patética da condição de namoradinha. Foi abordada, disse que ia pensar, depois alguém falou em noivado, até que se consumou o casamento: nosso presidente tem escasso repertório cultural, e nele tem lugar central a alegoria do casamento, com seus correlatos todos – do tempo do latim, por sinal –, namoro, noivado, casamento, lua de mel, filhos, separação. A maior modernidade do presidente, neste item, foi incorporar o termo “divórcio”, creio.
Regina Duarte imaginou carregar ainda consigo uma aura de pureza (namoradinha, e de todo o país) e ingenuidade (o pum do palhaço), num governo cada vez mais claramente envolvido com o submundo miliciano. Ela tinha a seu favor uma boa folha de serviços prestados à cultura, muito particularmente ao feminismo de classe média, quando encarnou aquela Malu Mulher, mãe sozinha e adulta independente. Naquele momento o latim já tinha saído do currículo escolar, e ela teve a chance de se reposicionar no imaginário nacional.
Qual Regina entrou para o governo federal? Não foi a Malu adulta, mas a Namoradinha. Confrontada em uma entrevista com o machismo de seu virtual novo chefe, respondeu dizendo que ele era um homem à moda antiga, como seu pai; semana passada, confrontada com a lembrança da ditadura militar, protagonista de tortura contra presos oficiais e clandestinos, ela preferiu se reportar ao mesmo mundo supostamente ameno do passado.
Repudiada por seus pares televisivos, agora é devolvida à irrelevância pelo mesmo chefe com quem pretendeu (mas pretendeu mesmo?) restabelecer um mundo róseo, que nunca existiu para ele e que só existe como fantasia retrospectiva para ela.
Dá pra chorar pelo fim do latim, que ficou pelo caminho mas poderia voltar aos currículos, não para reiterar a visão bacharelesca e pernóstica que dominava a cena naquele tempo, mas para ampliar o horizonte cultural e auxiliar o aluno a entender a alma das línguas.
Mas ninguém vai chorar a morte simbólica dessa rainha. O que, pensando bem, talvez seja bom para o país. Seus eventuais apoiadores ingênuos talvez recebam o moderado choque da verdade.