Os planos da prefeitura de terceirizar três espaços culturais de Porto Alegre foram afetados pelas medidas de restrição impostas pelo coronavírus. A ideia era que, ainda neste primeiro semestre, a Cinemateca Capitólio, a Pinacoteca Ruben Berta e o Atelier Livre Xico Stockinger passassem por todos os processos burocráticos culminando na escolha dos novos gestores dos espaços. Agora, o calendário está sendo alterado e, por enquanto, o cenário atual não permite a marcação de novas datas.
No caso da Pinacoteca e do Atelier Livre, o edital foi lançado em fevereiro e a entrega das propostas de gestão das organizações de sociedade civil (OSC) interessadas seria feita no dia 7 de abril, de forma presencial, como sempre ocorre nesse tipo de trâmite. Essa etapa acabou suspensa, já que reuniões e aglomerações de pessoas não são recomendadas durante a pandemia.
— Conversamos com organizações que mostraram interesse no processo e todas concordaram que não há como se encontrar agora. Por exemplo, se uma organização é de fora do Estado e precisa apresentar uma proposta, os representantes precisam viajar até aqui e quase não há voos, todos estão sendo cancelados. Nós estamos sim trabalhando com suspensões de prazos justamente para lidar com esse período de incertezas — explicou o secretário de Parcerias Estratégicas da Capital, Thiago Ribeiro, em entrevista a GaúchaZH.
No Capitólio, uma decisão judicial
A contratualização da Cinemateca Capitólio ainda não foi lançada em edital e agora, além do coronavírus, também está barrada pela Justiça temporariamente. No último dia 23, uma decisão liminar suspendeu temporariamente o andamento do processo de terceirização do espaço.
A juíza Cristina Luisa Marquesan da Silva, da 1ª Vara da Fazenda Pública de Porto Alegre, acatou parcialmente um pedido da Associação dos Amigos do Cine Theatro Capitólio, que alegou não ter recebido respostas de questionamentos sobre o edital via Lei de Acesso à Informação (LAI).
A entidade afirmou que solicitou, no dia 24 de janeiro, dados sobre o projeto, como estudos prévios, plano de remanejo de servidores públicos e a comparação de custos. De acordo com a legislação, as respostas para entidades da sociedade ou para qualquer cidadão feita via LAI devem ser encaminhadas em, no máximo, 30 dias – prazo que estourou no dia 23 de fevereiro.
— A resposta é necessária para termos noção do que vai acontecer. O local é um patrimônio cultural, tem um acervo histórico, algumas coisas que são próprias da gestão estão em risco. Não temos todas as informações e também queremos uma audiência pública sobre o tema. Queremos dados que fundamentem a escolha da contratualização e as possibilidades de melhora que isso irá trazer — explicou a advogada da associação, Jacqueline Custódio.
A cobrança da realização de uma audiência pública feita pela associação à Justiça não foi aceita pela magistrada, que levou em consideração as restrições de atividades estabelecidas em dois decretos assinados pelo prefeito Nelson Marchezan. A juíza deu à prefeitura um prazo de 60 dias para que as informações solicitadas via LAI cheguem até a Associação dos Amigos do Cine Theatro Capitólio – contados a partir da normalização dos serviços públicos pós-coronavírus, o que ainda é incerto.
A prefeitura alega que ainda não notificada da decisão judicial, mas Thiago Ribeiro citou restrições da legislação na divulgação de dados de um processo antes da publicação do seu edital.
— Em nenhum momento nós nos recusamos a dar qualquer informação sobre o que está baseando a nossa modelagem. Mas os documentos finais da contratualização não podemos liberar, porque estaremos antecipando a própria licitação, e legalmente não podemos fazer isso. Se divulgássemos agora, estaríamos liberando antes do tempo — explicou o secretário municipal.
Como é uma liminar, a decisão pode ser contestada. Porém, mesmo que a prefeitura recorra ou responda aos questionamentos da associação, o processo de terceirização do Capitólio não deve ser levado adiante por enquanto, garantiu o secretário.
— A resposta da decisão judicial não depende desse contato social, então podemos fazer de maneira tranquila. Eu posso garantir que ela vai ser rápida, vamos responder até antes desse prazo dado pela Justiça. Mas precisamos ser notificados. Temos todas as documentações prontas para lançar esse edital, mas, mesmo se derrubássemos essa decisão, não faremos isso — disse Ribeiro, citando que está em estudo alternativas para que a entrega de propostas em licitações e contratualizações possam ser realizadas sem a presença física dos interessados.
A terceirização
A ideia da prefeitura de Porto Alegre é ceder a gestão dos três espaços culturais à uma OSC (Organização da Sociedade Civil), que funcionará como um braço do poder público e será regulada por ele. A contratualização foi divida em dois editais: um só para o Capitólio e outro unindo a Pinacoteca e o Atelier. No caso da Cinemateca, a proposta encontra resistência de setores culturais, como profissionais de cinema, por considerarem que a contratualização abre dúvidas sobre o futuro do acervo raro da instituição e dos servidores que trabalham no local.