O projeto de contratualização da Cinemateca Capitólio segue causando atritos entre entidades do setor audiovisual e a prefeitura de Porto Alegre. Representantes da Associação Profissional de Técnicos Cinematográficos do RS (APTC-RS), do Sindicato da Indústria Audiovisual (SIAV-RS) e da Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (ACCIRS) comunicaram ao secretário municipal da Cultura, Luciano Alabarse, na sexta-feira, que continuam contra a proposta de ceder a gestão do equipamento público à uma OSC (Organização da Sociedade Civil) — projeto do prefeito Nelson Marchezan que atinge diferentes áreas do governo além da cultura. As entidades preparam uma carta oficializando que não deverão colaborar com a redação do edital. No entanto, a prefeitura mantém a previsão de publicação do edital para as próximas semanas, ainda em março.
— A Cinemateca é um case de sucesso. Entendemos que a transferência da gestão para uma OSC não assegura que o trabalho desenvolvido até agora possa continuar ou ser aprimorado. Nos sentimos muito desconfortáveis de permitir que isso aconteça e preferimos nos retirar. Estamos redigindo a carta para entregar no início da semana às duas secretarias — afirma o diretor-presidente do SIAV-RS, Rogério Rodrigues.
Procurado por Zero Hora, Alabarse comentou a reunião, mas reiterou que o processo de contratualização é conduzido pela Secretaria de Parcerias Estratégicas:
— A minha parte é ouvi-los, assim como temos feito ao longo de tantas reuniões. Vieram falar do desconforto que estão sentindo com relação ao processo. Vou acatar a decisão deles e conversar, não me cabe questionar. Vou esperar a formalização de qualquer posição que eles tenham.
O principal entrave, para as entidades, é o prazo dado para a sua colaboração ao edital, que venceu na sexta-feira (6).
— A gente não quer seguir colaborando com um edital que vai contratualizar a Cinemateca com urgência, por ser ano eleitoral. Seguimos abertos ao diálogo, mas somos contra a contratualização neste ano, tem que haver pesquisa. Esse caminho não é seguro para a Cinemateca. É preciso pensar nisso sem data limite. Se tiver que levar 10 anos para pensar num processo que garanta a preservação da história e que seja espaço público, pedimos do tempo necessário — diz Rogério.
A presidente da APTC, Daniela Strack concorda que as entidades precisam de mais tempo e também informações para colaborar com a prefeitura:
— Sempre acreditamos no diálogo, a Secretaria de Parcerias Estratégicas está bem aberta no discurso, mas não nos apresenta nem um estudo de economicidade.
Em artigo publicado em Zero Hora na sexta-feira, o secretário de Parcerias Estratégicas, Thiago Ribeiro, defendeu a proposta. Por telefone, disse que não foi convidado para a reunião de sexta-feira e que não se manifestaria sobre uma posição ainda não anunciada pelas entidades. Ele lembra que a prefeitura apresentou a proposta de contratualização às entidades no fim de janeiro e pediu colaborações até 7 de fevereiro. Segundo ele, o prazo foi postergado mais de uma vez até o prazo final, 6 de março.
— Nós trabalhávamos com a publicação (do edital) em fevereiro. Estendemos o prazo para abrir espaço maior para a manifestação das entidades. No momento, nossa expectativa é de manter o cronograma previsto para os próximos passos, com publicação do edital no mês de março e a assinatura do termo de compromisso no primeiro semestre.
Segundo o secretário, nenhuma contribuição oficial foi enviada pelas entidades.
— Não posso sobreviver de atrasos eternos de um grupo que se diz tão interessado e, em um mês, não consegue apresentar nada — afirmou.
Contratualizações serão discutidas na Assembleia
A Assembleia Legislativa do RS sediará nesta segunda-feira (9), às 18h30min, uma audiência pública para debater as contratualizações de equipamentos culturais que estão sendo promovidas pela prefeitura municipal de Porto Alegre. O evento foi agendado pela deputada Sofia Cavedon (PT), presidente da Comissão de Educação, Cultura, Desporto, Ciência e Tecnologia, e ocorrerá no Plenarinho da AL (3º andar).
Na quinta-feira (5), Sofia visitou a Cinemateca Capitólio junto do presidente da Associação dos Amigos da Cinemateca Capitólio, Luiz Grassi, e usou seu perfil no Facebook para elogiar o trabalho feito no equipamento. Segundo a deputada, a audiência tem o objetivo de promover e ampliar o diálogo entre as partes. Sofia enviou por e-mail o seguinte depoimento a Zero Hora:
"Considerando o novo cenário mundial, onde a produção intelectual e criativa adquire cada vez maior relevância, entende-se que a cultura e a sua diversidade como uma das grandes riquezas das nossas cidades, nosso Estado e País. O setor vem se consolidando como um elemento estratégico para a construção de uma sociedade próspera, desenvolvida e com qualidade de vida. No entanto, o setor vem sendo contingenciado com orçamentos congelados e corte de políticas públicas. Porto Alegre vive um momento crítico neste sentido com o anúncio do lançamento de editais de terceirização da Cinemateca Capitólio, da Pinacoteca Ruben Berta e do Atelier Livre da Secretaria da Cultura, equipamentos culturais tradicionais do município e que atendem e beneficiam a comunidade. Diante da eventual concessão da gestão destes equipamentos para a iniciativa privada é fundamental a realização de debate público e diálogo com todos os implicados".
O secretário de Parcerias Estratégicas, Thiago Ribeiro, estranhou o envolvimento da AL na pauta:
— O debate pode existir em qualquer instância, mas a responsabilidade pela Cinemateca é municipal, é até estranho que deputados estaduais se insiram numa competência de vereadores. Estaremos atentos caso haja contribuições concretas e não apenas falas retóricas.
Entre as presenças confirmadas na audiência, estão o secretário municipal da Cultura, Luciano Alabarse, o presidente da Associação de Amigos da Cinemateca Capitólio, Luiz Antonio Grassi, Isadora Vargas, do Ministério Público de Contas, Lisiane Rabello, presidente da Associação Chico Lisboa e do Movimento Ateliê Livre, Luciano Fernandes, presidente do Conselho Municipal de Cultura, e Daniela Strack, presidente da APTC-RS.