Em 2010, a syrah californiana parecia uma causa perdida. Nos anos 90, os produtores tinham apostado alto na uva, e as plantações no estado passaram de pouco mais de 81 hectares em 1990 a mais de 17 mil em 2004, mas as vendas do vinho feito com ela despencaram e o ritmo do plantio também quase parou.
Surgiram várias teorias para tentar explicar por que a bebida não caiu nas graças dos norte-americanos: alguns acharam que havia estilos demais, confundindo o consumidor, que não sabia o que esperar da garrafa. Além disso, a popularidade repentina da pinot noir depois do filme "Sideways - Entre Umas e Outras", de 2004, também pode ter roubado um pouco de seu brilho. Outros acreditam que a onda de marcas de shiraz australianas solidificaram uma imagem de vinho barato de supermercado - além de aumentar a confusão do público, já que a shiraz e a syrah são a mesma uva com nomes diferentes.
A minha teoria é que, embora haja alguns Syrah californianos soberbos, a maioria é de vinhos tintos frutados, com toques de carvalho, mas com quase nada a distingui-los. Muitos hectares foram plantados em locais errados por produtores menos interessados em fazer um grande vinho do que em se beneficiar do que esperavam que fosse uma tendência. O consumidor tinha identificado o Syrah como medíocre e, para piorar, mais caro que outros vinhos genéricos medíocres.
Paradoxalmente, o Syrah não pode ser considerado irrelevante. Bons vinhos feitos em seu território original - o norte do Vale do Ródano, na França - são gloriosamente perfumados, com toques de ervas, azeitonas, carnes defumadas e flores. Também são feitos em vários estilos em denominações como Hermitage, Côte-Rôtie, Cornas, St.-Joseph e Crozes-Hermitage, mas os melhores compartilham uma mesma identidade salgada que os une, sejam versões simples para serem bebidas jovens ou complexos para envelhecerem por décadas.
Pois essa meia dúzia de californianos excepcionais representava um desafio. Eles provavam que o estado tinha a capacidade de fazer um Syrah de primeira linha. Será que outros produtores seguiriam a iniciativa? Se sim, seriam bem recebidos pelo consumidor?
Em 2010, as perguntas superavam as respostas; hoje, depois de o painel do vinho ter provado vinte Syrahs californianos, alguns detalhes se tornaram bem claros. Para a degustação, Florence Fabricant e eu contamos com Mia Van de Water, diretora de vinhos do North End Grill, em Battery Park City, e Christy Frank, dono da Frankly Wines, loja que fica em Tribeca.
Acho que posso falar por todos quando digo que a primeira impressão foi "Nossa!" A qualidade dos produtos se mostrou altíssima e sua identidade, bem clara. Claro que vinte garrafas é uma pequena amostra dos Syrahs produzidos na Califórnia; no entanto, quase todas mostraram muita personalidade, variando entre aquelas que não fariam feio entre uma seleção do norte do Ródano até as poderosas e modernas no Novo Mundo que valorizam mais o impacto que a finesse.
O que pode ser responsável por isso? Por um lado, eu acho que os produtores finalmente entenderam que a syrah se sai melhor em climas mais frios. Um grande volume da primeira leva de plantio da uva ocorreu em regiões quentes, resultando em vinhos mais doces, sem seu aroma e sabor característicos. O clima ameno pode ser arriscado porque, em anos mais frios, as uvas demoram a amadurecer.
O painel também ficou impressionado com o cuidado com que os produtores passaram a ter ao usar os barris de carvalho. Ficamos ressabiados, já esperando várias opções carregadas nas tintas de baunilha e chocolate da madeira nova; entretanto, o sabor bem definido mal se percebia nesse grupo.
O vinho campeão, o Qupé 2010, é da Bob Lindquist, um dos pioneiros no cultivo da uva na Califórnia. Da vinícola Sawyer Lindquist, no Vale Edna, tem um belo equilíbrio e complexidade, com sabores maravilhosos de flores, azeitonas, carne defumada e minerais, embora seja óbvio que ainda pode melhorar com o envelhecimento.
Já a garrafa número dois é da Enfield Wine Co., um dos produtores menores e mais novos da degustação. Rústico e salgado, ele não é o tipo de vinho que se possa descrever com uma lista de sabores; é mais fácil dizer que tem alma e é cheio de prazer.
Os produtores menores são mais raros - como o Stone Soup 2010 da Clos Saron de Sierra Foothills, fresco e substancioso, que ficou em terceiro, e o Dark Matter 2011 do Martian Ranch & Vineyard, também de Sierra Foothills, ácido e imediatamente delicioso, em sétimo. Não sei como encontramos a garrafa à venda, pois a Martian Ranch já tinha retirado todas de circulação depois de ter sido processada por outra vinícola que possuía os direitos do nome Dark Matter. Continuará disponível nas safras futuras, com certeza, embora com um nome diferente. De qualquer forma, a Martian Ranch também produz outro Syrah muito bom, o Red Shift.
Apesar da grande satisfação, chegamos à conclusão de que o Syrah da Califórnia ainda tem bastante espaço para melhorar. Embora agradáveis, os vinhos deixaram a desejar em termos de complexidade - e nem são baratos. Das vinte garrafas da degustação, doze custaram US$40 ou mais. Por melhores que tenham se tornado, pode levar um tempo até o consumidor aceitar esses preços.
Relatório da degustação: um sonho californiano
3,5 estrelas: Qupé Syrah 2010, Vinícola Sawyer Lindquist de Edna Valley, US$29
Complexo e harmonioso, com sabores persistentes de flores, azeitonas, carne defumada e terra. Vai melhorar com alguns anos de envelhecimento.
3 estrelas: The Enfield Wine Co. Syrah 2011, Vinícola Coombsville Haynes, US$47
Salgado, picante e rústico, com muita alma.
2,5 estrelas: Stone Soup 2010 da Clos Saron Syrah, Sierra Foothills, US$55
Fresco e vivo, com sabores salgado e substancioso.
Melhores opções custo/benefício
2,5 estrelas: Coast Le Pousseur 2010, Vinícola Bonny Doon, Syrah Central, US$25
Terroso, defumado e picante, com aromas e sabores de flores e carnes assadas.
2,5 estrelas: Syrah North Coast 2012 da Arnot-Roberts, US$40
Firme, redondo, com aromas e sabores de flores a azeitonas. Precisa de tempo.
2,5 estrelas: Syrah Tous Ensemble 2011 da Copain Wines, Mendocino, US$24
Suculento e convidativo, com sabores de fruta fresca e minerais.
2,5 estrelas: Dark Matter 2011 da Martian Ranch & Vineyard, Santa Barbara, US$37
Ácido e delicioso, com sabores salgados de carnes defumadas, azeitonas e ervas.
2,5 estrelas: Patrina 2010 da Alban Vineyards, Vale Edna, US$50
Macio e rico, com sabores defumados, de azeitonas, ervas e um toque de carvalho.
2,5 estrelas: Sonoma Coast 2010 da Wind Gap, US$34
Sutil e fresco, com sabores apimentados de ervas e frutas.
2,5 estrelas: Lagier Meredith Syrah Mount Veeder 2010, US$53
Exuberante, com sabores de giz, frutas e flores.
O que as estrelas significam: a avaliação, até quatro estrelas, reflete a reação do painel aos vinhos, que foram saboreados com os rótulos cobertos. A seleção feita geralmente é encontrada nas boas lojas do ramo, em restaurantes e pela internet. Os preços são os praticados na região de Nova York. Coordenador da degustação: Bernard Kirsch.