"Nós vamos inventar o mundo", avisa Partimpim na primeira faixa de O Quarto. O novo disco da personagem, heterônimo de Adriana Calcanhotto em trabalhos voltados ao público infantil, chega às plataformas nesta quinta-feira (10).
O título foi escolhido em alusão ao cômodo preferido dos pequenos, onde inventam diariamente seus mundinhos particulares, mas também à posição que o álbum ocupa na trajetória musical de Partimpim. O Quarto é, afinal, o quarto disco lançado pela faceta lúdica de Adriana Calcanhotto, que ao longo de duas décadas viu seu projeto infantil fazer tanto sucesso quanto a outra carreira.
— É uma alegria enorme ter conseguido seguir por esses dois caminhos, tão diferentes e tão bem definidos, mas igualmente amados pelas pessoas — afirma Calcanhotto, que celebra 20 anos desde a criação de Partimpim, em 2004.
— Ela nasce do meu desejo de me experimentar e de repensar o escaninho da música infantil, encontrando possibilidades de conversar com as crianças sem subestimá-las. A minha intenção sempre foi fazer músicas para crianças, mas que jovens, adultos e velhos pudessem ouvir junto. São canções para pessoas que têm crianças por dentro — completa a artista.
No novo disco, Partimpim mostra que não passou incólume pelas últimas duas décadas. Calcanhotto define o heterônimo como "uma criança sempre do presente", que não envelhece e não perde sua inquietude tipicamente infantil, mas acompanha as mudanças que acontecem no mundo.
Por isso, as oito canções escolhidas para O Quarto, entre composições autorais e regravações, tocam em questões contemporâneas das mais diversas. Da emergência climática à ascensão de regimes autoritários, passando até mesmo pelo TikTok, Partimpim convida crianças e adultos a inventarem um mundo melhor para todas as gerações.
— Tudo o que a minha geração, a anterior e a posterior não conseguiram resolver, sobretudo no que diz respeito ao clima e ao meio ambiente, as crianças vão ter que solucionar. Acho importante embarcá-las nesses temas, porque elas realmente vão precisar inventar um outro mundo. O que a Partimpim faz é dizer para elas que é possível — reflete Calcanhotto.
A ideia de traduzir tal mensagem em discografia estava consolidada havia algum tempo, conforme a artista. A inspiração que faltava veio quando ela ouviu o disco Xande Canta Caetano, no qual Xande de Pilares cria novas versões para canções de Caetano Veloso, e decidiu que queria explorar uma sonoridade semelhante àquela. Chamou então Pretinho da Serrinha, produtor e arranjador do disco, para produzir o novo trabalho de Partimpim. O resultado foi um álbum que circula por diferentes territórios, tendo o samba como lugar em comum.
Entre as faixas, destacam-se Malala (O Teu Nome É Música), composição de Partimpim sobre a ativista paquistanesa Malala Yousafzai, que iniciou uma revolução pelo direito à educação de meninas em meio ao regime fundamentalista do Talibã; Atlântida, de Rita Lee e Roberto de Carvalho, regravada por Partimpim no embalo do reggae e dos tambores afro-brasileiros; e a surpreendente versão de Tô Bem, música da banda Jovem Dionísio que viralizou no TikTok, adaptada para um ritmo totalmente avesso à instantaneidade das redes sociais.
Estrela, Estrela, de Vitor Ramil, é responsável por fechar o disco. A canção foi incluída como uma espécie de demonstração do amor e da solidariedade de Adriana Calcanhotto pelo Rio Grande do Sul, sua terra natal, em razão da enchente que atingiu o Estado em maio. Naquele mesmo mês, O Quarto estava sendo gravado.
— Eu chegava destruída no estúdio e precisava tirar a Partimpim de algum lugar — lembra Calcanhotto. — A tragédia atravessou a feitura do disco, e Estrela, Estrela entrou no repertório por causa disso. É uma música que fala da necessidade de resistir e ter esperança. Talvez a Partimpim nunca pensasse em gravá-la se não tivesse visto a imagem devastadora do cavalo Caramelo em cima do telhado, resistindo — reflete.
Passada a tempestade, Adriana Calcanhotto planeja voltar à terra natal no início de 2025, com Partimpim e um mundo a inventar.