Gal Costa tinha o dom de se apropriar de composições e elevá-las em sua voz. Intensa, selvagem e doce: as canções ganhavam um tom de sagrado com a interpretação da artista baiana, que partiu em novembro do ano passado. Ela pode ter partido, mas o divino e maravilhoso de sua obra segue ressoando.
Celebrando esse legado, Adriana Calcanhotto se apresenta em Porto Alegre nesta quinta-feira (27). A cantora sobe ao palco do Salão de Atos da PUCRS, a partir das 21h, com a turnê Gal: Coisas Sagradas Permanecem. O show é um tributo à obra da artista baiana.
A concepção do espetáculo partiu de Marcus Preto, que foi produtor e diretor artístico de álbuns e shows de Gal nos últimos anos. A equipe da cantora baiana queria fazer uma homenagem a ela, realizando um show com os mesmos músicos — Limma (teclados), Fabio Sá (baixo) e Vitor Cabral (bateria e percussões), que acompanharam a cantora em sua última turnê —, mesma iluminadora, mesmo roadie. O nome de Adriana surgiu instantaneamente para o projeto, por ter um jeito semelhante de lidar com repertório como a Gal. Aliás, aprendeu isso com ela.
— Eu sou da apropriação, assim como Gal. Quando escolho uma música para interpretar, é uma canção que eu gostaria de ter feito — atesta. — Em algumas canções, Gal inseria nota a mais ou a modificava, acrescentava um artigo definido onde não tinha. Ela fazia do jeito dela.
O repertório de Coisas Sagradas Permanecem permeia diferentes recortes da obra de Gal, trazendo canções emblemáticas na trajetória da cantora — como Baby, Negro Amor e Vapor Barato —, mas também trazendo canções que retratam a própria artista, vide Recanto Escuro, Meu Nome É Gal e Caras e Bocas. O show traz também as mulheres que Gal gravou, como Mallu Magalhães, com Quando Você Olha pra Ela.
Poetas como Waly Salomão e Augusto de Campos também são contemplados. Lupicínio Rodrigues, compositor ao qual tanto Gal como Adriana já dedicaram tributos, entra no repertório com Volta. Segundo a cantora porto-alegrense, radicada em Coimbra, Portugal, o show conta com músicas que marcaram sua vida, que quando ouviu a interpretação da artista, passou a entender a canção de um jeito diferente. A própria Volta é um exemplo.
— Era um jeito de interpretar Lupicínio que eu não esperava. Foi muito impactante para mim — diz Adriana. — No show, há elementos da trajetória dela que me ajudaram na decisão de fazer música.
Para a construção do show, Adriana fez um mergulho completo na vida de Gal. Ela viu todas as entrevistas possíveis e shows nos serviços de streaming e ouviu a discografia — tanto que a cantora brinca que o algoritmo não tem coragem de lhe sugerir mais nada que não seja Gal.
Por conta dessa pesquisa aprofundada, Adriana se sente mais próxima da artista baiana. Ela experimentou também uma identificação, que vai além do jeito de trabalhar o repertório.
— Temos um temperamento parecido. Duas librianas, calmas e tímidas, que gostam de animais — compara. — Vi esses dias uma entrevista em que só a Gal aparece no enquadramento, mas, entre as perguntas, ela está preocupada com uma gata, que fica se exibindo. Enquanto responde para o jornalista, fica "bibibi" para a gata. Me identifico com essas coisas.
Adriana recorda que a baiana não era cerimoniosa, quebrava isso com doçura e gentiliza. Lembra que não teve tantos encontros com Gal, mas garante que foram intensos de afeto. A primeira vez que a conheceu pessoalmente foi após um show da baiana no Canecão, no Rio de Janeiro. Quando foi ao camarim, no entanto, ela não sentia coragem de falar com a artista. Então, Adriana ficou olhando para o chão, e Gal também. Passaram uns minutos assim.
Sobre interpretar músicas que foram imortalizadas na voz de Gal, Adriana conta que sua estratégia é pensar que está cantando para a própria artista.
— Não estou fazendo cover, nem dá para chegar perto do canto dela ou imitar. Estou cantando as canções de uma pessoa que me formou musicalmente — pontua. — Eu sou que nem as pessoas que vão estar na plateia: uma fã de Gal, conduzindo uma oração a ela.
Errante
Adriana brinca que, ultimamente, anda com "dois chips". Além do espetáculo Gal: Coisas Sagradas Permanecem, prepara a turnê do disco Errante, que foi lançado no final de março. Mês que vem, Adriana iniciará uma série de shows de divulgação do álbum, começando por Portugal.
A cantora destaca que Errante traz confirmações de elementos que são ligados a sua trajetória. Durante a pandemia, em meio a incertezas com o futuro e saudades das turnês, Adriana se questionava de onde vinha. Até que descobriu ter origem sefaradi (descendente de judeus originários de Portugal e Espanha).
— Pensei sobre a errância estar no meu sangue, antes de ser uma escolha minha. Me dei conta que não sou uma alma quieta. Senti falta da errância na pandemia. No primeiro momento achei bom, estava cansada, ficava em casa com os gatos, tudo bem, mas chegou um momento em que senti muita falta da estrada — relata.
ADRIANA CALCANHOTTO – GAL: COISAS SAGRADAS PERMANECEM
- Nesta quinta-feira (27), às 21h, no Salão de Atos da PUCRS (Av. Ipiranga, 6.681), em Porto Alegre.
- Ingressos: a partir de R$ 150 (solidário, mediante doação de 1 kg de alimento não perecível).
- Pontos de venda: PUCRS Store (térreo do Living 360º, prédio 15, Campus da PUCRS, das 10h30min às 20h30min); bilheteria do Salão de Atos da PUCRS (duas horas antes do show) e pelo site guicheweb.com.br (com taxa de serviço).