De um lado, um monumento vivo do rock gaúcho. Integrante de bandas como Os Cascavelletes, Cowboys Espirituais, Tenente Cascavel, Graforréia Xilarmônica e ainda com sua própria carreira autoral. Do outro, um produtor renomado, que trabalhou com Los Hermanos, Adriana Calcanhotto e Caetano Veloso, entre outros — também com projetos em seu currículo como Acabou La Tequila, +2, Orquestra Imperial e sua trajetória solo. Pois os dois nomes se uniram: Frank Jorge e Kassin formam um duo no disco Nunca Fomos Tão Lindos, que chega às plataformas digitais nesta sexta-feira (5).
O álbum é patrocinado pela Natura Musical por meio da Lei de Incentivo à Cultura (financiado pelo Governo do Estado — Pró-Cultura). Em Nunca Fomos Tão Lindos, Frank Jorge assina a composição das 13 faixas, enquanto Kassin é o responsável pela produção musical.
Os dois são amigos desde os anos 1990, quando eram colegas no selo Excelente, de Carlos Eduardo Miranda — Frank com a Graforréia, enquanto Kassin integrava a banda carioca Acabou La Tequila. Ao longo dos anos, a dupla foi maturando a ideia de produzir um disco juntos. Até que surgiu o edital da Natura, para o qual enviaram uma proposta que foi aprovada.
Originalmente, a ideia era que o álbum fosse trabalhado com os dois juntos em estúdio, mas a pandemia atrapalhou os planos. Gravado ao longo de 2020, o projeto foi realizado remotamente — Frank em Porto Alegre, Kassin no Rio de Janeiro. Nunca Fomos Tão Lindos foi desenvolvido por meio de videochamadas constantes entre a dupla, que dialogava diariamente. Enquanto Frank gravava voz, guitarra, violão e baixo, Kassin trazia suas batidas, erguendo paredes de som com bateria eletrônica e baixo synth.
O disco acabou ganhando outra cara a distância, criando espaços para a dupla trabalhar mais as suas ideias.
— A pandemia mudou o projeto, mas acho que foi para melhor — atesta Kassin. — Em vez do Frank vir ao Rio e em uma semana matar o disco, o álbum acabou sendo supertrabalhado em suas ideias, elaborando mais os elementos que a gente queria trazer, a escolha do repertório. Tudo isso foi feito de outra maneira que não seria feita em alguns dias.
Com Nunca Fomos Tão Lindos, a ideia inicial era trabalhar a música popular brasileira misturada com rock. Porém, Kassin propôs que a dupla fosse para outra direção:
— Tive uma vontade de promover uma quebra da coisa sessentista/setentista que o Frank tem nele. Seria bom que o disco não tivesse esses elementos comuns nas músicas dele.
Frank completa:
— Ele tentou justamente correr para outras direções do que seria previsível fazer nas músicas, que tinham um formato, uma atmosfera de canções jovem-guardistas. Esse é um pouco meu métier, algo que componho involuntariamente quase.
Com letras trazendo reflexões bem-humoradas e boa dose da ironia característica de Frank (Material Inédito, que fala sobre a supervalorização do inédito, é um bom exemplo), é possível ouvir diferentes sonoridades em Nunca Fomos Tão Lindos: brasilidades, disco music, synth pop, rock, samba-jazz, música brega e tecnobrega.
— Trata-se de um resultado muito raro, um disco que tem uma sonoridade muito sua, a partir do volume de referências que a gente carrega — afirma Frank.
Caldeirão de referências
O Que Vou Postar Aqui foi o primeiro single do álbum, com clipe produzido a distância utilizando o recurso do chroma key e direção de Vinicius Angeli. Com beats eletrônicos e vocais finais à Beach Boys, a faixa critica a necessidade de ficar gerando conteúdo constante nas redes sociais.
— Não chega a ser uma crítica à sociedade, mas sim um comentário a respeito. Talvez até uma crítica a mim mesmo sobre como é a minha atuação nas mídias digitais sociais — explica Frank. — Tema da comunicação e da criação e postagem de conteúdo são assuntos que me interessam demais. Gosto de falar sobre isso: a pessoa e a sua interação social, de que maneira ela evidencia a sua interpretação do que está acontecendo no mundo.
Já o segundo single, Tô Negativado, apresenta influência direta dos ritmos do Pará, como carimbó e tecnobrega. Aqui, a dupla apresenta uma faixa romântica sobre encontros e desencontros. Um clipe de Tô Negativado está nos planos do duo, mas ainda sem previsão de lançamento.
Entre as 13 faixas, há também a curiosa Complicado Jeito de Amar, inspirada nas baladas sertanejas radiofônicas. Segundo Frank, soa como "um tecnopop dos Eurythmics dos anos 1980".
Acompanhando o lançamento de Nunca Fomos Tão Lindos, também será disponibilizado um curta-documentário no canal do YouTube da dupla. O registro aborda o processo de criação do disco e a relação de Frank e Kassin com a música.
Inicialmente, os dois também realizariam apresentações que seguiriam ao lançamento. Porém, o presente é impeditivo. Segundo Frank, uma live está prevista para o dia 12 de março, em que ele tocará o disco, trazendo também uma interação com Kassin. O plano da dupla é se reunir para tocar o álbum quando for viável.
Por que tão lindos?
Vale destacar que há uma coisa que chama atenção de cara no álbum, antes mesmo da audição: o título. Questionado, Kassin disse que Nunca Fomos Tão Lindos partiu de Frank:
— Eu não sei de onde ele tirou. Mas na primeira vez que fizemos um grupo de WhatsApp só para tratar do álbum, ele já deu esse nome. Era uma coisa que já tinha na cabeça dele, que ele tinha formatado (risos).
Frank explica que o nome vem de uma piada interna com autobullying. Ele lembra que já teve um blog chamado Feios para Sempre, cujo título e temática permaneceram em sua mente.
— Tem aquele filme baseado no conto do João Gilberto Noll chamado Nunca Fomos Tão Felizes. Daí me ocorreu isso, Nunca Fomos Tão Lindos (risos) — diverte-se. — Eu e o Kassin já temos muito tempo de trabalho musical, com mil demandas todos os dias. A beleza do cara tá justamente nisso de seguir tocando a vida, fazendo nossas coisas, independentemente de serem valorizadas ou não. Nós dois lidamos com diferentes tintas para fazer nossos trabalhos. Sempre brincamos com o esdrúxulo e o esquisito, o que segue sendo algo bacana e que gostamos de fazer.